Perdas financeiras engolem lucro trimestral de empresas

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A forte alta do dólar e as desastrosas operações com derivativos cambiais têm provocado estrago nos balanços das empresas brasileiras de capital aberto no terceiro trimestre. Até o momento, o resultado financeiro, que inclui os ganhos ou perdas com a alta do dólar, consumiu R$ 5,5 bilhões, o equivalente a 48% do lucro trimestral das companhias, de acordo com dados da consultoria Economática e dos balanços. Para se ter uma idéia, entre julho e setembro do ano passado as mesmas companhias registraram um ganho financeiro de R$ 505 milhões. Os números só não são piores graças aos expressivos resultados anunciados pela Vale, que fugiu à regra e conseguiu se beneficiar da alta do dólar.

 

Nesta quarta-feira, saíram os aguardados números da Sadia, que anunciou um prejuízo de R$ 777 milhões no terceiro trimestre, puxado pela perda financeira de R$ 1,214 bilhão provocada, principalmente, pelas apostas em derivativos cambiais exóticos.

 

Mesmo as empresas que não tinham exposição a esse tipo de instrumento, mas possuem dívidas atreladas à moeda norte-americana, registraram perdas no trimestre. Nesse caso, o efeito da variação cambial é somente contábil, ou seja, não representa efetivamente uma saída do caixa das companhias, já que o pagamento do financiamento ocorrerá apenas no longo prazo. A queda no lucro, porém, acaba afetando a distribuição de dividendos aos acionistas.

 

Como o dólar no final de setembro estava em R$ 1,91, as empresas podem vir a registrar novas perdas no balanço dos últimos três meses do ano se o dólar permanecer nos patamares atuais. Nesta quarta-feira, a moeda norte-americana fechou cotada a R$ 2,142. No caso das exportadoras, o impacto financeiro negativo pode ser compensado pelo aumento nas receitas com as vendas externas.

 

Na análise do economista e professor do Ibmec São Paulo, Otto Nogami, ao menos no caso das empresas que possuem dívidas em dólar, havia pouca margem de manobra para evitar os prejuízos no terceiro trimestre. "Houve uma mudança muito grande no cenário, que criou uma defasagem na estrutura financeira das companhias", diz. Ele lembra que, até o início de agosto, os analistas projetavam uma situação oposta, de valorização do real. "Toda uma engenharia financeira havia sido criada para viabilizar um fluxo de caixa com a possibilidade de o dólar chegar a R$ 1,50, e não a R$ 2,40", afirma.

 

Para o analista Pedro Galdi, da SLW Corretora, agora não é o momento para que as empresas corram ao mercado para diminuir sua exposição à flutuação da moeda norte-americana. "Em uma situação de estresse como a atual, os custos seriam muito elevados e poderiam não surtir o efeito desejado", diz. Ele considera que as medidas anunciadas pelo governo devem contribuir para acalmar o mercado e conter a disparada do dólar, por isso as empresas que não possuem compromissos imediatos em moeda estrangeira têm condições de esperar a situação se normalizar.

 

Com ou sem hedge?

 

As perdas financeiras poderiam ter sido reduzidas ou até mesmo evitadas se as companhias tivessem feito a proteção (hedge) da dívida. A medida, no entanto, nem sempre é indicada, na avaliação do consultor Luiz Jurandir Araújo, da Fundação Instituto de Pesquisas Contábeis, Atuariais e Financeiras (Fipecafi). "Os custos do hedge são muito altos e cabe aos administradores definir o grau de perda tolerável pela empresa com a exposição cambial." Ele lembra que, apesar do risco de ter o lucro e a distribuição de dividendos reduzidos em conseqüência da alta do dólar, o resultado poderia ser o mesmo se a companhia mantivesse 100% da dívida protegida contra a oscilação da moeda durante um longo período de tempo.

 

O principal problema, segundo Araújo, não é a ausência de hedge da dívida, e sim de uma política clara de investimentos por parte das empresas. "Ninguém consegue prever o futuro. O que é preciso é ter disciplina estratégica para saber se uma grande flutuação cambial de curto prazo consegue ser absorvida", observa.

 

O consultor chama a atenção para o fato de a maior parte das companhias, inclusive as de capital aberto, não possuir nenhum documento formal que determine, por exemplo, o grau de exposição cambial, o que segundo ele é preocupante. "O capitalismo brasileiro tem muito a aprender com esta crise", destaca. Para ele, o caso da Vale serve de referência, mas não significa que todas as empresas precisassem adotar o mesmo tipo de proteção. "Para a Vale, faz todo sentido ter uma cobertura maior da variação do câmbio, mas pode ser que o mesmo não valha para outra companhia."

 

Araújo faz duras críticas às posições alavancadas, ou seja, acima do valor das receitas em dólar, adotadas por empresas como Aracruz e Sadia. Ele diz que, se as companhias desejassem tomar esse tipo de risco, o melhor a fazer seria destinar recursos a um fundo exclusivo com esse objetivo.

 

Veículo: Gazeta Mercantil


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