A indústria brasileira já sente, desde o final do ano passado, os efeitos da retração no consumo em decorrência da crise econômica internacional. Muitas entidades e analistas apontam queda de até 10% na produção industrial este ano. Para tentar reduzir o tombo, alguns especialistas apostam no estímulo à demanda interna e na ampliação do crédito. O governo tomou algumas medidas neste sentido, como a redução do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) para automóveis e eletrodomésticos da linha branca e a redução da taxa básica de juros (Selic) pelo Banco Central.
Há um consenso entre os entrevistados pelo Jornal do Commercio de que o pior ficou no quarto trimestre do ano passado. Dados recentes indicam melhora na produção e no emprego na indústria. Os dados de março da Pesquisa Mensal de Emprego (PME) do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), no entanto, mostraram que o volume total de desempregados no País aumentou. O número de desocupados em março alcançou o mais alto patamar em 20 meses, chegando a 2,08 milhões de pessoas, com taxa de 9% em comparação com o mês anterior.
Para o economista da Fundação Getúlio Vargas (FGV) responsável pela sondagem industrial, Jorge Braga, a atividade econômica ainda está muito fraca, mas é possível perceber melhora tênue no mercado interno. "Fazendo uma comparação entre o período anterior a setembro - quando a crise explodiu -, dezembro e agora, já é possível notar uma leve melhora. Espera-se que o governo tome medidas para melhorar ainda mais a demanda e o crédito", disse. "Os incentivos à indústria automotiva, como a redução do IPI, surtiram resultado. É preciso melhorar a confiança. O índice de confiança na indústria atingiu ponto muito baixo em dezembro (74,7%)", afirmou Braga. Em abril, o índice ficou em 84,6%.
CICLOS MAIS LONGOS. O economista aponta alguns setores que apresentam melhoria mais acentuada, mas garante que para outros com ciclos mais longos de recuperação será preciso que o governo faça investimentos. "É preciso que o governo invista, principalmente, no setor de bens de capital, que foi muito afetado. Em alguns setores a recuperação é até visível, como no de material de transporte, em função dos incentivos fiscais. O segmento de produtos alimentares ainda tem desempenho bem razoável e a indústria metalúrgica já passou pelo período mais crítico", afirmou.
As pesquisas mais recentes do IBGE mostram que a indústria brasileira está aos poucos retomando o fôlego. A recuperação, no entanto, está longe do patamar anterior ao início da turbulência internacional.
"Até fevereiro, a produção industrial reage timidamente. O resultado, no entanto, fica muito aquém de recuperar a queda de produção no quarto trimestre. Já o emprego registrou o quinto mês consecutivo de queda em fevereiro, mas os dados de emprego respondem com defasagem aos dados de produção", disse a coordenadora das pesquisas mensais de indústria do IBGE, Isabella Nunes.
De acordo com a coordenadora, os setores industriais mais afetados foram aqueles que vinham impulsionando a produção até setembro, como o de máquinas e equipamentos e de veículos automotores. "Os setores menos afetados foram o de minerais não-metálicos, muito ligado à construção civil, que permanece aquecida, e o setor de refino de petróleo e produção de álcool", disse Isabella.
Setores ligados à demanda interna podem contribuir para recuperação da produção industrial, segundo entidades ligadas à indústria. A recuperação para este ano deverá ser lenta e as projeções são pessimistas para a maioria dos especialistas entrevistados pelo Jornal do Commercio. Os economistas concordam que é preciso reduzir as taxas de juros e ampliar o crédito para pequenas, médias e grandes empresas.
Segundo o gerente do Departamento de Pesquisas e Estudos Econômicos da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp), André Rebelo, a redução da taxa básica de juros (Selic) pelo Banco Central mostra reação, mas de forma muito lenta. Para ele, a produção industrial sofrerá retração de até 10%.
"É difícil fazer previsões, mas para que o resultado da produção industrial fique semelhante ao obtido em 2008, será preciso que até dezembro o crescimento seja de 3% ao mês. Para fechar com queda de 5%, o País precisa registrar crescimento de 2% ao mês, um pouco acima do que foi apurado nos primeiros meses do ano. Se considerarmos crescimento de 0,8% ao mês até o final do ano, a produção industrial terá retração de 10% em 2009", explicou Rebelo.
CENÁRIOS. Para chefe da Divisão de Estudos Econômicos da Federação das Indústrias do Estado do Rio de Janeiro (Firjan), Patrick Carvalho, ainda é cedo para fazer previsões, pois o cenário atual é incerto. Ainda assim para ele, a produção industrial poderá cair em torno de 3%. Carvalho disse que a construção civil poderá ajudar a recuperação da economia ainda no segundo semestre deste ano. Para ele, o setor tem efeito multiplicado, pois puxa a cadeia de transformação e emprega muitas pessoas.
"Os sinais de aumento da demanda são negativos. A produção tende acompanhar essa queda. A construção civil, se fomentada pelo governo com os projetos habitacionais, pode ajudar a diminuir o desemprego e aumentar o consumo. Outros setores que podem contribuir para recuperação é o de produção de minerais não-metálicos e de produtos de linha branca, com a redução das alíquotas do IPI sobre geladeiras, fogões e máquinas de lavar, aprovado pelo governo em abril", afirmou.
A tendência de recuperação nacional, para o economista do Instituto de Estudos para o Desenvolvimento Industrial (Iedi) Rogério César Souza, só deve acontecer no início de 2010. Para Souza, se o crescimento da produção continuar no ritmo atual, de 2% ao mês, no final do ano a retração será de 4%. "A recuperação está devagar. A situação ainda não é favorável este ano. A redução do IPI para veículos é importante, mas ela sozinha não será suficiente para recuperar a economia."
A Confederação Nacional da Indústria (CNI) não faz projeções para a produção industrial, mas calcula que o Produto Interno Bruto (PIB) industrial este ano deve registrar retração de 2,8%. A indústria de transformação deverá sofrer o maior recuo, 4,5%. Outra que também deverá se retrair é a extração mineral, com queda de 3,7%.
"É importante expandir o volume de crédito e reduzir as taxas. Não só a Selic, porque não é essa taxa que é paga por quem pega empréstimo. A taxa de juros de longo prazo (TJLP) está há um ano sem ser alterada. Do ponto de vista dos empresários, o corte da TJLP é extremamente importante, uma vez que a taxa é usada na correção das linhas de crédito voltadas para investimento, como é o caso das linhas do BNDES", afirmou o gerente executivo de Política Econômica da CNI, Flávio Castelo Branco.
Veículo: Jornal do Commercio - RJ