Dores do crescimento. A chamada 'síndrome de Peter Pan' ainda reina entre os empresários do comércio e impede que o setor consiga retomar seus negócios, segundo especialistas ouvidos
São Paulo - O projeto de lei que altera o limite do enquadramento do Supersimples, aprovado na semana passada no Senado, trará benefícios para o micro e pequeno empreendedor do varejo, mas não deve ser suficiente para sanar um dos principais pontos críticos ao regime tributário: a falta de estímulo ao crescimento.
Criado em 2006, o programa tem como objetivo diminuir o valor dos impostos, e reduzir a burocracia para o pagamento das contribuições das micro e pequenas empresas pela unificação de todos os tributos (federais, estaduais e municipais) em uma única alíquota.
A principal mudança prevista pela PLC 125/2015, que agora deve voltar para nova apreciação na Câmara, é o aumento do limite para o enquadramento das empresas, que deve passar de R$ 3,6 milhões para R$ 4,8 milhões de receita bruta anual.
Além disso, o projeto de lei faz um esforço no sentido de tornar menos traumática a transição das empresas que ultrapassarem esse teto, e que têm que sair do regime, aproximando a alíquota da última faixa do programa à do Lucro Presumido.
Apesar disso, especialistas acreditam que a mudança não deve ser suficiente para estimular o crescimento das varejistas "Ainda falta conseguir lidar com as empresas que querem crescer, mas que são desestimuladas pelo impacto muito grande de sair desse regime tributário. A chamada 'síndrome do Peter Pan'", afirma o professor de economia da Fundação Armando Alvares Penteado (Faap), João Ricardo Costa Filho.
O advogado tributarista e sócio do escritório Vaz, Barreto, Shingaki e Oioli, Diego Aubin Miguita, concorda. "O regime ainda é pensado para uma empresa que não vai crescer tanto. De forma não intencional, acaba sendo um incentivo para que se criem estruturas paralelas".
O advogado se refere à criação de outras empresas, no nome de algum parente ou sócio, para conseguir 'driblar' essa barreira do teto do programa. Costa Filho explica: "O que muitas companhias fazem é criar um outro CNPJ, para conseguir crescer e ainda assim continuar se enquadrando no Simples. Hoje em dia, tem um monte de empresas abertas que compõem a mesma companhia". Segundo Miguita, essa é uma prática ilegal.
Para sanar esse problema, o advogado pondera que uma das alternativas seria a criação de um sistema com alíquotas progressivas conforme a taxa de receita. "O Simples deveria ter uma faixa maior do que a aprovada, e seria importante que se estipulassem faixas progressivas, ou seja, a partir do momento em que uma empresa atingisse o teto do programa, ela continuaria fazendo parte do Simples, mas pagando uma alíquota maior", diz.
Para se ter uma ideia, o teto da tributação adotada pela maioria das empresas que não se enquadram no Simples Nacional, a do Lucro Presumido, é de R$ 78 milhões. "Por isso a importância da criação dessas faixas progressivas, para que não haja essa lacuna tão grande entre o limite do Supersimples e do Lucro Presumido", explica Miguita.
Para o presidente do Sebrae, Guilherme Afif, no entanto, o projeto já deve promover avanços, por exemplo: "a redução dos degraus que há hoje entre faixas de tributação e a transição mais suave para o regime do Lucro Presumido", disse. O texto inicial do projeto, relatado pela senadora Marta Suplicy (PMDB-SP), previa um teto de R$ 14,4 milhões - muito superior ao aprovado.
A visão do comerciante
Entidades do varejo ouvidas pelo DCI, no entanto, afirmam que o limite proposto no projeto inicial era mais justo e teria sido mais benéfico às micro e pequenas empresas do setor.
"O ajuste aprovado no Senado ficou abaixo da inflação acumulada desde a última revisão", afirma o advogado e presidente da Associação Brasileira do Comércio Farmacêutico (Abcfarma), Renato Tamarozzi.
O diretor da Associação Brasileira de Comércio Eletrônico (Abcomm), Jacob André Gomes, concorda e acrescenta que apesar de não ser o ideal o aumento é positivo. "Essa é uma demanda que já é pedida faz tempo pelo mercado", diz.
Além da elevação no teto do Supersimples, outra mudança prevista pelo projeto é o aumento do limite para o enquadramento do Microempreendedor Individual (MEI), dos atuais R$ 60 mil para R$ 81 mil.
Outro ponto da proposta é a ampliação do prazo para o pagamento de dívidas tributárias no âmbito do Simples, que agora podem ser parceladas em até 120 vezes. Para Afif, do Sebrae, esse é um aspecto muito importante. "No momento econômico atual, a ampliação do prazo para pagamento de dívidas pode ser o fôlego a mais que o empresário precisa para continuar com as portas aberta e regular."
Mesmo com as mudanças, Afif defende que o ideal seria "a criação de um grande Simples Nacional, uma reforma tributária para acomodar o empresário quando ultrapassar o limite".
Veículo: DCI