Após três tentativas frustradas, Sadia e Perdigão anunciam fusão

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Em dezembro passado, mais próximo ao Natal, o presidente do Conselho de Administração da Sadia, Luiz Fernando Furlan, atendeu o telefone e ali foi feito o primeiro contato de uma conversação que duraria mais de cinco meses. Do outro lado da linha, Nildemar Secches, presidente do Conselho de Administração da Perdigão, abria o canal para a quarta tentativa de fusão das duas maiores empresas de alimentos do Brasil. A primeira foi em 1999. "Há dez anos nos reuníamos para falar sobre o assunto, mas a conversa não seguiu muito adiante", conta Secches. A segunda, em 2002, obteve êxito parcial. Foi criada a Brazilian Foods (BRF Trading S.A) com atuação voltada para exportação com foco na região conhecida como "Euroásia". A união comercial durou um ano e meio e foi desfeita.

 

A tentativa seguinte, em 2006, foi a mais traumática de todas e a que quase colocou um ponto final em qualquer outra possibilidade de associação: a oferta hostil de compra da Perdigão feita pela Sadia, quando exercia a presidência do conselho o primo de Furlan, Walter Fontana Filho. O caso arranhou a imagem da Sadia e, recentemente, acabou resultando na instauração do primeiro processo brasileiro por uso de informações privilegiadas na iniciativa privada. "Depois desta última, ficamos com a sensação de que não daria certo mesmo", contou Secches.

 

Ambos os executivos garantem, contudo, que essas são águas passadas. "Até agora, eu e Nildemar atuamos como ''equilibristas de pratos'' para tentar superar a questão emocional. Estamos nos preparando para sermos missionários no sentido de unificar de verdade as duas empresas", disse Furlan. Juntos, os dois ex-concorrentes co-presidirão a Brasil Foods (BRF), como foi batizada a nova companhia, mas somente para efeitos de informações ao mercado, sem alteração de marca.

 

Os acionistas da Perdigão deterão 68% da nova companhia e os da Sadia, os 32% restantes. A Previ (Caixa de Previdência dos Funcionários do Banco do Brasil), que detinha 14,15% de participação na Perdigão e mais 7,33% na Sadia (total de 21,48%), será a maior acionista individual com pouco mais de 12% das ações. A família controladora da Sadia, que detinha 23,38%, agora também terá percentual na casa dos 12%, mas um "pouco menos do que a Previ", esclareceu Furlan. "Qualquer décimo em uma empresa gigante como a BRF é muito", acrescentou o ex-ministro.

 

Um dos gargalos para concretizar a operação foi a retirada da holding financeira da Sadia do negócio. A solução encontrada foi a compra, pela família controladora da Sadia, das operações do Banco Concórdia e da Corretora Concórdia pelo valor aproximado de R$ 67 milhões. Dividendos foram distribuídos aos acionistas para reduzir o patrimônio final da holding. De acordo com Leopoldo Viriato Saboya, diretor de Relação com Investidores (RI) da Perdigão, o valor de avaliação inicial da holding financeira era próxima de R$ 200 milhões, o que significa que a distribuição de dividendos envolveu valores próximos de R$ 130 milhões. Ainda de acordo com o RI, na operação foi considerado um equity de R$ 10 bilhões para as duas companhias, sendo cerca de R$ 6,8 bilhões da Perdigão e R$ 3,2 bilhões da Sadia. "Não houve movimentação financeira, apenas de ações", reiterou Saboya.

 

Com uma dívida nada desprezível de R$ 10 bilhões, a Brasil Foods fará uma oferta de ações, provavelmente com direito de preferência aos atuais acionistas, até julho para captar R$ 4 bilhões. "Nossa avaliação é que a demanda está grande. Em torno de R$ 1,8 bilhão deve ser subscrito pelos grandes acionistas. Ainda tivemos conversas com o BNDESpar, que demonstrou interesse em subscrever ações. Poderíamos até fazer uma oferta maior, mas acreditamos que esse recurso será suficiente para aliviar as dívidas de curto prazo das duas empresas", disse Furlan. A Sadia informou em seu balanço do primeiro trimestre uma dívida líquida de curto prazo de R$ 3,23 bilhões.

 

Os dois co-presidentes da BRF descartaram demissões "em chão de fábrica". Eles afirmaram que a visão é de que a sinergia trará economia em áreas estratégicas, como de logística e distribuição, e que a previsão é de expansão a mercados onde as empresas ainda não conseguem acessar, como a China e os Estados Unidos, e, no mercado interno, o público de menor renda.

 

Faturamento deve chegar a R$ 30 bi e encostar no JBS

 

A Brasil Foods (BRF), nova companhia resultante da fusão entre Sadia e Perdigão, nasce com faturamento bruto de R$ 25 bilhões e ultrapassa, portanto, a então líder no ranking brasileiro das empresas de alimentação, a Bunge Alimentos, que obteve receita líquida de R$ 23,4 bilhões em 2008. Mas a inauguração de fábricas previstas - e a consequente receita adicional - deve fazer com que, no curto prazo (em até 12 meses), o faturamento da gigante salte para a casa dos R$ 30 bilhões próximo, por exemplo, da receita bruta obtida em 2008 pelo JBS, o maior processador de carne do mundo.

 

"Somente a Sadia está entrando com seis fábricas novas, que vão incrementar o faturamento em R$ 4 bilhões. Fora ainda o que vem do outro lado. Seremos um dos três maiores exportadores de alimentos do mundo", disse Luiz Fernando Furlan, agora co-presidente da BRF.

 

Com a nova solução encontrada para o endividamento com derivativos, a Sadia suspendeu os planos de venda de ativos estratégicos, como a fábrica da Rússia. "Tudo agora será reavaliado, mas com visão mais otimista e foco em compartilhar sinergias. Temos agora tempo para pensar a melhor solução, sem a pressão de endividamento", afirmou Furlan. Sobre as fábricas de ambas em mesma região, Furlan reafirmou que o que será buscado é sinergia. "Em Pernambuco, por exemplo, já temos um centro de treinamento. Poderemos usá-lo para qualificar pessoal para a unidade que a Perdigão vai inaugurar a 150 quilômetros do local."

 

Veículo: Gazeta Mercantil

 

 


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