A crise econômica vivenciada pela União Europeia e pelos Estados Unidos não está afetando apenas as companhias destes países. No Brasil, depois de anos de crescimento, as empresas nacionais que começaram um processo de internacionalização tiveram de frear suas aspirações estrangeiras. De acordo com dados de agosto do Banco Central (BC), os investimentos diretos brasileiros no exterior caíram 41,6% em um ano. Segundo analistas consultados pelo DCI, as companhias tupiniquins voltarão a se instalar em outros mercados somente depois da resolução da crise.
Segundo Ivan Ramalho, presidente da Associação Brasileira de Empresas de Comércio Exterior (Abece), uma possível recessão mundial adiou o ingresso de companhias brasileiras em outros países. "Isso pode motivar uma desaceleração deste processo. Pode diminuir a velocidade. Porém, a internacionalização é irreversível", diz o ex-secretário-geral do Ministério de Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior (Mdic).
Para Ramalho, o movimento é decorrência do momento econômico pelo qual o País passa. "Hoje, o Brasil é globalizado. As empresas possuem, cada dia mais, vontade de se internacionalizar".
Com a alta concorrência mundial, grandes empreendimentos buscam locais que tornam atrativos a produção, e consequentemente, seus produtos. Segundo Felipe Leroy, professor do Ibmec de Belo Horizonte, alguns mercados específicos são ideais para parte da indústria brasileira. "O que a China oferece, por exemplo, em termos de mão de obra, logística, administração operacional, é muito atrativo para indústria de transformação, manufaturados".
No entanto, Leroy critica ações governamentais que beneficiam grandes empresas em detrimento das pequenas. "O investimento é muito direcionado. O Governo acabou concentrando gigantescas empresas com empréstimos subsidiados, enquanto que o pequeno padece de crédito", argumenta. De acordo com o economista, as atitudes do Governo são contrárias à internacionalização.
Ivan Ramalho discorda da análise de Leroy. Segundo o ex-secretário, o governo tem interesse no processo de internacionalização das empresas. "Da mesma maneira que outros países investem aqui, o Brasil deve investir fora também. Quando uma empresa produz em outra nação, abre-se um canal permanente de comércio exterior", afirma Ramalho. De acordo com o presidente da Abece, o Banco Nacional do Desenvolvimento Social e Econômico (BNDES) continua a fomentar o ingresso das companhias nacionais em outros países.
Beatrice Mayer, da Fundação Certi, conta assessorar empresas com aspirações internacionais, mas que elas estão avessas ao risco do mercado estrangeiro. "As companhias utilizam-se de recursos próprios para financiamento e alguns outros instrumentos nesse processo, como a Apex [Agência Brasileira de Promoção de Exportações e Investimentos], não o crédito direto no BNDES."
A busca dos brasileiros por mercados menos maduros, como a América Latina, é outra preferência citada por Mayer. "A concorrência nestes mercados é menor. Quem possui um produto diferenciado no Brasil, pode ter também na Colômbia, no Peru, por exemplo", explica.
Ramalho diz que estes mercados possuem um apelo maior para o empresário brasileiro. "A proximidade do idioma e geográfica são atrativos. Além de serem economias em crescimento", afirma.
No entanto, a soma enviada para estes países possui pequeno peso no montante de investimentos realizados em outras nações. Apenas Argentina e Uruguai figuram entre os dez principais destinos do dinheiro tupiniquim. Surpreendentes são as posições de alguns paraísos fiscais, como Ilhas Cayman, Ilhas Virgens Britânicas e Bahamas. Para o consultor Wagner Delarovera Pinto, consultor em internacionalização de empresas, brasileiras transnacionais utilizam as facilidades fiscais destes destinos para operar em diversos países. "Isso pode ser uma tendência de operação para empresas gigantescas. Isso envolve grandes investimentos. O custo com infraestrutura e advogados é muito alto. Por isso não considero uma tendência para pequenas e médias companhias", explica Pinto.
De acordo com o consultor, o maior destino dos investimentos é Argentina, Uruguai, Peru, Estados Unidos e México.
De acordo com o consultor, mesmo com grandes quantidades de investimentos feitos nestes paraísos fiscais, os destinos reais são Argentina, Estados Unidos, México, Peru e Uruguai. "Existe uma facilidade logística nesses países. O empresariado prefere abrir escritórios próximos de seus mercados", afirma. A soma do total enviado para essas nações, de acordo com o Banco Central, é de US$ 2,756 bilhões, cerca de um quarto do total de investimentos diretos. Até agosto deste ano, US$ 10,488 bilhões foram aplicados em outros países, o que representa uma queda de 41,6% se comparado ao mesmo período de 2010. No ano anterior, US$ 17,986 bilhões foram remetidos para fora do Brasil como investimento direto.
Veículo: DCI