Setor privado pede urgência no aperto fiscal

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O setor privado começa a intensificar a pressão para que o governo exerça um aperto fiscal a partir deste ano. Segundo especialistas, as empresas aumentaram seus investimentos no primeiro trimestre e a elevação da taxa básica de juros (Selic) também já demonstra uma iniciativa para que nada possa atrapalhar o crescimento do País em 2010. No entanto, se não houver reformas, como a fiscal, o Produto Interno Bruto (PIB) brasileiro não será expressivo nos próximos anos.

 

Na semana passada foi divulgado, pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), que a Formação Bruta de Capital Fixo (FBCF) cresceu 26% no primeiro trimestre deste ano, na comparação com igual período do ano passado. Para economistas, o resultado demonstra a confiança dos empresários em investir no País e garantir seu crescimento. Em paralelo a este número, e justamente porque os primeiros três meses deste ano apontaram crescimento do PIB (9%), o Comitê de Política Monetária (Copom), do Banco Central (BC), elevou de 9,50% para 10,25% a taxa Selic, visando a conter a pressão inflacionária. Especialistas, porém, acreditam que o governo precisa fazer mais para que os dados sobre a economia sejam positivos no longo prazo.

 

Recentemente, o governo fez um segundo corte no Orçamento para este ano. O total de contingenciamento foi de R$ 31,9 bilhões. De acordo com o ministro do Planejamento, Paulo Bernardo, este foi um sinal de que o governo está se esforçando para que a inflação não freie o desenvolvimento brasileiro. Mas, para o economista da MCM Consultores, Marcos Fantinatti, o bloqueio de gastos deveria ser muito maior. "O ideal seria um terceiro corte para 2010, o que dificilmente irá acontecer. Se o governo aumentasse sua receita sem aumentar a despesa, daria fôlego para alcançar a meta de superávit [3,3% do PIB]", entende o especialista.

 

Fantinatti acredita também que o empréstimo que o Tesouro Nacional libera para bancos estatais, como foi o caso mais recente do Banco do Nordeste, prejudica a dívida pública bruta "à medida que incendeia a demanda e afrouxa a tentativa de um aperto fiscal". "É necessário que ocorra uma pressão por parte do setor privado, já que quem paga esta conta [endividamento público] é a sociedade", diz.

 

"Os empréstimos são desnecessários. O fato de a dívida do Tesouro Nacional aumentar para conceder aportes ao BNDES, sendo que este montante é repassado a grandes empresas que podem obter crédito no mercado mundial, não é uma despesa de boa qualidade", analisa o conselheiro do Conselho Regional de Economia (Corecon-SP), Manuel Enriquez Garcia. Ele não acredita que deve ocorrer ajuste ou aperto fiscal, "por ser momento de bonança". "Deve sobrar dinheiro com o aumento da receita, originado pelos altos valores arrecadados dos impostos durante 2010. Aquilo com que devemos nos preocupar mais é a qualidade dos gastos", defende.

 

O professor de MBA da Brazilian Business School (BBS) Ricardo Torres discorda de que os empréstimos a bancos estatais sejam um dos pontos prejudicais para as contas públicas. "O BNDES exerce um papel social fundamental para o setor privado. De forma geral, os bancos estatais preenchem a lacuna para o crescimento coordenado do País."

 

Ele, entretanto, concorda com que o governo gasta demais e de maneira mal administrada, de modo que não se investe em setores fundamentais para a sociedade, como educação e saúde. "Com relação ao aperto fiscal, o mais importante seria modificar a estrutura de impostos. Não é viável que o custo de empregar um funcionário seja de 6,2%, por exemplo. Os impostos são um peso para toda população, não só para os mais ricos, como o governo prega", justifica Ricardo Torres.

 

Crescimento sustentável

 

"Temos um setor público obsoleto, que gasta demais. Por que os juros no Brasil são muito altos? Porque a relação dívida pública e PIB é muito alta", criticou o diretor da Economia da Fundação Getulio Vargas (FGV), Carlos Langoni, ao participar de evento da Bloomberg, na última sexta-feira. "O crescimento de 9% não é sustentável. A capacidade de mobilizar a poupança doméstica ainda é muito baixa [16% do PIB]", disse. Ele também afirma que o controle da inflação é a chave do crescimento sustentável. "A estabilidade relativa dos preços é vital. Preocupam muito o IPCA e o IGPM. Espero que o governo atue com rigor. Temos de aprimorar nossa âncora fiscal", completou.

 

O economista-chefe do Itaú Unibanco, Ilan Goldfajn, que também participou do evento, comentou que é preciso implantar reformas no médio e no longo prazo e disse que a política fiscal é muito importante neste sentido. "Temos de aproveitar o momento de bonança e cortar gastos. O Brasil vai crescer 7,5% este ano. Se o Brasil não fizer nada a partir de agora, com a retirada dos estímulos já serão 6%."

 

Ele chama a atenção, ainda, para a crise nos países europeus. "Se a crise da Europa ficar mais crítica, o crescimento do Brasil no ano que vem será de apenas 2,5%."

 

De acordo com o diretor de Gestão e Estratégia do Bradesco Asset Management (Bram), Joaquim Levy, para o crescimento sustentável é necessário um "mix de política fiscal e monetária". Ele acredita que a taxa de juros deve ficar de 11% a um pouco acima deste percentual. "O PIB chegar a 7% é muito fácil, mas temos de estar preparados para mudanças no cenário internacional. E, para isso, precisamos de soluções flexíveis. Na Europa, por exemplo, a Inglaterra terá de cortar gastos em 2 ou 3 pontos do PIB para organizar o fiscal."

 

Economistas afirmam que governo precisa fazer sua parte para garantir que o Brasil tenha crescimento sustentável na economia sem gerar pressão inflacionária, com a diminuição de gastos públicos.

 


Veiculo: DCI


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