A perda de arrecadação tributária já reflete nas contas do governo. Em fevereiro, o resultado primário do governo central, composto pelo Tesouro Nacional, Banco Central e Previdência Social, registrou déficit de R$ 926,2 milhões. É o primeiro resultado negativo para o mês de fevereiro, desde o início da série histórica em 1997, impactado pelos efeitos da crise financeira mundial e pelas medidas adotadas pelo Tesouro Nacional de elevação dos gastos públicos.
O resultado de fevereiro reverteu o superávit de R$ 3,975 bilhões apurado em janeiro deste ano e de R$ 5,217 bilhões obtido em igual mês de 2008. Ainda assim, o número melhorou em relação às cifras apuradas entre novembro (R$ 4,421 bilhões) e dezembro (R$ 20,02 bilhões), meses subsequentes ao agravamento da crise financeira. Houve superávit em janeiro em razão da sazonalidade de dezembro, que permite aumento de vendas e eleva a arrecadação de tributos no mês seguinte.
Apesar do resultado negativo, o secretário do Tesouro Nacional, Arno Augustin, demonstrou otimismo em relação ao cumprimento das metas para este ano. A meta consolidada do superávit primário do setor público é 3,8% do Produto Interno Bruto (PIB), sendo 2,15% para o governo central. "Acreditamos que o Brasil vencerá essa crise; e os sinais de retomada já estão aparecendo", disse Augustin.
Amir Khair, ex-secretário de finanças da prefeitura de São Paulo, concorda: "O governo disparou um pacote de incentivos (fiscais) que demanda maturação e as medidas do governo devem começar a apresentar resultado na economia a partir do segundo semestre", estima.
Além do aumento do gasto público, Augustin lembrou que o governo conta este ano com outros dois instrumentos para estimular o mercado interno. São os recursos do Fundo Soberano do Brasil (FSB) e do Projeto Piloto de Investimento (PPI), cujos recursos podem ser abatidos da meta do superávit primário. Khair avalia, porém, que o governo terá que reduzir a meta do superávit em 1 ponto percentual para 2,8% para viabilizar os investimentos públicos na economia.
Refletindo a perda de dinamismo econômico que retrai a arrecadação tributária, o Tesouro Nacional informou ontem que a receita líquida do Governo Central caiu 3% entre fevereiro de 2008 e fevereiro deste ano, para R$ 37,41 bilhões. Em relação a janeiro deste ano, quando havia somado R$ 52,386 bilhões, a queda sobe para 28,5%. Tal cenário reflete a perda de receita do Tesouro Nacional, a principal fonte de recursos do governo, que atingiu R$ 35,4 bilhões. Um recuo 30,5% sobre janeiro último (R$ 50,9 bilhões) e 6,8% sobre fevereiro do ano passado. Ainda assim, a conta contribuiu com superávit de R$ 1,6 bilhão, enquanto que o buraco da Previdência Social foi de R$ 2,6 bilhões. O Banco Central, por sua vez, ficou superavitário em R$ 27,6 milhões.
Aumento de gastos
Embora tenha perdido receita em fevereiro, o Governo Central elevou em 14,2% as despesas, em relação a igual mês de 2008, para R$ 38,3 bilhões. Ou seja, aumentou os gastos em R$ 4,78 bilhões. Apenas as despesas de custeio e capital subiram de R$ 9,9 bilhões para R$ 11,1 bilhões, no período. Houve, porém, recuo de 20,8% se comparar com janeiro quando somaram R$ 48,4 bilhões.
Sazonalidade das receitas
Augustin tentou minimizar o impacto da crise nas contas públicas, mas admitiu que a perda de receita reflete o arrefecimento da economia. Em nota, o Tesouro Nacional disse que a redução do resultado primário do governo "está associado" ao comportamento sazonal de receitas tributárias apuradas em janeiro, as quais não se repetiram no mês seguinte. "Janeiro e fevereiro do ano passado foram meses com resultados muito positivos na receita pelo bom momento da economia", disse Augustin, emendando: "Infelizmente, o quadro da economia este ano é menos favorável do que o do ano passado e isso se reflete nas receitas".
Khair garante que o déficit de fevereiro não representa uma deterioração das contas fiscais nacionais ao longo deste ano; e avalia que a situação fiscal do País está "equilibrada". Khair disse, ainda, que a participação da dívida no Produto Interno Bruto (PIB) caiu fortemente no últimos anos e chegou a 36% do produto em 2008. Já, o resultado nominal - dívida após o pagamento do juro do endividamento público - está controlado, ao redor de 1,6% do PIB. Tal percentual, segundo estima Khair, deve se repetir em 2009, apesar do aumento dos gastos públicos na economia.
Amortecimento de juros
O economista comparou a situação brasileira com a de outras nações. E afirmou que, em países desenvolvidos, o resultado nominal cresceu para algo acima de 3% na atual conjuntura de crise internacional. Ele acredita que a queda da taxa Selic deva beneficiar as contas fiscais este ano e amortecer o pagamento do juro entre R$ 30 bilhões e R$ 40 bilhões em 2009.
Veículo: Gazeta Mercantil