Oferta curta "protege" pecuaristas

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Não são poucas ou desprezíveis as preocupações que eclodiram ao longo da cadeia produtiva de carnes, principalmente bovina, a partir das aquisições e incorporações anunciadas pelos frigoríficos JBS e Marfrig nos últimos dez dias, após outras dezenas de negócios fechadas por ambas desde meados desta década, no Brasil e no exterior.

 

Não é para menos. No dia 14, a Marfrig, criada em 2000, adquiriu a Seara, braço de frango e suínos da americana Cargill no país. No dia 16, a JBS, já a maior empresa de carne bovina do Brasil e do mundo, tornou-se o maior grupo de proteínas animais do planeta com a incorporação da rival Bertin e a compra da americana Pilgrim's Pride, outra com foco em aves.

 

Não satisfeita, a Marfrig confirmou na última terça-feira o arrendamento de 12 unidades de bovinos dos frigoríficos brasileiros Margen e Mercosul, além da aquisição de 51% de uma empresa de couro no Uruguai.

 

Não é novidade para ninguém que há um processo de consolidação em marcha no segmento. Segundo José Vicente Ferraz, diretor-técnico da AgraFNP, ele ganhou força com a maior estabilidade econômica proporcionada pelo Plano Real - se antes do plano havia mais de 3 mil frigoríficos de carne bovina no país, o número já recuou para cerca de 700.

 

Surpreendente, conforme Ferraz, é a velocidade que o processo ganhou com as recentes crises estruturais (escassez de bois no país, travas às exportações para a União Europeia) e conjunturais (debacle financeiro internacional) que afetaram o segmento, e o tamanho das transações anunciadas.

 

Com os negócios, JBS e Marfrig passam a representar 30% do abate nacional de bois e quase 70% das exportações brasileiras de carne bovina, e isso não é pouca coisa.

 

Em uma ponta, os pecuaristas temem receber menos nas negociações com essas empresas; na outra, a preocupação é com eventuais altas de preços no varejo, ainda que também aqui a forte concentração tenda a conferir maior equilíbrio nas relações.

 

Os analistas ponderam que é cedo para entender as posturas dos novos colossos nessas duas pontas, e as empresas se apressaram a tentar diluir esses temores, sobretudo no que tange às relações com os pecuaristas.

 

Para Ferraz, nessa ponta a ainda restrita oferta de animais no Brasil e em outros países fortes em carne bovina - como Argentina, Estados Unidos e Austrália - tende a evitar maiores choques nos próximos anos, até porque a demanda doméstica e global por carnes e alimentos em geral deve continuar aumentando.

 

No front externo, desde que confirmadas as projeções de elevação de demanda, Ferraz considera os movimentos positivos, pelo menos em uma primeira análise. Tendo em vista as persistentes barreiras comerciais em vigor em diversos mercados, escala, portfólio diversificado e marcas fortes podem fazer a diferença.

 

Um dos efeitos da concentração no mercado externo é que as empresas brasileiras deverão ter maior poder de barganha na hora de vender a carne, avalia Fabiano Tito Rosa, da Scot Consultoria.

 

Uma estimativa feita pela consultoria mostra que JBS e Marfrig têm agora juntas quase 70% das exportações brasileiras de carne bovina in natura. A concentração dos volumes exportados é reflexo da fusão da JBS com a Bertin e do arrendamento pela Marfrig de 12 plantas do Margen e do Mercosul.

 

Considerando números das exportações das empresas e do país no segundo trimestre deste ano, a Scot chegou ao resultado. Num volume de 250 mil toneladas de carne in natura embarcado pelo país no período, a JBS teve 28,43% e a Bertin, 17,9%. Juntas somaram 46,34%. Já a Marfrig teve 16,18% e o Mercosul, 4,8%. Isso soma quase 21%. Como não obteve números precisos para o Margen, a Scot arrendou o total para a Marfrig, considerando os arrendamentos, para 23,6%.

 

Tito Rosa explica que os percentuais de participação nas vendas externas de carne in natura não se alteram muito de um trimestre para o outro, por isso os números considerados na estimativa são um bom indicador de qual será a fatia das empresas após as últimas operações.

 

Em sua análise, com maior musculatura, as empresas terão maior poder de barganha. "Os importadores terão menos opções. O Brasil exporta 30% da carne in natura do mundo e essas empresas terão quase 70% das exportações brasileiras", observa. Segundo ele, neste novo cenário, o país deverá ter maior força para formar preços na carne bovina.
 


Veículo: Valor Econômico


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