Cresce dependência do Brasil em relação à China, diz banco

Leia em 5min

O Brasil está ajustando "passivamente" sua economia a demandas da China, numa forma crescente de dependência, avalia o banco Nomura, em Nova York, em nota enviada aos clientes. "Vemos a dependência se aprofundar. Para o melhor ou pior, o futuro econômico do Brasil será mais e mais em função de decisões tomadas em Pequim", estima o banco.

 

A relação econômica bilateral, avaliam os economistas da instituição, está sendo marcada por uma parceria do tipo Norte-Sul (rico e pobre) entre duas economias em desenvolvimento. O relatório destaca que o Brasil se torna mais dependente das exportações de commodities para o mercado chinês. Ao mesmo tempo, companhias brasileiras estão cada vez mais dependentes de componentes baratos produzidos na China.

 

O mercado chinês absorveu 15,2% das vendas externas brasileiras em 2010, ante 2% em 2000, segundo estudo divulgado em abril pelo Banco Central. A autoridade monetária ressalta que o saldo comercial da balança voltou a ser "amplamente favorável" ao Brasil a partir de 2009, ano em que o país asiático passou a ser o principal parceiro comercial do Brasil, destronando os EUA. Em 2010, o Brasil exportou US$ 30,8 bilhões à China e importou US$ 25,6 bilhões, o que resultou em superávit de US$ 5,2 bilhões, praticamente igual ao registrado em 2009.

 

As exportações brasileiras à China se concentram em matérias-primas. Em 2001, 63% dos embarques brasileiros eram representados por produtos básicos. No ano passado, o número cresceu para 84%. Em 2010, os chineses absorveram 46,1% das exportações brasileiras de minério de ferro, 64,6% das de soja e 24,9% do petróleo.

 

Na prática, a relação Brasil-China replica a relação de dependência experimentada pelo Brasil com os EUA no período pós-Segunda Guerra Mundial, escrevem os analistas Tony Volpon e George Lei, do Nomura. O banco constata que, com a eleição de Dilma Rousseff, a natureza do debate envolvendo a política econômica no país mudou e mais atenção tem sido dada aos perigos da desindustrialização e da excessiva valorização do real. No entanto, estima que o governo Dilma "não desenvolveu alternativa coerente para sua crescente dependência em relação à China".

 

Analistas consultados pelo Valor concordam em parte com o Nomura. Segundo um deles, a dependência existe no setor de commodities, mas a exportação total do país tem outros destinos relevantes além do mercado chinês.

 

Caso o país asiático diminua a taxa de crescimento, como reflexo das turbulências externas, o superávit comercial brasileiro seria atingido com a queda do volume de importações chinesas, assim como do preço das commodities, influenciados pela forte demanda da China, projetam economistas. A única saída para diminuir a dependência chinesa seria fortalecer a indústria nacional e aumentar as exportações de manufaturados.

 

"Se a relação Brasil-China não é igual à relação Brasil-EUA no passado, uma hora será", prevê Fabio Silveira, sócio-diretor da RC Consultores, que vê como "óbvia" a redução do crescimento chinês nos próximos anos. Em um primeiro momento, diz, o impacto seria relativamente pequeno, mas no prazo de um ano e meio a dois anos, a exportação brasileira seria prejudicada e a atividade interna teria desaceleração mais forte.

 

Para Welber Barral, sócio da Barral M Jorge Consultores, a dependência do Brasil em relação à China só é verdadeira no mercado de commodities, mas não se estende a toda a pauta de exportações. Segundo ele, apesar de a China ser no momento o principal parceiro comercial do Brasil, não há como comparar a relação Brasil-China com a Brasil-EUA há dez anos.

 

"A China não chega a ter um percentual tão grande das exportações brasileiras. Os EUA, ao contrário, já chegaram a ter 26% das vendas externas do Brasil", observa o consultor. Barral ressalta, no entanto, que o país sai perdendo com a pouca diversificação das exportações destinadas aos chineses. "O Brasil é muito dependente da China em algumas commodities. Isso não é bom para o país."

 

Relatório do departamento de relações internacionais e comércio exterior (Derex) da Fiesp mostra que o predomínio de produtos básicos na pauta exportadora brasileira à China se aprofundou em 2011. De janeiro a julho, enquanto as commodities representaram 88% do valor exportado à China, 96% das importações procedentes do país asiático foram de manufaturados. O superávit total do Brasil com a China atingiu US$ 16,2 bilhões em sete meses, mas a balança de manufaturados acumula déficit de US$ 16,2 bilhões de janeiro a julho, com previsão de encerrar o ano em US$ 32 bilhões.

 

O setor de commodities, nota o Derex, tem receita garantida pelo aumento de preços, já que, em volume, as exportações de minério de ferro tiveram crescimento pouco expressivo entre janeiro e julho (13%), enquanto as de soja caíram 5% e a de óleos brutos de petróleo, 14%. No mesmo período, as importações brasileiras de manufaturados chineses aumentaram 34% em quantidade embarcada e 33% em valores absolutos.

 

Para Barral, caso a China desacelere o crescimento nos próximos anos, o Brasil seria afetado de três formas: o quantum de exportações seria reduzido, assim como o valor delas, e o real seria desvalorizado. "Boa parte do superávit brasileiro vem de preços de commodities. Se houver redução da demanda, o preço cai. Se cai o preço, o real se desvaloriza."

 

Para reagir ao impacto, Silveira, da RC, diz que o Brasil poderia, em um primeiro momento, praticar políticas anticíclicas, como o incentivo ao crédito, mas não pode "queimar reservas para o resto da vida". "Chegará uma hora em que os preços das commodities vão ser ajustados para baixo. Isso vai custar caro para o país", diz o economista.

 

Veículo: Valor Econômico


Veja também

Juro retrai crédito de cartão e cheque

Taxas mais altas e medidas macroprudenciais brecaram essas modalidades, mas ritmo segue forte no empréstimo habit...

Veja mais
Estoques ficam acima do previsto em quase 80% dos setores industriais

A acumulação de estoques pela indústria acelerou-se em julho, apontando para uma produç&atil...

Veja mais
Crise impõe uma política fiscal apertada, diz Mantega

O agravamento da crise mundial impõe ao governo brasileiro uma política fiscal apertada, de forma a abrir ...

Veja mais
Fabricantes de bens duráveis lideram aumento de importações

Os fabricantes de bens de consumo duráveis predominam entre os grandes importadores que apresentaram ritmo mais v...

Veja mais
Emissão de cheque sem fundo tem alta no país

Dos 80,8 milhões de cheques compensados no país em julho, 1,6 milhão foi devolvido por falta de fun...

Veja mais
Receita Federal aperta o cerco das importações brasileiras

O subsecretário de Aduana e Relações Internacionais da Receita Federal, Ernani Checcucci, afirmou q...

Veja mais
Varejo aperta crédito temendo incertezas

Com um cenário incerto, empresas como Salfer e Gazin adotam medidas mais conservadoras na aprovação...

Veja mais
Intenção das famílias é continuar a gastar

A intenção de consumo das famílias brasileiras voltou a crescer em agosto, com alta de 2,5% em rela...

Veja mais
Alimentos puxam volta da inflação

Os três índices de inflação divulgados nesta semana confirmaram que o começo de agosto...

Veja mais