Desonerações tributárias, reajustes menores de ônibus urbano e a mudança de metodologia de cálculo da inflação oficial foram três importantes ajudas ao Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) no ano passado, mas a forte subida dos alimentos observada a partir do segundo semestre anulou boa parte desse alívio e o indicador encerrou 2012 com aumento de 5,84%, ainda distante de 4,5%, centro da meta perseguida desde 2005 pelo Banco Central, mas um pouco abaixo da alta de 6,5% de 2011.
O choque de commodities após as quebras de safra de milho e soja nos Estados Unidos foi decisivo para a alta expressiva de 9,8% do grupo alimentação e bebidas no ano, mas economistas afirmam que, mesmo se os alimentos tivessem mostrado trajetória mais próxima do padrão, a inflação teria ficado em 2012 pelo terceiro ano seguido acima do alvo central. A resistência dos preços de serviços, que pouco reagiram à perda de fôlego da atividade e subiram 8,7% no ano passado, seria o principal entrave.
Em nota, o presidente do Banco Central, Alexandre Tombini, afirmou que apesar de a inflação mostrar "resistência" no curto prazo, as perspectivas indicam "retomada da tendência declinante" ao longo deste ano. O presidente do BC lembrou que, pelo nono ano consecutivo, a inflação encerrou o ano dentro da meta estipulada pelo Conselho Monetário Nacional (CMN).
Ele afirmou que houve um recuo em relação à inflação de 2011, e ponderou que os principais focos de pressão no ano passado foram "choques desfavoráveis no segmento de commodities agrícolas", a partir do segundo semestre. Apesar do recuo ressaltado pelo BC, nas contas do economista Alexandre Schwartsman, se o IPCA de 2012 fosse calculado pela mesma ponderação do ano anterior, ele teria ficado em 6,54%, acima da inflação de 2011 e do teto da meta perseguida pela autoridade monetária. A nova ponderação reduziu o peso dos serviços e, com isso, resultou em um índice menor.
Entre novembro e dezembro, período em que o IPCA avançou de 0,60% para 0,79% - maior alta para meses de dezembro desde 2004 - os serviços se aceleraram de 0,82% para 0,98%, acima do esperado por Thiago Carlos, da Link Investimentos. Em sua opinião, a rigidez desses preços ainda será a principal fonte de pressão inflacionária este ano, mesmo com uma correção menor do salário mínimo, de 9%, frente os 14% concedidos no início de 2012.
Segundo Carlos, é normal que os preços de serviços relacionados a recreação e lazer fiquem mais pressionados no fim do ano, como passagem aérea e excursão (ambos com alta de 17,1%), mas preocupa o fato da alta ter superado o padrão sazonal. "É um cenário um pouco ruim, que traz certo desconforto", diz. "O mercado de trabalho muito aquecido e a indexação do salário mínimo dificultam que os serviços cedam em 2013."
Para Flávio Serrano, economista-chefe do BES Investimento, o choque de grãos não pode ser usado pelo BC como justificativa para a inflação acima do centro. Serrano lembra que, antes de ser considerada "vilã", a inflação de alimentos teve comportamento bastante atípico nos primeiros três meses e ajudou o IPCA, o que dificilmente continuaria ocorrendo ao longo de todo ano e, portanto, era de se esperar uma alta da parte de alimentação acima da inflação cheia ao fim de 2012. "Mesmo sem o choque, a inflação teria ficado acima de 5% no ano", afirmou.
Além do grupo alimentação e bebidas, que subiu 1,03% em dezembro e foi a principal influência sobre a inflação do mês, o economista do BES avalia que há um movimento disseminado de repasses de preços, já que, excluindo-se alimentos, o índice de difusão passou de 65% para 68,9% entre novembro e dezembro. Essa medida é o percentual de itens do IPCA que aumentaram entre um mês e outro.
Tatiana Pinheiro, do Santander, observa que a difusão média ao longo de 2012 sem os alimentos ficou em 63%, apenas um ponto abaixo do "índice cheio", de 64%. "A alimentação influenciou a inflação porque tem peso de 23% no IPCA, mas o fato é que ao longo do ano como um todo houve um movimento generalizado de aumento de preços", o que Tatiana credita ao mercado de trabalho apertado, à forte alta do salário mínimo e à depreciação cambial, entre outros fatores. "É uma série de pontos. Não temos só um vilão", avalia.
Na visão de Serrano, o sistema de metas de inflação segue vigente, mas há uma avaliação errada do BC na condução da política monetária, que continua expansionista, apesar da necessidade de combater os repasses em serviços. "A inflação deve até desacelerar, porque a parte de alimentos vai ceder, mas a parte estrutural dificilmente irá melhorar. Claramente vamos viver um período em que a inflação ficará sistematicamente acima de 4,5%."
Pressionado por reajustes de combustíveis, ônibus urbano e serviços, o IPCA ficará acima de 6% em boa parte de 2013 no acumulado em 12 meses, segundo Fabio Romão, da LCA Consultores. Para ele, no entanto, o índice deve desacelerar para 5,3% no último trimestre do ano. A grande ajuda no período, diz, virá dos alimentos, com a saída das taxas altas registradas entre julho e outubro.
Já Tatiana, do Santander, trabalha com alta de 6% da inflação oficial este ano, porque conta com comportamento não tão favorável dos alimentos. Quebras de safra não estão em seu cenário, mas a economista afirma que o segundo semestre sem chuvas atrapalha a produção e não há expectativa de colheitas recorde em 2013. Além disso, ela espera fôlego maior dos serviços, como reflexo da retomada projetada para a atividade.
O Banco Central (BC) discorda da análise de grande parte dos analistas e não vê problemas em comemorar o fato de a inflação oficial acumulada em 2012 ter fechado o ano em 5,84%, dentro, portanto do intervalo fixado pelo Conselho Monetário Nacional.
Mais do que ter que não ter deixado a inflação estourar o teto permitido por lei, o Valor apurou que o BC está satisfeito com o resultado da inflação em 2012 porque acredita numa tendência declinante na comparação com outros anos.
A redução no ritmo de aceleração dos preços da energia elétrica residencial e a performance do grupo transportes foram os principais fatores de contenção da inflação no ano passado, segundo Eulina Nunes dos Santos, coordenadora de índices de preços do IBGE. Dentro do IPCA, os preços da energia residencial desaceleraram, passando de alta de 3,97% em 2011 para avanço de 2,93% em 2012. Já o grupo transportes, após encerrar 2011 com avanço de 6,05%, subiu apenas 0,48% em 2012.
Veículo: Valor Econômico