Jornal alerta para problemas enfrentados por bancos pequenos desde o escândalo com o PanAmericano, no ano passado
O aumento do crédito concedido pelos bancos brasileiros vem criando uma "fachada de prosperidade que frequentemente esconde problemas mais profundos", segundo afirma reportagem publicada nesta quarta-feira pelo diário econômico britânico Financial Times.
O jornal cita o sucesso verificado nos últimos tempos pelos grandes bancos brasileiros, como Itaú-Unibanco, Banco do Brasil e Bradesco, mas chama a atenção para o fato de que "apenas no último mês, dois pequenos bancos no Brasil tiveram que ser salvos pelo governo, e analistas preveem que mais alguns enfrentarão graves dificuldades até o fim do ano".
"As recentes medidas do Brasil para conter o crescimento do crédito, como o aumento das taxas de juros e dos requerimentos de reservas dos bancos, aumentou o custo dos financiamentos e atingiu os pequenos bancos de forma mais dura. Normas internacionais mais estritas sob a regulamentação do (acordo internacional) Basileia 3 também aumentaram a pressão", observa o jornal.
A reportagem comenta, porém, que "o ponto de inflexão" foi a crise de confiança sobre o nascente mercado de securitização (transformação de dívida em títulos para venda a investidores) do país, atingido pelo escândalo do Banco PanAmericano, no final do ano passado.
O Banco Central verificou que os balanços do PanAmericano continham dívidas que já haviam sido vendidas e que o banco havia vendido algumas dívidas mais de uma vez.
"Como resultado, os bancos maiores desde então estão mais relutantes em comprar títulos de dívida de bancos menores por temor de que eles estejam fazendo o mesmo (que o PanAmericano), retirando dessas instituições sua fonte mais vital de financiamento", diz o texto.
Bolha na favela
Em outro texto na mesma página, o jornal comenta sobre os temores crescentes de uma possível bolha gerada pelo aumento acelerado no crédito.
Como exemplo, a reportagem cita o aumento nos valores dos imóveis no Morro Santa Marta, no Rio de Janeiro, pacificado há três anos com a instalação de uma UPP (Unidade de Polícia Pacificadora).
Segundo um líder comunitário local, casas que há três anos eram vendidas a R$ 20 mil estão sendo negociadas hoje a R$ 50 mil.
O jornal observa que os recordes de preços das commodities exportadas pelo país e o aumento do fluxo de investimentos estrangeiros vêm provocando um "boom histórico" na economia.
"Os preços de imóveis estão decolando, o crédito para o consumidor está em alta e os lucros dos bancos estão inchando. Mas há preocupações crescentes sobre se o Brasil está ficando dependente desse fluxo inesperado de dinheiro fácil. Cada vez mais há temores de que o Brasil esteja caminhando para uma bolha", afirma o texto.
Sinal vermelho
O jornal aponta vários exemplos que indicam que a economia está operando a plena capacidade, mas observa que ainda assim a situação do país está longe de se assemelhar à dos países desenvolvidos antes da crise econômica global de 2008.
O texto comenta que o nível de crédito em relação ao PIB no Brasil ainda é muito inferior do que nos Estados Unidos ou na Espanha antes da crise, que as hipotecas ainda representam apenas 4% do PIB e que não há registro no país dos derivativos de "subprime" (venda de títulos de dívida de empréstimos concedidos sem garantias), principal catalisador da crise global.
Além disso, observa o FT, o Banco Central brasileiro já age para tentar conter o crédito, com aumentos de taxas e elevação de juros.
Ouvido pelo jornal, o diretor do FMI para o Hemisfério Ocidental, Nicolás Eyzaguirre, diz que a economia brasileira ainda não está superaquecida, mas adverte que se houver uma queda nos preços das commodities internacionais aos níveis de 2005, o déficit em conta corrente brasileiro poderia mais do que dobrar, a 5% do PIB, deixando o país vulnerável.
O texto comenta ainda que um aumento nas taxas de juros nos Estados Unidos também poderia estancar o fluxo de divisas ao Brasil.
"Eyzaguirre compara a situação do Brasil a um carro que está se aproximando ao sinal vermelho um pouco rápido demais. O motorista precisa começar a frear agora ou corre o risco de derrapar mais para a frente", diz o texto.(BBC Brasil)
Veículo: O Estado de S.Paulo