Defesa comercial protege empresas monopolistas e onera indústria

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O ativismo do governo Dilma na política comercial pode se tornar um tiro no pé. Levantamento feito pelo 'Estado' aponta que 73% das sobretaxas de importação em vigor hoje incidem sobre produtos que possuem, no máximo, três fabricantes no País. Em mais da metade dos casos (57%), a defesa comercial brasileira protege empresas monopolistas.

A situação se torna mais grave por causa da natureza dos produtos protegidos. A maioria é de partes, peças e insumos para a produção industrial. Para especialistas, as medidas de defesa comercial permitem reajustes de preços e elevam os custos das cadeias produtivas, prejudicando a competitividade da indústria, em vez de incrementá-la.

Um estudo publicado pelo Centro de Estudos de Integração e Desenvolvimento (Cindes) mostrou que 88% das medidas antidumping aplicadas pelo País desde 2008, quando estourou a crise global, até outubro de 2012, incidiram sobre bens intermediários, como químicos, siderúrgicos, plásticos e tecidos.

"Para proteger algumas poucas empresas, o governo prejudica várias outras. Se a companhia protegida opera em um setor concentrado, sua capacidade de elevar preço é ainda maior", diz Sandra Ríos, diretora do Cindes.

Segundo nota enviada pelo Ministério do Desenvolvimento, "82,3% das importações brasileiras são insumos de produção, logo é normal e razoável que uma maior quantidade de medidas de defesa comercial se aplique a essa categoria". O ministério diz ainda que "os setores petroquímico e siderúrgico respondem por 50% das medidas antidumping aplicadas no mundo".

A Vicunha Têxtil, por exemplo, conseguiu tarifas antidumping para fios e fibras de viscose produzidos na China, Índia, Indonésia, Tailândia, Taiwan e Áustria. A empresa é a única fabricante de fibras de viscose do Brasil e divide com outras duas empresas a produção dos fios. Os produtos são utilizados na fabricação de tecido, um insumo importante para milhares de confecções. Procurada, a Vicunha não deu entrevista.

No setor químico, praticamente todas as multinacionais são protegidas por tarifas antidumping. Boa parte das sobretaxas foi aplicada para produtos específicos em que apenas uma empresa é a única fabricante no País ou detém a maior parte da produção nacional. A reportagem encontrou medidas que beneficiam Bayer, Monsanto, Basf, Rhodia e Lanxess.

20 anos. A resina de policloreto de vinila (PVC), usada na produção de tubos, embalagens e cabos, é um caso extremo. Segundo consumidores de PVC, as importações estão sujeitas a tarifas antidumping há mais de 20 anos. Empresas do México, EUA, China e Coreia do Sul pagam sobretaxas que variam de 2,7% a 21,5% para vender no Brasil.

A principal fabricante de PVC do País é a Braskem, controlada por Odebrecht e Petrobrás. Conforme a assessoria de imprensa da Braskem, a crise provocou um excedente de 4 milhões de toneladas de produção de PVC nos EUA - quatro vezes mais do que o consumo brasileiro. Segundo a empresa, a tonelada de PVC é vendida por US$ 1,2 mil nos Estados Unidos, mas exportada por esse país a US$ 850.

De acordo com José Ricardo Roriz Coelho, presidente da Associação Brasileira da Indústria do Plástico (Abiplast), os três principais insumos do setor (PVC, polipropileno e polietileno) estão sujeitos a medidas de defesa comercial. "Nossos concorrentes no exterior compram insumos 40% mais baratos. Isso está matando as empresas da cadeia", diz Roriz, referindo-se a fabricantes de frascos, cosméticos, embalagens e autopeças.

Para Denise Naranjo, diretora de comércio exterior da Associação Brasileira da Indústria Química (Abiquim), as medidas antidumping são legítimas, porque corrigem uma "anomalia". "Sem isso, inviabiliza a produção local." Denise ressaltou ainda que as investigações seguem as normas da Organização Mundial de Comércio (OMC).

O antidumping, que protege contra a exportação abaixo do preço praticado no país de origem, é o instrumento de defesa comercial mais usado pelo Brasil. Segundo Leani Nadim, professora da PUC, é importante utilizar a defesa comercial para combater práticas desleais, mas faltam critérios para evitar que prejudique a competitividade do País. Ela explica que basta provar o preço abaixo do normal e o dano à indústria doméstica para conseguir o antidumping. As regras não consideram se a beneficiada é monopolista e permitem que as medidas sejam prolongadas indefinidamente, sem avaliar o impacto nos preços.

Desde o início do governo Dilma, o Brasil se tornou um dos países mais ativos do mundo na aplicação de medidas antidumping. Conforme o último relatório da Organização Mundial do Comércio (OMC), o País iniciou 27 das 77 investigações abertas pelos países do G-20 entre maio e setembro do ano passado.



Veículo: O Estado de S.Paulo


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