Dólar alto alivia os agricultores, mas não garante festa no campo

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Desvalorização cambial compensa a queda nos preços, mas pressiona o valor de insumos

Receita agrícola bruta deve ter alta de 3% acima da inflação em 2013, bem menor que expansão vivida em 2012

A alta do dólar vai beneficiar o produtor rural neste ano, mas não será suficiente para garantir os altos lucros da safra passada, quando os preços das commodities dispararam sob a influência da maior seca já vista nos EUA.

Em 2014, a desvalorização cambial, caso seja mantida, não deve evitar uma queda na rentabilidade do campo.

A retração nos preços dos grãos observada nos últimos 12 meses --e que pode se intensificar nos próximos-- deve limitar os ganhos dos agricultores no próximo ano.

A receita agrícola bruta deve atingir R$ 266,3 bilhões em 2013, segundo estimativa feita pela GO Associados a pedido da Folha. A projeção considera um dólar médio de R$ 2,19 para o ano e de R$ 2,40 ao fim de dezembro.

A projeção indica um crescimento nominal de 9% em relação a 2012, mas a inflação "comerá" parte dos ganhos. Em termos reais, o avanço ficaria próximo de 3%.

"Haverá ganho real no campo, mas num ritmo menor do que nos anos anteriores", afirma Fabio Silveira, diretor de pesquisa econômica da GO Associados.

O impacto do "novo dólar" é limitado porque a maior parte dessa renda já está no bolso do produtor. Quase toda a safra de soja, cultura mais representativa para a receita total, já foi vendida.

Para a próxima safra, que está às vésperas do plantio, o ganho deve ser menor. Segundo Silveira, a receita agrícola somará R$ 270,6 bilhões em 2014, um aumento de apenas 2% em relação a 2013. Descontada a inflação, a receita cairá entre 3% e 4%.

"Haverá uma perda de rentabilidade. O câmbio não compensará o aumento de custos e a queda nos preços", diz Silveira, que estima uma taxa de câmbio média de R$ 2,44 para o próximo ano.

Já André Pessôa, sócio da Agroconsult, acredita em uma equação positiva para o setor, embora também não espere os altos lucros da safra passada. "O resultado entre aumento de custos, queda nos preços e desvalorização do câmbio deve ser favorável para o produtor", diz.

IMPACTOS

Além dos gargalos logísticos, que vêm provocando aumento dos custos com frete, a alta do dólar também afeta os gastos do produtor.

O primeiro impacto é a alta dos insumos, como fertilizantes, cuja maioria é importada e cotada em dólar.

Mas, dessa vez, isso não será problema. Como a compra de insumos para a próxima safra foi antecipada para evitar mais filas nos portos, a maioria dos agricultores fechou essa operação antes da explosão do dólar.

Haverá, porém, efeitos indiretos, como a esperada alta do diesel --importante componente dos custos.

Com a queda esperada para os preços agrícolas, causada pela provável recomposição dos estoques mundiais de grãos, a redução dos lucros será inevitável.

Sem contar os efeitos que a queda do real causa nas cotações de produtos comercialmente dominados pelo Brasil, como café e açúcar. "O importador se aproveita da situação e derruba os preços em dólares", diz Pessôa.

Thiago Campaz, da consultoria FG/Agro, lembra que muitas usinas têm dívidas em dólar e devem gastar mais para honrar os compromissos, anulando ganhos com a alta.



Estudo aponta bônus em exportação de produto agrícola



A perspectiva para o agronegócio exportador do Brasil é favorável para além da atual paulada no real, tomando o horizonte de 2013 a 2022. A avaliação é de observadores neutros e assume os Estados Unidos como referência.

Estudo recente da FAO (Organização das Nações Unidas para a Agricultura e a Alimentação) e da OCDE (Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico) teve como premissa a recuperação dos EUA e seus reflexos no mundo, incluindo países emergentes, como o Brasil.

Sinais da retomada nos EUA não faltam --desemprego em ligeira queda e preço de imóveis em alta. Com ela, está com os dias contados a política de inundar a economia com recursos baratos.

Uma hora não só as taxas dos títulos de longo prazo do Tesouro, mas até os juros básicos, hoje entre zero e 0,25%, vão subir. Quem "fugiu" dos EUA voltará, deixando o mercado brasileiro, por exemplo, e tirando força do real.

Com relação a Brasil, Índia e África do Sul, que registram alta do custo de vida superior à dos EUA, existe o agravante que os especialistas chamam de "diferenciais de inflação". Em relação ao dólar, ele é capaz de desvalorizar as moedas desses países em mais de 30% em dez anos, estimam a FAO e a OCDE.

Com desvalorização cambial dessa ordem, uma quantia de dólares, antes suficiente para adquirir uma produção agrícola Y, passa a comprar 1,3 Y. No disputado comércio internacional, é uma bênção de competitividade.

Nesse quadro, FAO e OCDE apontam o Brasil como um "competidor ainda mais formidável", com papel de destaque em soja, açúcar, etanol, carne bovina e aves.



Veículo: Folha de S. Paulo


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