Em nota, BC destacou resiliência da inflação e incertezas em relação aos "ajustes necessários na economia"; para especialista, corte dos juros pode acontecer só no segundo trimestre de 2017
São Paulo - O Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central (BC) decidiu, ontem, pela manutenção da taxa de juros em 14,25% ao ano. As projeções mais conservadoras sobre o futuro da Selic já empurram o início dos cortes para o segundo trimestre de 2017.
Em comunicado enviado à imprensa, o BC indicou a inflação elevada, "em boa medida decorrente de preços de alimentos", como um dos motivos da escolha unânime pela oitava manutenção consecutiva da taxa de juros.
Também foram mencionadas "incertezas quanto à aprovação e implementação dos ajustes necessários na economia". A autoridade monetária brasileira destacou ainda que "um período prolongado com inflação alta e com expectativas acima da meta pode reforçar mecanismos inerciais e retardar o processo de desinflação".
Para Miguel de Oliveira, diretor executivo da Anefac, a decisão de ontem seguiu a linha apresentada no último relatório trimestral de inflação (RTI) do BC. "Eles já haviam indicado maior austeridade e colocado que o objetivo era trazer a inflação à meta [4,5%] no ano que vem. Como a inflação ainda está muito elevada [8,84%] era esperada a manutenção da taxa de juros".
Já Patrícia Krause, economista-chefe da Coface, ressaltou que as medidas de austeridade que dependem do Legislativo "não devem avançar tão cedo", podendo ser aprovadas só depois das eleições municipais. Assim, o Copom deve aguardar mais para reduzir os juros.
Cortes
Para a especialista entrevistada pelo DCI, os cortes na Selic podem começar só em meados do ano que vem.
"No RTI foi mostrado um tom de maior austeridade pelo BC, que falou em chegar à meta de inflação já no próximo ano. Por isso, nenhuma redução na taxa deve acontecer neste ano", ressaltou Patrícia. "Os cortes devem ficar para o segundo trimestre de 2017."
Já Oliveira disse acreditar que as alterações devem acontecer mais cedo, no final deste ano. "No último trimestre de 2016, possivelmente nas duas últimas reuniões [do Copom] a Selic deve ser reduzida."
Projeção semelhante foi feita por Luiz Alberto Machado, vice-diretor da faculdade de economia da Fundação Armando Alvares Penteado (FAAP). "O começo do ciclo de baixa deve ser visto em setembro ou outubro", aponta.
A projeção da maior parte do mercado financeiro também é de queda da Selic ainda neste ano. No último relatório Focus, os analistas indicaram que a taxa deve encerrar 2016 em 13,25% ao ano e chegar a 11% ao ano até o final de 2017.
Já a projeção para o IPCA aponta que a inflação oficial ficará longe da meta do governo. Os rascunhos assinalam aumento de preços em 7,26%, neste ano, e de 5,30% no acumulado do ano que vem.
Comunicado
Também no documento divulgado ontem pelo BC, o colegiado do Copom indicou que o cenário externo "permanece desafiador". Depois de colocar que o ambiente atual é "benigno" para as economias emergentes, os diretores do banco afirmaram que "a dinâmica da recuperação da economia global permanece frágil" e que há "incertezas quanto ao seu crescimento".
Após elencar os motivos que levaram à escolha pela manutenção da Selic, o Copom mostrou também duas razões para otimismo quanto ao futuro da inflação no País.
"Os ajustes na economia podem ser implementados de forma mais célere, permitindo ganhos de confiança e reduzindo as expectativas de inflação", escreveram os diretores. Eles também ressaltaram que a ociosidade na economia "pode produzir desinflação mais rápida do que a refletida nas projeções do Copom". No comunicado, o BC repetiu que a projeção para a alta dos preços em 2017 "encontra-se em torno da meta de 4,5%".
A reunião que marcou a estreia de Ilan Goldfajn, presidente do BC, no Copom, foi também a primeira em que um documento extenso justificou a decisão do comitê. "É algo positivo. Uma nota mais longa dá menos espaço para especulações do mercado", avaliou Virene Matesco, professora de economia da Fundação Getulio Vargas (FGV).
Autonomia
No começo da tarde de ontem, o ministro-chefe da Casa Civil, Eliseu Padilha disse que o presidente interino Michel Temer "vê com bons olhos" uma redução nos juros. Depois de afirmar que os economistas estão apostando numa queda de juros neste ano, o ministro emendou: "também isso agrada o presidente e ele vê com bons olhos, mas teremos que respeitar a autonomia do Banco Central".
Após a declaração de Padilha, Temer afirmou que o "BC tem plena autonomia para definir a taxa de juros". Por meio de sua assessoria, ele disse que "a política monetária tem como prioridade combater a inflação" e que este é o "objetivo principal" de seu governo.
Veículo: DCI