A menor oferta de crédito já começa a dar sinais dos seus efeitos na economia real. De acordo com o Conselho Nacional da Pecuária de Corte (CNPC), está aumentando a inadimplência de frigoríficos pequenos e médios no pagamento pelo boi ao pecuarista. Segundo Sebastião Guedes, presidente do CNPC, até o ano passado, o índice de não-pagamentos estava em torno de 5%, veio avançando para níveis próximos de 8% até antes do agravamento da crise financeira e atualmente está entre 15% e 20%. "Esse tipo de problema ocorre com frigoríficos de menor porte e principalmente em novas fronteiras da pecuária, como no Pará e em Rondônia, onde a relação entre produtor e indústria não é muito sólida", acrescenta.
O presidente da entidade estima que essas indústrias pequenas e médias representem cerca de 20% de tudo o que se negocia no mercado brasileiro de boi. "O que está acontecendo na prática é que o pecuarista é que está financiando os frigoríficos. São indústrias de menor porte, que não exportam e estão com problemas de liquidez", afirma o Guedes.
Ele acrescenta que a inadimplência dos pequenos e médios, entre 15% e 20%, cresce para 25% caso se considerem os não-pagamentos dos frigoríficos Quatro Marcos e do Margem, que têm porte intermediário de médio para grande, e que estão fechados por problemas financeiros, mas antes do agravamento da turbulência.
Carlos Xavier, presidente da Federação de Agricultura e Pecuária do Pará (Faepa), diz que há 15 dias os frigoríficos iniciaram atrasos no pagamento de pecuaristas, mas, segundo ele, não atinge, ainda, atrasos alarmantes. "São frigoríficos que compram com prazo de 30 a 35 dias e, quando o pecuarista vai recebem, eles empurram o prazo por mais 3 a 4 dias", relata Xavier.
Em Goiás, Mozart Carvalho de Assis, presidente da Comissão da Pecuária de Corte da Federação da Agricultura do estado, afirmou que, além da inadimplência dos frigoríficos Margem e Quatro Marcos, já conhecida do mercado, os pecuaristas também estão tendo problemas com uma indústria de menor porte do município de Goiás Velho. "Estamos todos tomando medidas de precaução. Quem antes vendia 200 bois em um único lote está liberando, aos poucos, algo como 50 animais, e somente depois do pagamento do lote anterior", afirma.
A escassez de crédito é sempre um problema maior para a indústria, conforme explica Fabiano Tito Rosa, analista da Scot Consultoria. "Os frigoríficos precisam de muito capital de giro. Necessitam fazer estoque de carne até atingir determinado padrão - o que leva algum tempo - para depois exportar", acrescenta Rosa.
De acordo com Guedes, da CNPC, não há relatos de atraso de pagamento por parte de grandes frigoríficos. "Eles apenas estão pedindo mais prazos."
Luciano Vacari, superintendente da Associação dos Criadores de Mato Grosso (Acrimat), diz que é perceptível o fim da modalidade de pagamento à vista entre os grandes frigoríficos. "Os juros, que também eram de 2%, estão agora no patamar de 4%", complementa.
O frigorífico Minerva, que antes do agravamento da crise comprava um terço da matéria-prima com pagamento à vista, anunciou na semana passada que suspendeu essa modalidade e somente pagará boi da forma convencional - com 30 dias de prazo. A empresa também anunciou que a taxa de juros de empréstimos a pecuaristas subiu 1 ponto percentual - de 2,5% a 3% para 3,5% a 4%.
A combinação de encolhimento de crédito e mercado muito instável resulta em problemas na estrutura de capital de giro dos frigoríficos, explica Sérgio De Zen, pesquisador do Centro de Estudos Avançados em Economia Aplicada (Cepea/Esalq/USP). "Alguns frigoríficos estão endividados, mas conseguiram negociar e postergar a dívida para vencer em cinco a dez anos. Mas muitos frigoríficos não têm as mesmas condições de negociação, como os menores, que têm mais dificuldades nesse mercado", complementa De Zen.
Veículo: Gazeta Mercantil