Redução da meta de inflação exigirá juros mais altos, dizem especialistas

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São Paulo - A redução da meta de inflação para 2019 e 2020 exigirá uma política de juros mais altos, avaliam especialistas, pontuando que a larga difusão da indexação no Brasil impede trabalhar com parâmetros de preços mais baixos.

 

Após 14 anos com uma meta de 4,5%, o Conselho Monetário Nacional (CMN) decidiu ontem estabelecer uma referência menor para a inflação: 4,25% para 2019 e 4,00% para 2020, com margem de tolerância de 1,5 ponto percentual, para mais ou para menos. Isso significa que, em 2019 por exemplo, o Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) poderá acumular, em 12 meses até dezembro, alta entre 2,75% e 5,75%, sem que o Banco Central (BC) descumpra a meta.

 

Para o professor de economia da Universidade de Brasília (UNB) José Luiz da Costa Oreiro, esta decisão é "temerosa", pois pode produzir juros reais muito altos os quais, por sua vez, geram apreciação do câmbio (valorização do da moeda nacional frente ao dólar) e recessão.

 

"A experiência brasileira com o regime de metas de inflação, implementado há 18 anos, mostra que a média do IPCA entre 1999 e 2016 sempre ficou em torno de 6,5%, afirma Oreiro. "Em 18 anos de história, as únicas vezes em que a inflação fechou o ano abaixo de 4,5% foi em 2006, 2007 e 2009. Nos dois primeiros anos, por conta de uma apreciação muito forte da taxa de câmbio e, em 2009, por conta dos efeitos da crise financeira internacional", completa o professor da UNB, destacando que a expectativa de um IPCA abaixo de 4,5% para este ano se explica pelos impactos da recessão.

 

Indexação

 

Para Oreiro, ainda é muito complicado trabalhar, no Brasil, com parâmetros de inflação menores, enquanto a indexação de preços é bastante difundida na economia. "Não só não retiramos algumas indexações, como fomos incorporando outras ao longo do tempo", diz ele, mencionando, por exemplo, a correção do salário mínimo pela inflação do ano anterior (ele também é reajustado pelo desempenho do Produto Interno Bruto, o PIB, de dois anos atrás).

 

Segundo o professor, sem resolver essas questões, quando chegarmos em 2020, por exemplo, o BC terá que pressionar a taxa básica de juros para cima (Selic) para alcançar uma inflação de 4,00%. "Caso isso aconteça, será realmente bem difícil ter juros baixos no Brasil", critica Oreiro.

 

O professor da Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade da USP (FEA-USP), Simão David Silber, acrescenta que juros reais altos implicam em um câmbio mais baixo (dólar mais barato), o qual, por sua vez, retira a competitividade da indústria nacional. Silber considerou "inadequada" a decisão do CMN, pois, na sua avaliação, as questões que o Brasil precisa resolver hoje são: retomar o crescimento econômico, reduzir o desemprego e melhorar o quadro fiscal do setor público.

 

"O problema do Brasil daqui para a frente não é inflação. Pelo contrário, nosso IPCA está em 3,6% em 12 meses. O grande problema do País é que ele não está crescendo. Além disso, o câmbio está baixo e os juros, muito altos. Portanto, qualquer política monetária mais dura vai nos levar para a direção errada", afirma Silber.

 

"Outro imbróglio do Brasil está na área fiscal, sendo que um dos componentes dele são as despesas financeiras, pressionadas por juros altos."

 

Já o professor de economia da Fundação Getulio Vargas (FGV) Mauro Rochlin considera "acertada" a decisão do CMN, pois as novas metas estão ancoradas com as expectativas de mercado. Esta ancoragem se explica, para ele, pela perspectiva de demanda mais fraca e de "câmbio comportado" nos anos à frente.

 

"Nos próximos anos, ainda que ocorra uma recuperação da demanda, a indústria ainda será capaz de atendê-la, dada a sua alta capacidade ociosa", diz ele. "Por outro lado, nossas reservas internacionais e balança comercial devem permitir uma estabilidade cambial."

 

O CMN também definiu que as metas de inflação serão definidas com três anos de antecedência, e não mais nos dois anos anteriores. Para o presidente do BC, Ilan Goldfajn, isso trará diversos benefícios. O primeiro, segundo ele, está ligado ao planejamento da sociedade. "Alongar o horizonte permite balizar as expectativas de inflação em prazos mais longos", disse Ilan. "Segundo, com expectativas ancoradas, a economia pode almejar ter juros de longo prazo mais baixos", afirmou Goldfajn.

 

O ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, acrescentou que a equipe econômica trabalha com "o cenário colocado e não com hipóteses". "Estamos cumprindo o nosso mandato, trabalhando com foco e vamos continuar a fazê-lo. Cabe ao presidente da República a nomeação dos seus ministros e, estando no cargo, todos estão fazendo o seu trabalho."

 

 

Fonte: DCI São Paulo

 

 


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