Por quase 30 anos, os presidentes norte-americanos compareceram às reuniões de cúpula com discursos econômicos praticamente idênticos: a solução para a grande maioria dos problemas estaria em uma maior integração econômica, defesa do livre comércio e do uso de medidas leves para domar o capitalismo.
Quando o presidente Obama chegou em Londres na noite de anteontem para participar do encontro do G20 - grupo das principais economias desenvolvidas e emergentes do globo - , quase todos estes princípios vieram à tona.
A integração econômica está ameaçada. Alguns países têm procurado se manter isolados dos problemas financeiros globais, notando que aqueles menos imbricados na economia mundial têm sofrido menos. A França ameaçou abandonar o encontro caso os outros países não concordem em aprovar a criação de uma forte agência reguladora para o setor financeiro internacional.
Embora Obama tenha mostrado-se otimista ao acreditar que o resto do mundo seguiria seus passos aprovando grandes pacotes de estímulo, isto não aconteceu de fato. No fim de semana passado, a Casa Branca indicou que não entraria em confronto com outros membros do G20, particularmente a Alemanha, que se preocupa com o déficit do governo.
Tudo isto indica que a liderança econômica dos Estados Unidos será questionada. No entanto, o Obama deverá dominar as discussões aqui. E não há uma alternativa clara à estratégia que sendo adotada por sua administração para incentivar a economia mundial.
Muitas nações da Europa e da Ásia que dependem fortemente do mercado americano são favoráveis ao plano de estímulo de Obama, esperando que a recuperação dos EUA revigorará suas economias e diminuirá a pressão que sofrem para gastar mais.
"Este é o principal paradoxo", defendeu Jeffrey E. Garten, professor na Yale School of Management e ex-autoridade do Departamento de Comércio dos EUA no governo Clinton. "Todos perderam a confiança no sistema americano já que, conforme a crise é revelada, ficou cada vez mais patente que deixamos que o capitalismo seguisse uma direção inconsequente. Entretanto, todos agora esperam que os EUA os salvem."
Na realidade, o maior desafio de Obama será convencer os outros países durante a reunião de cúpula que o governo americano, embora esteja comprometido como a retomada da economia, não idealiza um retorno ao consumismo voraz nos EUA.
"A ironia", prosseguiu ele, "é que a maior parte de nossos parceiros, após nos acusar de irresponsáveis e gananciosos, querem voltar ao período no qual os consumidores americanos sustentavam o mundo, quando nós gastávamos de mais e poupávamos de menos." No entanto, nada disso foi dito explicitamente. Ninguém deseja assustar os mercados sugerindo uma atmosfera desarmônica, pelo menos durante as 36 horas do encontro do G20.
Dentro da União Europeia (UE), as nações mais ricas da Europa Ocidental não querem ter gastos altos para salvar financeiramente seus vizinhos mais pobres do leste - uma tarefa que querem deixar para o Fundo Monetário Internacional (FMI). O Secretário do Tesouro americano, Timothy F. Geithner, obrigou os Estados Unidos a aumentar a contribuição ao FMI em cerca de US$ 100 bilhões, ou um quinto dos US$ 500 bilhões necessários. Mas obter essa quantia por meio do Congresso, em uma época em que Obama está tentando obter mais ajuda para países como o Afeganistão e o Paquistão, será um desafio enorme.
Obama prometeu uma nova forma de compromisso. Seus assistentes têm debatido como mesclar expressões de humildade com o exercício de influência. Será uma dança delicada, dificultada pelo fato de que o amplo objetivo de refazer a arquitetura econômica mundial foi substituído por cada nação que tenta evitar o equivalente da execução hipotecária doméstica americana.
"Em qualquer reunião internacional, outros líderes vão querer ouvir que entendemos o que deu errado nos EUA e no exterior, que importamos com a maneira pela qual isso os afeta e que estamos trabalhando para reparar isso", disse David Lipton, assistente especial de Obama para assuntos econômicos internacionais. "É difícil imaginar uma reunião com um líder estrangeiro que não esteja interessado nestas questões".
França e Brasil, por exemplo, compartilham de uma total identidade de opiniões sobre a necessidade de uma regulação mundial, declarou ontem o presidente francês Nicolas Sarkozy depois de se reunir, em Paris, com o presidente Luiz Inácio Lula de Silva.
Sarkozy disse ainda que os projetos de texto para a declaração final do G20 não agradam nem Alemanha nem França.
Ontem Obama negou que haja divisões entre os membros do G20 e pediu a eles união na cúpula de hoje para encontrar a saída mais rápida para a recessão global.
Veículo: Gazeta Mercantil