Classes D e E compram mais "supérfluos"

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A filha da faxineira Lucineide de Sousa conquistou neste ano o direito a um xampu próprio para o seu cabelo, diferente do usado pelo restante da família. O creme para pentear também passou a fazer parte da cesta de compras. As roupas dos quatro integrantes da família, que somam renda de R$ 1,3 mil, ganharam mais cuidados. "Eu não usava muito amaciante, só para toalhas, agora ponho na máquina de lavar para todas as roupas" conta a moradora de São Paulo, que calcula um gasto adicional com higiene e beleza de R$ 50 por mês este ano.


Nos 12 meses anteriores a setembro, as classes D e E superaram pela primeira vez a C em número de categorias com presença em mais de 70% dos lares, segundo a consultoria Kantar Worldpane l. Em um levantamento com 63 tipos de produtos, entre alimentos, bebidas, higiene e beleza, 39 já podem ser consideradas consolidadas nos lares com renda de até quatro salários mínimos. De 2002 para cá essas famílias aumentaram em 85% o número de categorias frequentes na cesta de compras.


"O peso de alimentos e bebidas nos carrinhos das classes D e E ainda é muito grande, mas o aumento de renda tem permitido a elas acesso a algumas outras categorias, como itens de higiene, beleza e limpeza", afirma Christine Pereira, diretora comercial da Kantar. Foi essa faixa de renda que mais contribuiu com o crescimento do consumo total no terceiro trimestre, com aumento de 4,1% em volume, acima da média de 2,7%.

O consumo da classe C avançou bem menos no período, 1,6%, enquanto cresceu 2,8% nas A e B. "A classe C tem outras aspirações agora, como viajar ou equipar o lar com eletrodomésticos. A e B querem comprar mais produtos de luxo. Já as classes D e E, quando ganham mais, priorizam os bens de consumo não duráveis", afirma Christine.

Entre os itens com maior crescimento de penetração nas classes D e E estão colônia, pós-xampu, inseticida e amaciante. O sabão líquido para lavar roupas, ainda em fase de experimentação pela população de renda mais alta, conquistou 1,9 milhão das famílias que ganham até quatro salários mínimos em um ano. Produtos como xampus específicos para os cabelos das crianças e alvejantes sem cloro também ganharam espaço.

As classes D e E acompanham uma tendência geral de sofisticação do mercado. No acumulado do ano, enquanto o consumo de produtos básicos avançou 1% em volume, o de não básicos cresceu 5%, segundo a Kantar.

Para conquistar as famílias de menor renda, Christine afirma que é preciso fazer o preço caber no bolso delas. Uma estratégia é lançar embalagens menores. "Eu compro sempre a pequena, o suficiente para usar nos próximos 30 dias", confirma Lucineide.

"O consumo da classe E ainda é um pouco mais restrito, mas a D já está ocupando o foco que há dois anos era da C", diz o professor de finanças do Ibmec, Nelson de Sousa. O ganho de renda, que permite acessar outras categorias, deve ser ainda maior no ano que vem, quando o governo prevê reajuste nominal de 14% no salário mínimo. Ainda não é possível saber, entretanto, o impacto sobre a cesta. "A grande dúvida é se eventuais reajustes farão frente ao aumento de preços que vem ocorrendo. Há uma expectativa de que haja um impulso nos preços de supermercado em dezembro", afirma.

Sousa alerta para o risco de inadimplência. O crédito, segundo ele, ainda não é tão expressivo no cotidiano da classe E, mas já é realidade entre a população de classe D, não só para compras de bens duráveis, mas para pequenos gastos do dia a dia. "Ela já começa a ficar com um endividamento elevado, que se arrasta por sete ou oito meses. Antigamente o 13º salário era para pagar as dívidas, mas hoje, para apagar o passado, elas teriam que receber o 14º, o 15º, o 16º...".



Veículo: Valor Econômico


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