Exportações caíram à metade no final de 2008; apesar da queda nos valores recebidos pelo produtor, consumidor ainda paga mais - No último bimestre de 2008, exportações caíram 50%; já a arroba baixou de R$ 70,50 em setembro para os atuais R$ 39,80 no Estado de SP
Tudo ia bem para o setor de suinocultura até setembro do ano passado. A demanda estava em recuperação e os preços remuneravam adequadamente os produtores. Dois fatores, no entanto, iriam dar novos rumos ao setor que, atualmente, amarga grande prejuízo.
Primeiro veio a crise mundial, que inibiu as exportações e deixou no mercado interno um volume de carne acima da demanda, exatamente no melhor momento anual para a suinocultura: o final de ano. As exportações caíram 49,7% no último bimestre do ano passado e os preços da arroba despencaram de R$ 70,50 em setembro para os atuais R$ 39,80 no Estado de São Paulo.
Ainda se adaptando aos efeitos trazidos pela crise mundial, o setor receberia outro baque -desta vez partindo do México. Uma nova gripe, batizada inicialmente de "suína" e que erroneamente fez a população associar a transmissão da doença ao consumo da carne desse animal, abalaria de novo o comércio, tanto externo como interno.
Tradicionais importadores, como a Rússia, suspenderam as compras das regiões mais afetadas pela gripe, como México e Estados Unidos. Alguns produtores, como o Egito, tomaram medidas mais drásticas e abateram animais. Fatos como esses foram suficientes para associar ainda mais a gripe ao consumo da carne.
A Organização Mundial da Saúde interveio, afirmando que o consumo da carne não era responsável pela transmissão da gripe, que passou a ser chamada de influenza A (H1N1). A OMS explicou, ainda, que a transmissão é semelhante à de outros surtos de gripe -pelo ar ou pelo contato humano.
Era tarde. O nome "gripe suína" ficou na mídia e, com a chegada do inverno e o aumento de casos no país, a associação do consumidor entre a carne e a gripe continua, derrubando o consumo de 30%, segundo entidades de produtores.
"Estamos pagando caro pela escolha de um nome errado", diz Geraldo Salaroli, produtor de Bragança Paulista (SP), referindo-se ainda ao uso do termo "gripe suína" pelos meios de comunicação. O consumidor está com medo e faz a opção por outros tipos de carne.
Outros fatores
Valdomiro Ferreira Júnior, presidente da APCS (Associação Paulista de Criadores de Suínos), diz que o fato de a gripe A (H1N1) continuar sendo chamada de "suína" afeta o consumo, que caiu 25% em São Paulo nos últimos meses, mas os problemas do setor não se limitam a isso.
A formação dos preços, que deveria ser de baixo para cima, levando em consideração os custos, acaba sendo de cima para baixo. Com isso, o varejo mantém as margens de ganho, o que não ocorre com produtores e frigoríficos, diz Ferreira.
Além disso, a redução de preços não chega ao consumidor. Dados da Fipe (Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas) mostram que a carne suína mantém alta de preço no varejo. Em maio, subiu 0,3% e em junho, 0,5%.
Há um forte desequilíbrio no mercado e o setor apanha desde setembro, diz Ferreira. O único alívio é que os preços do milho, um dos importantes componentes do custo de produção, estão em baixa. Mas essa baixa não deixa de ser preocupante, diz o presidente da APCS. Sem remuneração agora, os produtores de milho podem produzir menos no próximo ano, acarretando novos custos para a suinocultura.
Os efeitos dessa forte queda nos preços, e a consequente perda de renda, provocarão maior concentração no setor, retirando da produção pequenos e médios produtores, segundo Ferreira.
Setor pede "agilidade e presença" do governo
O setor de suinocultura não sofre redução de preços apenas por falta de consumo interno, mas também pela não abertura de novos mercados externos, na avaliação de Pedro de Camargo Neto, presidente da Abipecs (associação dos produtores e exportadores).
Ele atribui a não abertura de novos mercados à falta de agilidade do Ministério da Agricultura. "Parece que a crise atual não tem nada a ver com eles [governo]." Essa falta de agilidade compromete a abertura de novos mercados porque as ações não dependem mais do campo técnico, mas apenas de "um empurrão político".
O Brasil deve exportar 600 mil toneladas neste ano, volume sobre o qual patina há quatro anos, diz Camargo. Mercados como os da China e das Filipinas, embora continuem importando de outros países, excluem o Brasil. "O governo tem de se fazer mais presente."
"O setor precisa entender que um acordo com outro país é um trabalho delicado, árduo e demorado", diz o ministro Reinhold Stephanes, "Não ocorre no ritmo do vendedor, mas sim no do comprador", diz ele.
Camargo Neto atribui a queda de preços também à maior oferta de carne, provocada pela maior produtividade no setor, principalmente devido a avanços tecnológicos. A maior oferta interna e a não abertura de novos mercados externos vão cada vez mais acentuar os problemas no setor, diz ele.
Armando Barreto Carneiro, produtor mineiro de Ponte Nova, concorda com Camargo. O produtor diz que a depreciação dos preços no setor passam não apenas pela gripe, mas também pela maior oferta interna e pelo mercado internacional.
Na avaliação de Carneiro, que também é diretor comercial da Associação dos Suinocultores do Vale do Piranga, é necessária a criação de mecanismos para a elevação do consumo interno, de apenas 13 quilos anuais por habitante.
Wolmir de Souza, produtor e presidente da Associação Catarinense de Criadores de Suínos, diz que o fator gripe é determinante para a queda de consumo, que estima em 30% após a crise econômica mundial e o surgimento da A (H1N1).
Ele atribui, no entanto, a questão cambial como um dos principais entraves ao setor. "As exportações do país podem até crescer, mas o dólar nesse patamar não consegue remunerar o produto."
O custo médio de produção em Santa Catarina (maior produtor nacional), está em R$ 2,35 por quilo, para uma remuneração de apenas R$ 1,60.
Esse desequilíbrio entre custo e remuneração faz os produtores perderem de R$ 80 a R$ 90 por animal, diz ele.
As exportações cresceram 9% no primeiro semestre em relação a igual período de 2008, mas os preços médios caíram 25% em dólar, diz a Secex. (MZ)
Veículo: Folha de S.Paulo