Efeito tango encarece carne

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Argentina suspende exportações e frigoríficos brasileiros direcionam a produção para fora do país. Preços internos subiram 20% em média


 
O custo da carne bovina está ficando cada vez mais salgado para os consumidores. E, se depender da Argentina, os brasileiros terão de apertar o orçamento para continuar a ter o produto na mesa. A presidente do país vizinho, Cristina Kirchner(1), proibiu a venda das carnes de lá a outros países. Com os hermanos fora do mercado internacional, o Brasil ganha a oportunidade de ampliar a exportação da proteína. Em consequência, parte da carne que antes atendia a demanda doméstica irá para os antigos clientes da Argentina e o valor do produto subirá no Brasil. Donos de açougues e representantes da indústria exportadora confirmam: a alta dos preços já começou.

 

Antes mesmo que os mercados na Ásia, no Oriente Médio e na Europa pudessem sentir os efeitos da decisão de Kirchner, o estoque de carnes dessas regiões já andava em baixa. Desde a crise financeira, elas diminuíram drasticamente a compra do alimento e, somente em janeiro de 2010, retomaram as importações. No primeiro bimestre do ano, a venda de carne brasileira para o exterior cresceu cerca de 45% em valores e 15% em volume. Ou seja, o preço médio da tonelada subiu 24%.

 

“É claro que essa melhora do preço da tonelada tem um reflexo no mercado doméstico. Na crise, deixamos de exportar muito e redirecionamos tudo para o mercado interno. Assim, a carne ficou mais acessível para o consumidor, mas a um preço que não era real, baixo demais”, afirmou Otávio Cansado, diretor executivo da Associação Brasileira das Indústrias Exportadoras de Carnes (Abiec). “Havia uma superoferta e a demanda brasileira não era capaz de absorver toda a produção. A médio prazo, as empresas vão se adaptar à oferta e à demanda. Com isso, o preço muito baixo e artificial chegou a fim”, emendou o executivo.

 

Fuga de clientes

 

Além de ter a proteína bovina como a preferida da mesa, a comerciante Rosineide Rodrigues, 36 anos, serve porções do produto no bar em que é proprietária. Como precisa comprar em grande quantidade, pesquisa muito todos os meses. “A carne subiu demais neste ano. Se eu não encontrar a um preço menor, terei de trocar algumas refeições por frango pelo menos na minha casa”, lamentou. Segundo a comerciante, alguns produtos dobraram de preço e as altas não se restringiram somente aos bovinos. “Antes, eu comprava o quilo da carne suína a R$ 5; hoje, está quase a R$ 10”, comparou.

 

José Gomes, gerente de um grande açougue de Brasília, confirma a elevação de preços notada por Rosineide. “Na média, a carne bovina ficou entre 15% e 20% mais cara. Isso para todos os cortes”, afirmou. De acordo com ele, a alta começou no fim de janeiro, o que diminuiu o movimento de clientes. “Se essa história da Argentina for verdade, vai sobrar para o consumidor e para a gente que trabalha em açougue. Os preços, que já vinham subindo, vão disparar. Acontecerá o mesmo que houve com o açúcar no ano passado”, ponderou.

 

Na avaliação do diretor executivo da Abiec, os preços aos brasileiros vão entrar em rota intensa de aceleração. O buraco na oferta deixado pelos argentinos, somado ao reaquecimento da demanda internacional, pressionam o mercado doméstico. Somente o Irã, neste início de ano, expandiu as compras de carne em 200%. Na esteira do Irã, outros países ampliam fortemente a aquisição do produto. “Com tudo isso, os preços vão mudar de patamar. Há muito espaço para alta, para chegar ao ponto de equilíbrio. Só vão se estabilizar quando tivermos a retomada total do consumo mundial”, disse Cansado.

 

1 - Restrição de embarque

 

O governo argentino proibiu temporariamente o embarque de carnes congeladas e resfriadas ao exterior. A medida tenta forçar os preços do produto para baixo no mercado interno, que registrou neste ano alta entre 35% e 40% nos cortes mais populares. A suspensão começou a valer no último sábado e não tem prazo para acabar. (VM)

 

AÇÚCAR INDIGESTO

 

O açúcar no Brasil ficou quase 60% mais caro desde a safra 2007/2008 . O motivo para alta tão intensa foi a quebra da safra de cana-de-açúcar na Índia, o segundo maior produtor do mundo, que enfrentou uma redução de mais de 12 milhões de toneladas na produção. Do Brasil, os indianos passaram a comprar cerca de 4 milhões de toneladas de açúcar por ano. A pressão sobre o custo deste produto se intensificou ainda mais porque outras nações, que antes tinham a Índia como exportador, tiveram de comprar de outras regiões. Além do açúcar, essa quebra de safra pressionou o custo do álcool combustível. O etanol brasileiro inflacionou em função dos usineiros, que passaram a preferir a produção de açúcar. (VM)

 

Veículo: Correio Braziliense


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