Resistência da inadimplência em cair e alto comprometimento da renda com dívidas devem afetar concessão
A expectativa dos grandes bancos brasileiros de que a inadimplência cairia ao longo do ano passado não se confirmou e deve afetar a concessão de crédito em 2013. As instituições só vão se pronunciar oficialmente sobre as projeções para empréstimos neste ano durante a divulgação dos balanços de 2012, que começa hoje com o Bradesco. Mas analistas acreditam em um crescimento modesto.
A Tendências Consultoria Integrada projeta uma alta real (descontada a inflação) de 9,7% do estoque de crédito neste ano, semelhante à de 2012, que ficou na casa dos 10%. A LCA Consultores espera uma expansão total do estoque (sem desconto da inflação) de 16,7% em 2013, ante 16,2% no ano passado. O analista de instituições financeiras da Austin Rating, Luís Miguel Santacreu, não arrisca um número, mas acredita em um desempenho semelhante ao de 2012.
"Há um espaço bem menor para expansão do crédito do que nos últimos anos", afirmou Mariana Oliveira, analista da Tendências. "Não conseguiremos mais repetir o crescimento astronômico dos anos recentes", corrobora o economista-chefe da LCA, Bráulio Borges.
Em grande medida, o freio ao que os dois se referem está relacionado ao comprometimento da renda das famílias com dívidas, que atingiu em 2012 níveis elevados para os padrões de um país com as características do Brasil. Em outubro, dado mais recente disponível, o indicador estava em 21,5%, após bater o recorde de 23% nos meses anteriores.
O peso das dívidas no orçamento, por sua vez, é fruto da aceleração do crédito nos últimos anos. A relação entre o total de empréstimos e o Produto Interno Bruto (PIB) saiu de 23% no início de 2003 para o recorde de 53,3% em dezembro.
O ano passado foi marcado por uma intensa - e inédita - pressão do governo para que os bancos reduzissem os juros e os spreads (diferença entre as taxas de juros que os bancos pagam na captação do dinheiro e as que cobram dos clientes). As autoridades da área econômica, sob o comando da presidente Dilma Rousseff, queriam mais crédito para estimular o PIB.
Cautela. No entanto, esbarraram na cautela dos bancos privados, respaldada por índices de inadimplência persistentemente altos. Para se ter uma ideia, a inadimplência das pessoas físicas encerrou 2012 no nível mais alto do ano: 7,9%. Entre as empresas, o indicador ficou estável o ano inteiro, variando entre 4% e 4,1%.
A resistência da inadimplência em cair surpreendeu, porque a renda média dos brasileiros continuou crescendo e a taxa de desemprego encerrou 2012 no menor nível da história do País. Os bancos privados, portanto, não deslancharam o crédito. Não houve, como em 2008 e 2009, uma trava nas concessões, mas os critérios para empréstimos ficaram mais apertados.
Os bancos públicos, ao contrário, mantiveram um ritmo de expansão do crédito expressivo. Tanto que encerraram 2012 com a maior participação no mercado em 12 anos: 47,6%. Esse desempenho, aliás, tem provocado críticas por parte de analistas privados, que temem que a inadimplência cresça ainda mais nos próximos anos, o que, no limite, poderia obrigar o Tesouro Nacional a socorrer as instituições.
Para 2013, a expectativa é de um desempenho mais forte nas concessões para empresas do que para pessoas físicas. "Espera-se um aumento dos investimentos no País, que, em 2012, foram muito fracos. Naturalmente, esse movimento provoca uma demanda por crédito por parte das corporações", explicou Santacreu, da Austin Rating.
Nas pessoas físicas, as projeções apontam para um crescimento mais forte do crédito imobiliário - que vem sendo destaque nos últimos anos. Em 2012, por exemplo, essa linha apresentou expansão de 38,2%. "Mas acreditamos que essa modalidade também tende a desacelerar o crescimento nos próximos anos", observou Borges, da LCA.
A consultoria fez um estudo especial para tentar estimar até que ponto esse segmento continuará crescendo fortemente no País. A conclusão é de que a relação entre empréstimos imobiliários e o PIB deve se estabilizar - considerando as condições atuais da economia brasileira - na faixa dos 10%. Essa fatia deve ser alcançada em 2020, segundo o estudo. Em 2012, a relação ficou em 6,3%. "Crescimentos adicionais dessa relação dependem do aumento da renda média do brasileiro", explicou Borges.
A propósito da renda no País, Mariana, da Tendências, chama a atenção para um risco ao mercado de crédito este ano: um aumento da inflação que acabe corroendo grande parte do aumento esperado para os rendimentos das famílias. A estimativa da Tendências é de que a renda real (descontada a evolução dos preços) suba 5%. Para o IPCA, índice oficial de inflação, a previsão é de alta de 5,8%.
Veículo: O Estado de S.Paulo