Agronegócio e classe C levam interior de São Paulo a liderar consumo no País

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Sustentado pela renda do agronegócio da cana-de-açúcar, o interior paulista foi a região que mais ampliou gastos com alimentos, bebidas, produtos de higiene e limpeza neste ano, à frente até dos mercados "queridinhos" do consumo, como o Nordeste e o Centro-Oeste. O desembolso com esses itens cresceu 14,8% no interior do Estado de São Paulo no primeiro semestre em relação a igual período de 2010, revela pesquisa exclusiva da Kantar Worldpanel.

Enquanto isso, as vendas nacionais desses produtos aumentaram, em média, 10,4% entre janeiro e junho deste ano. No Nordeste e no Centro-Oeste, o consumo subiu 11,7% em cada região. "Foi a primeira vez desde 2007 que o interior de São Paulo registrou a maior taxa de crescimento de consumo de itens vendidos nos supermercados em relação às demais regiões do País", observa Christine Pereira, diretora comercial e responsável pelo estudo.

Semanalmente, a empresa especializada em pesquisa domiciliar visita 8.200 lares em todo o País para radiografar o consumo de uma cesta com cerca de 100 produtos.

Pela pesquisa, no primeiro semestre, a quantidade comprada de produtos não básicos aumentou 10,2% no interior paulista e 6% no País, ao passo que o consumo de básicos caiu 3,1% no interior de São Paulo e subiu 0,3% na média de todas as regiões. Os maiores aumentos nos volumes no interior paulista foram para bebidas (7,6%), limpeza (6,5%) e perfumaria (5,8%).

Só as quantidades compradas de detergente líquido, sorvete e cerveja, por exemplo, cresceram 142%, 101% e 71%, respectivamente, no primeiro semestre deste ano em relação ao mesmo semestre do ano passado.

Cada vez que uma família do interior de São Paulo foi às compras de comida, bebida e artigos de higiene e limpeza ela gastou R$ 16,64, cifra 14,4% maior que a média do País (R$ 14,59). O desembolso médio da família de classe C do interior paulista, de R$ 16,11, superou o gasto médio do brasileiro no 1.º semestre.

Classe C. Christine atribui o crescimento excepcional do consumo do interior paulista ao aumento do número de famílias da classe C, aquelas com renda mensal entre R$ 2.180 e R$ 5.450. "A classe C é forte no interior de São Paulo e as classes D e E no Norte e Nordeste", ressalta a executiva. As classes D e E têm renda de até R$ 2.180, segundo os critérios usados na pesquisa.

De 2007 para 2011, o interior de São Paulo ganhou 700 mil lares da classe C, o dobro do acréscimo que houve no mesmo período na Grande São Paulo (350 mil) para essa classe de renda, diz Christine. Com isso, essas famílias da classe C do interior de São Paulo passaram a responder por 47% do consumo de alimentos, bebidas e produtos de higiene e limpeza da região, ante 41% do total das compras no Brasil.


Cana impulsiona consumo no interior

Pesquisa mostra que maiores taxas de aumento nas vendas do varejo no primeiro semestre ocorreram nas regiões sucroalcooleiras de SP

O pano de fundo do forte crescimento do consumo de alimentos, bebidas e produtos de higiene e limpeza no interior paulista é a riqueza proporcionada pela indústria sucroalcooleira. Pesquisa da Kantar Worldpanel mostra que as maiores taxas de aumento do consumo no primeiro semestre ocorreram exatamente nas regiões ligadas à produção de cana-de-açúcar.

Nas contas da RC Consultores, a renda da cana-de-açúcar deve somar neste ano R$ 34,9 bilhões. E a maior parte dessa cifra fica no Estado de São Paulo, o principal polo de produção de açúcar e álcool do País.

"A receita do produtor de cana-de-açúcar acaba sendo o principal indutor do crescimento para outros segmentos da região, como os prestadores de serviços, a construção civil e o comércio varejista", afirma Fabio Silveira, sócio diretor da consultoria e responsável pelas projeções.

Ele observa que o processo de geração de riqueza é cumulativo, isto é, vem ocorrendo há vários anos por causa do aumento dos preços do açúcar e do álcool. Entre 2009 e outubro deste ano, o preço do açúcar ao produtor em real mais que dobrou (103%) e o do etanol subiu quase 60%. A valorização dessas commodities disseminou a riqueza entre os setores da economia da região.

Essa é a percepção do diretor da Associação Paulista de Supermercados (Apas) da região de Bauru, que engloba 20 municípios, Erlon Godoy Ortega. "A cana-de-açúcar está mais estabilizada neste ano, e isso gera emprego, renda e consumo", diz o empresário, que dirige a rede de supermercados Serve Todos, com seis lojas no interior paulista.

Ele observa que as grandes redes varejistas como Walmart, Carrefour, Pão de Açúcar e Makro, por exemplo, estão no interior do Estado com lojas de "atacarejo", mistura de atacado com varejo, para disputar com as empresas regionais esse filão de mercado. "Hoje o mercado de consumo do interior não deve nada ao da capital", diz Ortega.

Ele conta que as maiores vendas por metro quadrado são das redes regionais de supermercados, que ficaram muito competitivas, especialmente por causa do avanço das gigantes do setor. Além da melhoria na gestão das redes regionais, ele observa que um certo bairrismo dos consumidores deu força às pequenas empresas na disputa com as grandes redes. De qualquer maneira, ele frisa que o fator decisivo é competitividade.

