Menos de 24 horas após a União Europeia (UE) ter informado que iria impor tarifas punitivas aos painéis solares chineses que Bruxelas acredita estarem sendo vendidos no mercado europeu em condições de dumping, Pequim retribuiu atacando o ponto mais sensível: os vinhos franceses.
O Ministério do Comércio da China disse ontem que vai investigar as importações de vinhos europeus, após queixas de produtores domésticos de que o aumento surpreendente do consumo chinês de bordeaux, chianti e champanhe se deve a subsídios ilegais concedidos em seus mercados de origem.
Como a decisão ocorreu logo depois do novo imposto de 11,8% sobre os painéis solares chineses - que subirá em média para 47,6%, daqui a dois meses -, muitos europeus têm um ponto de vista diferente sobres os motivos de Pequim. Davide Cucino, presidente da Câmara do Comércio da União Europeia na China, disse: "Essa medida será amplamente considerada como uma retaliação".
Louis Fabrice Latour, presidente da Federação Francesa dos Exportadores de Vinhos e Destilados, que representa 85% das vendas de vinhos e destilados nos mercados internacionais, disse que a indústria do vinho "foi feita refém" em uma disputa mais ampla.
Apesar da reação do setor vinícola, o Ministério do Comércio da China disse no mesmo comunicado que poderá negociar a questão dos painéis solares, uma iniciativa que Bruxelas tentou estimular mantendo as tarifas em 11,8% por dois meses. Karel De Gucht, comissário do Comércio da União Europeia, disse que isso abre uma "janela" para discussões.
Segundo autoridades da União Europeia, a França é de longe o maior exportador de vinhos para a China, respondendo por € 546 milhões dos € 763 milhões em vinhos europeus vendidos no país no ano passado. As vendas francesas cresceram seis vezes entre 2007 e 2011, segundo a consultoria IWSR, especializada em vinhos. Em 2012, a Espanha ficou num distante segundo lugar, com € 89 milhões, seguida da Itália, com € 77 milhões.
Esses números representam apenas uma pequena fatia do acordo comercial bilateral de € 433,6 bilhões firmado entre as duas potências econômicas. A medida chinesa também exclui as exportações de vinhos da União Europeia para Hong Kong, um polo de vendas de vinhos finos.
Mesmo assim, autoridades da UE admitiram que Pequim não só escolheu um setor bastante simbólico para chamar atenção, como também fez uma esperta escolha tática: França, Espanha e Itália apoiaram a linha dura de Bruxelas no caso dos painéis solares; já a Alemanha liderou em maio uma revolta de 18 países contra a posição da Comissão Europeia. "Eles foram muito espertos", disse uma autoridade da União Europeia.
Perguntado se Pequim está tentando dividir para conquistar, ao pôr em evidência a indústria do vinho, o primeiro-ministro espanhol, Mariano Rajoy, disse esperar a solidariedade europeia. "Tenho certeza de que todos na Europa vão nos apoiar, assim como aos franceses e italianos", disse ele.
Autoridades francesas insistiram que o setor vinícola não recebe subsídios e o presidente François Hollande pediu que todos os 27 países-membros se reúnam para resolver suas diferenças nas relações comerciais com a China.
"O presidente quer que a Comissão Europeia convoque uma reunião e que os 27 países cheguem a um ponto de vista em comum", disse Najat Vallaud-Belkacem, porta-voz do governo francês.
Veículo: Valor Econômico