No dia 8 de janeiro, a agência de risco Fitch divulgou nota alertando o mercado sobre o atraso do frigorífico Arantes no pagamento de US$ 8 milhões referentes a juros de notas promissórias emitidas pela empresa. Quatro dias depois, o frigorífico assumia sua incapacidade de arcar com suas dívidas - em grande parte resultado de aquisições de outras indústrias feitas recentemente - e anunciava seu pedido de recuperação judicial. O forte aquecimento da economia que antecedeu a atual crise impulsionou outras empresas do setor de carnes - além de outros ramos, como o sucroalcooleiro - a investirem alto para aumentar a produção e a atender à demanda que prometia continuar crescendo. O resultado é que as empresas estão endividadas e com geração de caixa em retração, quadro que deve se agravar em 2009.
Sexta-feira, a agência Moody‘s também alterou de estável para negativa as perspectivas do Frigorífico Independência. Isso porque, segundo a agência, o endividamento da empresa continuará alto e pode pressionar de forma negativa a capacidade de pagamento da empresa. Com 85% de sua dívida total em dólar, o frigorífico viu seus indicadores piorarem com a valorização da moeda americana. Atualmente, a dívida total do grupo equivale a cerca de 5 vezes o EBITDA (geração de caixa) e a dívida líquida, que no segundo trimestre de 2008 estava em 3,93 vezes o EBITDA, subiu para 4,86 vezes. Do total da dívida da empresa, 28,6% vencem no curto prazo - em menos de um ano, contados a partir de 30 de setembro de 2008.
Para se ter uma idéia do quanto é desfavorável a situação da empresa, o endividamento líquido do JBSFriboi, maior frigorífico de carne bovina do mundo, foi de 2,3 vezes a sua capacidade de geração de caixa ao final de setembro do ano passado. "O mercado considera razoável que essa relação fique próxima de 2 vezes", explica Peter Ping Ho, da Planner Corretora. Além disso, continua o especialista, o JBS tem outra vantagem que é a de ter a maior parte de sua receita (80%) em dólar e sua dívida, em moeda nacional.
Fernanda Flauzino, gerente de Relações com Investidores (RI) do Independência diz que a empresa não se surpreendeu com a alteração da Moody‘s. "Essa mudança de posição foi feita para as outras empresas concorrentes, pois o cenário futuro é de desaquecimento para todas. A alavancagem também não é uma condição única do Independência, mas de todo o setor", justifica a gerente de RI.
Mas, a relação da dívida líquida do Independência com a sua geração de caixa é a pior entre as empresas do setor sobre as quais existe acesso livre a balanços financeiros. Ao fim do terceiro trimestre de 2008 essa relação para o Frigorífico Minerva, por exemplo, era de 3,21 vezes, para o Frigorífico Marfrig 3,1 vezes, para a Perdigão 3,4 e até para a Sadia, 3,4 - no segundo trimestre de 2008, portanto, antes das perdas com derivativos, a Sadia detinha um invejável endividamento líquido equivalente a apenas 1,4 vezes sua geração de caixa.
Em novembro, o Independência recebeu um aporte de R$ 450 milhões do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), via BNDESpar, em troca de participação acionária. Na época, havia rumores no mercado de que, se não fosse essa injeção de capital, o Independência teria sérias dificuldades de continuar operando. A gerente de RI da empresa reconhece que o dólar valorizado trouxe impacto negativo às dívidas da empresa, mas pondera que a empresa tem hoje "caixa saudável".
Ping Ho, da Planner, diz que a tendência daqui em diante é que os próximos balanços mostrem uma deterioração de geração de caixa, sobretudo das que dependem muito do desaquecido mercado externo na venda de seus produtos. Por outro lado, o dólar sustentado em alta deve manter o endividamento elevado. Projeção da MCM Consultores indica que a cotação da moeda americana deve-se ficar, na média, em R$ 2,40 em 2009, em R$ 2,39 em 2010, mantendo-se em trajetória crescente até atingir R$ 2,66 em 2013.
Veículo: Gazeta Mercantil