BC projeta IPCA mais alto e indica que juros podem subir mais

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O Banco Central reviu para cima as suas projeções para a variação do Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) neste e nos próximos anos, que estão ainda em um patamar desconfortável para cumprir as metas para a alta de preços, mostra o relatório trimestral de inflação de setembro, divulgado ontem.

O diretor de política monetária da instituição, Carlos Hamilton Araújo, disse que "ainda há bastante trabalho a ser feito pela política monetária em termos de combate à inflação". As projeções contidas no relatório e as declarações do dirigente do BC aumentam as chances de que o atual ciclo de aperto monetário vá além da alta dos atuais 9% ao ano para 9,75% ao ano projetada pelo mercado, o que faria a taxa básica voltar aos dois dígitos.

O relatório projeta um crescimento do Produto Interno Bruto (PIB) de 2,5% em 2013 e também de 2,5% no período de um ano encerrado em junho de 2014. A projeção foi feita com base no chamado cenário de referência, que pressupõe os juros básicos estáveis no patamar atual, de 9% ao ano, e a taxa de câmbio em R$ 2,35. Se os juros subirem mais para combater a inflação, como é amplamente esperado pelo mercado, é possível que o crescimento do PIB fique menor que isso.

O relatório de inflação, com 118 páginas, representa o mais completo diagnóstico do BC para alta de preços na economia nos próximos 24 meses, e um meio de sinalização das futuras decisões de política monetária.

A projeção para a inflação do relatório no cenário de referência é de 5,8% em 2013, de 5,7% em 2014 e de 5,5% no período de 12 meses encerrado em setembro de 2015. Os percentuais superam o centro da meta oficial de inflação fixada pelo governo, de 4,5%, para todos os anos do período.

Também representa uma margem estreita em relação aos objetivos informais indicados pelo presidente do Banco Central, Alexandre Tombini. Segundo ele, o BC age para entregar em 2013 uma inflação menor do que os 5,84% observados em 2012. Para 2014, o objetivo é a continuidade da queda da inflação. Não há um alvo informal definido para 2015, mas, em depoimento recente no Senado, Tombini disse que o BC não abandonou o objetivo de cumprir a meta de 4,5%.

Numa outra projeção divulgada no relatório, que leva em conta as altas de juros e a taxa de câmbio esperadas pelo mercado nos próximos dois anos, a inflação também está acima das metas formais e informais. Na data de corte dos dados usados no relatório - 6 de setembro - o mercado previa mais duas altas de juros, uma de 0,5 ponto percentual na semana que vem e outra de 0,25 ponto percentual em novembro, que elevariam a Selic de 9% ao ano para 9,75% ao ano. De lá para cá, não houve grandes mudanças nessas projeções.

Esse exercício, conhecido como cenário de mercado, aponta uma inflação de 5,8% neste ano, de 5,7% em 2014 e de 5,4% no período de 12 meses encerrado em setembro de 2015. A projeção para 2014, em particular, aumentou 0,5 ponto percentual em relação ao valor apresentado no relatório de inflação de junho, que apontava 5,2%. A leitura mais imediata é que o aumento de juros projetado pelo mercado até então seria insuficiente para cumprir as metas de inflação.

"As projeções indicam um recuo lento da inflação", disse Carlos Hamilton. "Mesmo no cenário de mercado, com os juros indo a 9,75% ao ano, a projeção aponta uma inflação elevada." Segundo ele, a sinalização do Comitê de Política Monetária (Copom) do BC não mudou. " Vamos ver o que o Copom vai decidir nas próximas reuniões. A inflação está alta e desconfortável. Essa é uma situação que pode evoluir para melhor, a depender das ações que forem sendo tomadas ao longo do tempo."

Carlos Hamilton é considerado um dos membros mais conservadores do Copom, e participantes do mercado costumam questionar se ele fala pelo colegiado como um todo. "O relatório de inflação é o resultado do esforço de todos os membros votantes do Copom", esclareceu.

