Após cinco anos de reajustes abaixo da inflação, os preços administrados devem se converter, em 2015, na principal fonte de pressão sobre o Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA). Economistas consultados pelo Valor afirmam que os robustos aumentos esperados em energia, combustíveis e tarifas de transporte público prometem fazer com que os administrados - aqueles preços que têm interferência do governo - subam mais do que os preços livres no próximo ano. E para alguns economistas, a pressão pode ir além do próximo ano.
O boletim Focus, divulgado ontem pelo Banco Central (BC), mostra que a expectativa é de elevação de 6,5% em administrados em 2015, acima da alta de 6% projetada para o IPCA no período. Caso esse quadro se confirme, será o primeiro ano desde 2009 em que o reajuste de administrados superará a inflação do período. Para este ano, as projeções indicam elevação de 5% em administrados, ainda abaixo da alta de 6,5% prevista para o IPCA.
Em apenas um mês, os economistas ouvidos pelo BC para o relatório semanal elevaram suas estimativas de reajustes em preços administrados em 0,55 ponto percentual para este ano e em um ponto percentual no próximo. Quatro semanas atrás, as altas projetadas eram de 4,45% em 2014 e de 5,50% em 2015.
Para a economista Adriana Molinari, da Tendências Consultoria, o mercado está alinhando expectativas principalmente aos preços de energia, que estavam represados. Os aumentos autorizados nas tarifas das concessionárias em 2014, destaca ela, foram além do esperado. Pelos seus cálculos, o reajuste médio até o momento foi de 15%, quando o aguardado era algo em torno de 10%. Por conta disso, a Tendências estuda elevar sua projeção para o IPCA deste ano, atualmente em 6,3%. A previsão de alta de 4,74% em administrados em 2014 ainda não inclui os reflexos do leilão de energia elétrica realizado na semana passada sobre as contas de luz.
Para 2015, a consultoria projeta elevação de 7,44% nos preços administrados e de 6,3% no IPCA. "O ajuste em administrados deve começar em 2015 e se estender pelos próximos anos, mantendo o IPCA em torno de 6% ao menos até 2018", diz Adriana. "Há locais em que as tarifas de ônibus não sobem há quatro anos."
Já Roberto Padovani, economista-chefe da Votorantim Corretora, acredita que, passado o ajuste a ser feito em 2015, os administrados voltarão a subir abaixo do IPCA. Isso porque, historicamente, os preços administrados sobem menos que a inflação. "Como tivemos um quadro atípico de falta de reajustes em 2013 e, em 2014, as eleições inibem aumentos, haverá uma concentração em 2015", diz Padovani, que projeta alta de 6,4% em administrados e de 6% no IPCA no próximo ano.
Os cálculos de Padovani apontam elevação de 11% nas contas de luz, de 7% na gasolina e outros 7% de aumento nas tarifas de transporte público em 2015. "À medida que o clima melhore, é de se esperar uma desaceleração nos reajustes de energia", comenta Padovani. Para o economista, a partir de 2016, é possível que a inflação volte a perder fôlego e se aproxime do centro da meta, de 4,5%, mas não por conta de administrados. "O que dita a inflação no Brasil é o comportamento dos serviços", argumenta. Com o mercado de trabalho em desaquecimento, sua expectativa é de menor pressão sobre esses preços.
Por ora, entretanto, Padovani entende que as projeções de inflação alta têm reflexos sobre as perspectivas de expansão da economia brasileira, já que corroem a confiança dos empresários e afetam as decisões de investimento. No Focus, a previsão de crescimento do Produto Interno Bruto (PIB) baixou de 1,65% para 1,63% em 2014 e de 2% para 1,91% em 2015.
Um fator que deve influenciar tanto o PIB quanto a inflação nos próximos meses, enfatiza Adriana, é o juro. Um novo ciclo de arrocho monetário deve começar em março de 2015, pelas suas previsões, permitindo uma desaceleração nos preços livres, e desestimulando o crescimento econômico.
Após 11 semanas prevendo que a taxa Selic chegaria ao fim de 2015 em 12% ao ano, os economistas do Focus elevaram suas projeções a 12,25%. Para 2014, as estimativas permaneceram em 11,25. Em relatório enviado a clientes, o BNP Paribas diz esperar mais revisões nos juros nas próximas semanas. "Nosso panorama de longo prazo mostra que os juros precisam subir ao menos a 13% no próximo ano, e a economia lutará para conseguir crescer 1%", afirma o documento do BC.
Veículo: Valor Econômico