Governador de Sergipe diz que Estados do Nordeste, Norte e Centro-Oeste querem garantias de políticas de desenvolvimento regionais
A reforma tributária não pode ser apenas a unificação do ICMS, com os Estados do Nordeste, Norte e Centro-Oeste perdendo arrecadação e ficando sem um instrumento para fazer política de desenvolvimento regional e que possa substituir com êxito a guerra fiscal. Por conta desses temores, o governador de Sergipe, Marcelo Déda (PT), disse ontem que os Estados não estão dispostos a fazer um "haraquiri sertanejo".
Ele advertiu que a tentativa de usar a ideia de trocar o indexador da dívida dos Estados como moeda de troca para unificar o ICMS está longe de ser suficiente. "Com todo o respeito que o secretário executivo (do Ministério da Fazenda) merece, não tentem negociar conosco como se fôssemos crianças capazes de serem levadas por um pirulito", disse Déda ao Estado, referindo-se a Nelson Barbosa, o responsável por tocar a reforma tributária na esfera técnica. "Até o momento, o governo tem uma proposta de reforma do ICMS. Falar em reforma tributária nesses termos é uma licença poética."
As declarações do governador de Sergipe se inserem no contexto em que a reforma tributária subiu a rampa do Planalto, na quarta-feira da semana passada, quando a presidente Dilma Rousseff recebeu em Brasília os governadores das regiões Norte, Nordeste e Centro-Oeste.
O governo federal acenou com a promessa de rever o indexador de correção das dívidas dos Estados em troca de apoio à reforma tributária.
Não se trata de uma rebelião propriamente dita, mas os governadores nordestinos, entre eles três dos mais importantes aliados do Planalto - Eduardo Campos (PE), Cid Gomes (CE) e Déda -, deram sinais claros ao final da reunião de que não será fácil para a equipe econômica conduzir a agenda das negociações da reforma tributária de forma fatiada, com enfoque exclusivamente técnico e centrado apenas na unificação do ICMS.
"Nossa preocupação é que se mude a legislação do ICMS, aprove-se o que interessa ao governo e aos Estados mais ricos, e as políticas de desenvolvimento regional e de compensação fiquem para as calendas", resumiu Déda. Embora a guerra fiscal desequilibre as relações federativas, o governador de Sergipe lembrou que esse recurso ajudou a industrializar as regiões do Norte e do Nordeste do País.
"Nós estamos dispostos a discutir, sob esse título pomposo de reforma tributária, a reforma do ICMS. Mas o que nós queremos são garantias de que os Estados, especialmente os das regiões menos desenvolvidas, não ficarão desprovidos de qualquer política de desenvolvimento regional que possa substituir com êxito a guerra fiscal", acrescentou o governador.
Sem babá. Marcelo Déda ainda rebateu os argumentos de que a troca de indexador para corrigir a dívida dos Estados, ao liberar espaço fiscal para os Estados, possa promover um aumento descontrolado de gastos.
"Não precisamos de babá nem preceptor para nos ensinar responsabilidade fiscal. Nós estamos praticando responsabilidade fiscal há muito tempo. Nossa preocupação é manter o nível de investimentos", afirmou. O governador disse que não faz sentido os Estados pagarem juros mais altos do que empresas e do que o governo federal.
Déda elogiou a entrada efetiva da presidente Dilma Rousseff na discussão da reforma, que, segundo ele, tem natureza econômica, mas com "moldura política". "A presidente trouxe para si a responsabilidade desse primeiro contato e colocou a discussão nos termos que nós queríamos: uma discussão política da federação brasileira", disse, negando que o movimento dos governadores tenha sido uma "rebelião" contra o processo desencadeado pela Fazenda.
O governador explicou ainda que a possibilidade, que começa a ser admitida pelo Ministério da Fazenda, de se usar tributos como PIS e Cofins para manter os incentivos às indústrias instaladas no Norte e Nordeste, não substitui a necessidade de um fundo de desenvolvimento regional. Ele argumentou que o fundo tem por objetivo fomentar a melhora na infraestrutura e na educação das regiões mais pobres, viabilizando a paulatina emancipação delas, enquanto a redução de tributos tem uma mira mais de curto prazo, mantendo o processo de instalação de indústrias nesses Estados.
Os governadores querem mais garantias de que as perdas serão compensadas, isto é, saem os incentivos estaduais feitos com o ICMS e entram os benefícios federais, com tributos cobrados pela Receita Federal. Num discurso claro, eles dizem que estão cansados de ver o Planalto fazer política de incentivos com o "chapéu dos Estados".
Para os governadores, foi isso o que o governo fez com a Lei Kandir, que desonerou o ICMS das exportações, e também com os incentivos dados pelo Ministério da Fazenda, na crise financeira de 2009, por meio de tributos cuja arrecadação é compartilhada com Estados e municípios.
Veículo: O Estado de S.Paulo