O Banco Central eliminou a referência explícita a alguns riscos apontados na edição anterior do relatório, de junho. Um deles é a avaliação de que "a dinâmica conjunta dos mercados de fatores - sob a perspectiva do hiato do produto - posiciona-se no campo inflacionário no curto prazo". Ou seja, até junho o BC falava explicitamente que a demanda caminhava acima da capacidade de oferta da economia, pressionando a inflação.

No documento, o BC também passou a ver de forma mais benigna a evolução do mercado de trabalho. A exemplo de edições anteriores, reafirma que a dinâmica salarial ainda permanece originando pressões inflacionárias de custos. Mas ponderou: "No horizonte relevante para a política monetária, antecipam-se desenvolvimentos que tendem a contribuir para o arrefecimento de riscos originados no mercado de trabalho, como o reajuste do salário mínimo projetado para os próximos anos, que será marcadamente menor do que o concedido em 2012."

O Copom também incorporou no relatório de inflação, a exemplo do que havia sinalizado na ata de sua reunião de agosto, uma política fiscal menos desfavorável, que deixa o campo expansionista e possivelmente caminha para o campo neutro.

Carlos Hamilton foi questionado se o balanço de riscos para a inflação teria melhorado entre as edições do relatório de inflação de junho e setembro. "A dinâmica aponta inflação elevada. Acredito que ainda há riscos para a inflação", afirmou.

O diretor do BC ponderou que, embora os reajustes salariais tenham se tornado menores, eles ainda são bem maiores do que os ganhos de produtividade. Durante sua apresentação, Carlos Hamilton expressou preocupação com o fato de os salários nominais terem sido reajustados em 7,1% em agosto. Segundo ele, nos meses de agosto costuma-se verificar os reajustes mais baixos entre todos os meses do ano. Em setembro, a história mostra que costuma haver aceleração, pois entra no pico a campanha salarial de categorias com maior poder de mobilização e barganha. Algumas delas, notou, fazem greve neste momento.

Ele também citou dois outros fatores de riscos: o repasse da desvalorização cambial para os índices de preços e a evolução dos preços administrados. Sobre o repasse cambial para os preços, o relatório afirma que a desvalorização do real se "constitui fonte de pressão inflacionária em prazos mais curtos, que, de resto, já se manifesta em indicadores de preços do mercado atacadista".

No que diz respeito aos preços administrados, o relatório expressa preocupação em particular com as expectativas inflacionárias. "O Copom entende que uma fonte relevante de risco para a inflação reside no comportamento das expectativas de inflação, impactadas negativamente nos últimos meses pelo nível da inflação corrente, pela dispersão de aumentos de preços e por incertezas que cercam a trajetória de preços com grande visibilidade, como o da gasolina e o de transportes urbanos", diz o documento. Ao lado do câmbio, a piora das expectativas foi um dos fatores que levaram à alta nas projeções de inflação do BC para 2014.

O Banco Central indicou que há algum espaço nas projeções de inflação para acomodar pelo menos parte de um eventual aumento da gasolina ainda neste ano. O cenário incorporado nos modelos de previsão de inflação do Copom contempla um aumento de 5% no preço da gasolina em 2013, explicou Carlos Hamilton, e no acumulado no ano até agosto houve um incremento de "apenas" 2,15%.

Analistas do mercado têm afirmado que, depois de o governo segurar aumentos de preços como energia elétrica, transportes urbanos e combustíveis, há o risco de a descompressão dessas tarifas elevar o índice cheio de inflação.

"O mercado espera que a inflação de administrados seja maior do que esses 1,3% observados até agora", disse Carlos Hamilton. "Acho razoável. Mas é razoável também que os demais preços diminuam na medida em que a política monetária comece a fazer seus efeitos sobre eles."



Veículo: Valor Econômico


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