Jeitão caipira. "Metade da população do interior paulista é de classe média", afirma João Sanzovo, diretor de Sustentabilidade da rede Jaú Serv, com 28 lojas no interior. Ele diz que tem notado, há algum tempo, a ascensão das classes D e E para a classe C, mas só neste ano esse movimento teve impacto no consumo local. No primeiro semestre do ano passado, os dados da Kantar Worldpanel mostram que as vendas do interior tinham crescido apenas 3,6% sobre as de 2009.

"O consumidor do interior começou a gastar mais só agora por causa do jeitão caipira de viver", brinca Sanzovo. Ele explica que a população do interior é mais cautelosa e prefere primeiro consolidar os ganhos antes de ir às compras. No primeiro semestre, a sua rede, por exemplo, ampliou entre 15% e 18% as vendas ante o mesmo período de 2010.

Na rede Savegnago, uma das maiores do interior, com 22 lojas, que acaba de comprar 5 pontos de venda do Carrefour, o crescimento foi de 15,23% no primeiro semestre, ante o mesmo período de 2010. "O desempenho superou nossas expectativas", diz o diretor superintendente, Sebastião Edson Savegnago.

Entre os produtos que puxaram o crescimento estão itens não básicos, como perfumaria e bebidas quentes. "As vendas de xampus aumentaram 35% e o crescimento de bronzeadores foi expressivo", diz o empresário. Segundo ele, o consumo está sendo impulsionado pela classe C e pela geração de renda da cana-de-açúcar. A empresa, com sede em Sertãozinho (SP), tem a maioria das lojas no coração do setor sucroalcooleiro do Estado.


Classe C vai às compras com renda do campo

Mais iogurte, chopinho e viagens turbinam a economia na região de Ribeirão Preto


Os bons ventos que sopram a favor de Ribeirão Preto têm levado a classe C a consumir mais do que nunca e a galgar novas posições na escala social. Iogurtes ocupam o interior das geladeiras e o chopinho deixou há muito tempo de ser opção apenas em ocasiões especiais.

Para alguns, muito disso seria reflexo do agronegócio, que ajuda a impulsionar a economia local e de muitos municípios da região.

"Ribeirão Preto se desenvolveu muito nos últimos anos", diz o aposentado Sérgio Barretto, de 71 anos, que vive no Jardim Canadá com a família de seis pessoas. "Acho que muito disso se deve ao agronegócio, que tem movimentado dinheiro na região."

A opinião é compartilhada pelo supervisor comercial Fábio Chaves, que, ao lado da mulher, a advogada Taciana Rezende Prata, viu a renda familiar saltar mais de 100% nos últimos três anos. "Ribeirão tem colhido os frutos da expansão da cana", diz.

O casal mora com as duas filhas - Maria Júlia, de 6 anos, e Maria Clara, de 4 anos - em um apartamento no Jardim Ana Maria e os melhores rendimentos vieram da evolução no consumo. "Hoje compramos bem mais. Principalmente, produtos considerados supérfluos", conta a advogada, enquanto toma refrigerante com a família em uma tradicional choperia da cidade.

Apesar da fama da choperia, o que levou a família ao local foi a proximidade com sua moradia. "É mais cômodo consumir perto de casa", diz o marido, que garante frequentar também os supermercados da vizinhança.

"Principalmente nos fins de semana vejo pessoas de cidades da região e que vivem da cana vindo aqui, para fazer compras", conta. Ele trabalha em uma rede de ensino, onde diz sentir também o momento favorável da economia regional. "Hoje, além da mensalidade escolar, conseguimos agregar outros serviços. O pai também compra para o aluno da escola produtos como aulas de inglês ou caratê."

Disney. O comerciante Cássio Ronaldo de Morais, de 51 anos, é outro que diz ter sentido a evolução econômica. Antes morador no bairro Santa Cruz, região bem popular, hoje reside na Ribeirânea, área mais nobre onde os imóveis costumam ser construídos em terrenos de 400 metros quadrados. Mas essa melhora de vida ele garante que não é exclusividade sua. "No supermercado vejo as pessoas de classe média baixa comprando azeites e queijos nobres com frequência, coisa bastante incomum até anos atrás."

Com problema de nível elevado de açúcar no sangue, ele explica que antes tinha dificuldades para adquirir produtos do tipo diet, como iogurtes e leites especiais. "Hoje vou ao supermercado e já posso comprar sem medo de não caber no meu bolso", diz Morais, que este ano planeja levar o filho de 15 anos e a mulher para a Disney.

Morais é dono do "Trem Caipira", um minúsculo bar com uma enorme clientela que, por falta de espaço, tem mesas no lado externo. Ele conta que em seu negócio ficou claro que as pessoas estão com mais dinheiro para gastar. No local, a fiscalização obrigou a retirada de mesas da rua, reduzindo o número de clientes pela metade.

"Quando isso aconteceu, resolvi incrementar os serviços criando novas opções no cardápio e o resultado foi imediato. Mesmo com um movimento menor de pessoas, mantive o faturamento inalterado, uma vez que todos passaram a gastar bem mais."

 

Veículo: O Estado de S.Paulo


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