Ainda não se sabe ao certo as consequências para o Brasil do surto recente de gripe suína, que já é vista com alto potencial de se tornar uma pandemia. Mas a maior empresa de carnes do mundo, a brasileira JBS, teve suas ações fortemente penalizadas no pregão de ontem da BM&F Bovespa, por conta de ter quase toda sua produção de carne suína concentrada nos Estados Unidos, um dos países onde mais foram encontrados mais casos da doenças. Outros efeitos também foram sentidos entre as empresas brasileiras. A Globoaves, uma das grandes exportadoras de suíno do País, chegou a ter suspensa a exportação dessa carne por um cliente russo, que somente após o pronunciamento oficial do governo do Brasil de inexistência do vírus no País, liberou o embarque do produto. Ao final da tarde de ontem, também havia rumores de que a Ucrânia teria suspenso a importação de carnes do Brasil. O Ministério da Agricultura e o Itamaraty informaram não terem recebido nenhuma comunicação oficial até ontem.
"Pode até ter acontecido. Mas esperamos que a Organização Mundial de Saúde (OMS) esclareça que a contaminação não se dá pela carne. Essa precipitação não tem sentido", reclama Pedro de Camargo Neto, presidente da Associação Brasileira das Indústrias Produtoras e Exportadoras de Suínos (Abipecs).
A gripe suína vem sendo considerada mais grave do que a aviária, porque o vírus tem alta adaptabilidade aos seres humanos. "A estirpe aviária só era transmitida aos humanos que manipulavam aves contaminadas", explica Antônio José Piantino, professor de departamento de veterinária da Universidade de São Paulo (USP). Assim, a característica de o contágio ser feito entre humanos aumentam os riscos de o surto transformar-se em pandemia. "Mas não há risco de contágio por meio do consumo da carne", esclarece Piantino.
De qualquer forma, ainda há muita desinformação sobre os riscos de contaminação, tanto que um importador russo da Globoaves chegou a suspender o embarque na manhã de ontem, segundo conta o diretor-presidente da empresa, Roberto Kaefer. "De forma geral, estão todos assustados. E há desinformação. Nosso cliente suspendeu o embarque até que o governo brasileiro se posicionasse sobre a inexistência de contaminação no País", acrescenta Kaefer, para quem, a doença pode causar inicialmente queda do consumo de carne suína, mas mais à frente, uma oportunidade para ocupar espaço no mercado de países como Estados Unidos, México e Canadá, que já sofrem embargos de vários países, como Rússia, China e Coréia do Sul. "EUA e Canadá vendem juntos 40% do que a Rússia importa, o que representa 150 mil a 180 mil toneladas", apresenta Kaefer.
"Em mercado de commodities, como é o de carnes, é comum o uso de qualquer artifício para barganhar preço. E isso pode acontecer com a gripe suína", avalia Ivanir Rocha , diretor-presidente da trading Meat Center.
O embargo à carne dos Estados Unidos - onde a contaminação de 40 pessoas foi confirmada até ontem - fez com que as ações do JBS tivessem a maior queda do Ibovespa, fechando em R$ 6,10%, retração de 12,23%, muito acima do índice da bolsa, que recuou 2,04%.
Na noite de ontem, o JBS comunicou à Comissão de Valores Mobiliários (CVM) que a sua operação de carne suína nos Estados Unidos representa 14% da sua receita líquida e que menos de um sexto disso da produção é vendida para outros países. "Uma eventual restrição nas exportações afetaria menos de 1,5% da receita consolidada", minimizou o comunicado. O JBS tem 18 unidades de produção nos Estados Unidos que somam capacidade total de abate de 28.600 cabeças bovinas por dia e quase o dobro (48.500 mil cabeças) de suínos. No ano passado, a receita líquida da divisão de suínos do JBS nos EUA foi de US$ 2,438 bilhões.
Peter Ping Ho, analista da Planner Corretora, explica que a queda das ações da JBS deve ser temporária, mas que provavelmente a companhia deve sim ter efeitos financeiros com o embargo aos Estados Unidos. "Na realidade, isso também deve afetar as empresas no Brasil, como Sadia e Perdigão. Mas os papéis delas não foram afetados porque estão sob efeito da possibilidade mais forte de ocorrer a fusão".
Veículo: Gazeta Mercantil