Apesar do pessimismo em relação a economia brasileira neste ano, há um consenso entre os especialistas de que o Brasil deve apresentar forte recuperação em 2010. Para o economista Delfim Neto, o Produto Interno Bruto (PIB) deve atingir crescimento de 4% em 2010. O relatório Focus, do Banco Central, que reúne as projeções das cinquenta maiores instituições financeiras do País, projeta queda de 0,44% no PIB este ano, mas um crescimento de 3,5% para o ano que vem.
"Nós temos menos problemas do que eles [outros países] têm. Vamos sofrer o maior impacto nos três trimestres deste ano. Mas eu estou convencido que com a continuidade da política econômica teremos condições interessantes de construirmos uma estrada de concreto, uma Autoban alemã nos próximos 25 anos", afirmou Delfim, durante fórum realizado pela revista Exame.
"O Brasil é o único Bric com uma democracia constitucional em funcionamento, não tem problemas de língua, fronteiras e étnico-religiosos, o que é um sinal de adaptabilidade e tolerância, tem 40% da energia renovável e o pré-sal", afirmou.
Apesar de dizer que o Banco Central está na direção correta, ele criticou a lentidão do BC. "O BC sempre agiu na direção certa, mas sempre com sete meses de atraso e sempre com doses homeopáticas. Não usou sua musculatura para que a economia caísse para 2%, 3% ou 4% de crescimento", disse ele.
Outro erro, segundo Delfim, foi ter dado um melhor tratamento para os bancos grandes e para os bancos estatais. "O BC desenvolveu a teoria de que banco grande é melhor que banco pequeno e de que banco público é melhor do que banco privado."
"Se eu tivesse de me expressar em números, diria que passamos por dois quintos da crise", afirmou o economista Robert Mundell, um dos três prêmios Nobel de economia que falaram durante o fórum. Já para Joseph Stiglitz, "estamos no fim do começo" da crise. E Edward Prescott condicionou a recuperação ao corte de impostos para o setor produtivo. Contudo, o economista mostra-se cético quanto à possibilidade de o governo de Barack Obama reduzir a carga tributária. "Estou pessimista", disse.
Para Stiglitz, a trajetória da crise não seguirá o desenho usual dos teóricos, como um "V" ou um "U", isto é, um momento de forte queda, seguido por uma fase no fundo do poço, e uma retomada rápida. Para o ganhador do Nobel de 2001, o caminho da crise será mais parecido com uma "raiz quadrada de ponta-cabeça". Para o economista, haverá uma fase de recuperação e, após um pico, um certo recuo, até que o mundo se estabilize em um novo patamar. "É muito difícil ter certeza, mas é possível que continuemos sentindo esse mal estar, essa recuperação lenta", disse.
O desemprego continua crescendo em várias regiões do planeta, o preço dos imóveis ainda não se estabilizou, e os lucros das empresas ainda não voltaram a crescer. Por isso, Mundell avalia que a recuperação ainda vai demorar. E, da mesma forma que os países sentiram o impacto da crise em momentos distintos, a recuperação também virá em fases. Mundell afirma que "os Estados Unidos estão começando a chegar ao fundo do poço, para, daí, iniciar a recuperação". O mesmo, porém, ainda não ocorre com a Europa. "Não vejo a Europa saindo da recessão agora. Talvez isso ocorra no final do ano, mas não é certeza", afirma o economista.
Se o governo de Barack Obama decidir aumentar os impostos das empresas para equilibrar as contas públicas, cometerá um grande erro. A avaliação é do economista americano Robert Mundell, prêmio Nobel de 1999. Mundell defende uma forte redução de impostos para as companhias americanas - dos atuais 35% para 15%. "Se isso acontecer, as empresas dirão 'oba' e o índice Dow Jones vai se recuperar rapidamente" afirmou.
O Brasil foi tratado pelos economistas como um dos mais preparados para enfrentar a crise. "O Brasil vai se dar bem; os fundamentos estão aqui", afirmou Prescott. "Fico feliz em saber da posição do Brasil. O país está bem mais preparado para enfrentar a crise", disse Mundell, acrescentando que visitou o país, pela primeira vez, em 1967.
Focus
Para o presidente da Fractal, Celso Grisi, o pessimismo do Relatório em relação á economia em 2009 é causado pela preocupação com a queda da produção industrial, que leva a retração das demandas e por consequência dos lucros. "Este é o setor que mais emprega no País. No entanto, eu vejo com maior otimismo o resultado do PIB, com fechamento em torno de 2%, pois haverá uma situação de equilíbrio nas taxas de emprego, o aumento nos preços das commodities e podemos dizer que haverá um crescimento da demanda", explica.
No mesmo levantamento, a estimativa de retração na produção industrial em 2009 piorou de -3,84% para -4,13%. Para 2010, a mediana das previsões sinaliza crescimento de 4%. Segundo Grisi, a queda registrada pelo Índice Geral de Preços ao Mercado (IGP-M) justifica a projeção de que a taxa básica de juros (Selic) feche o ano em um dígito. "O BC terá que fazer novos cortes na Selic para termos uma inflação comportada este ano. Mas não devemos esquecer que o Relatório é menos conservador do que a opinião do BC em si", argumenta. Para o professor da Trevisan Escola de Negócios, Alcides Leite, "o pessimismo deverá ser revertido novamente."
O Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) neste ano deve ficar em 4,36% e não mais em 4,3%, segundo projeção dos analistas do mercado financeiro. Em trajetória contrária, a estimativa para o IPCA em 2010 caiu de 4,32% para 4,30%, segundo informações do boletim Focus.
De acordo com Grisi, a inflação oficial deve mesmo ficar muito próximo do centro da meta (4,5%). "Essas distâncias divulgadas são muito pequenas, isso não mudaria muito o reflexo na economia. Mas com esses dados, o BC teria que trabalhar com a Selic em 10%, para não haver uma pressão inflacionária em 2010".
A projeção para o Índice Geral de Preços (IGP-DI) passou de 2,01% para 2,17% neste ano. Para o Índice Geral de Preços de Mercado (IGP-M) a estimativa caiu de 2 07% para 1,92%. Os analistas mantiveram a previsão para o nível do dólar em relação ao real no fim deste ano em R$ 2,20. Já para o fim de 2010, a previsão caiu de R$ 2,25 para R$ 2,20.
O que piora a previsão para o déficit em conta corrente em 2009. No levantamento, a mediana das previsões para o déficit passou de US$ 19 bilhões para US$ 20 bilhões. Para 2010, a previsão de déficit passou de US$ 22,5 bilhões para US$ 23 bilhões.
Alcides Leite e Celso Grisi não acreditam na previsão de câmbio em R$ 2,20 , ambos esperam um resultado entre R$ 2,00 e R$ 2,10.
A previsão de superávit comercial em 2009 subiu para US$ 17,5 bilhões. Para 2010, a estimativa de saldo comercial manteve-se em US$ 15 bilhões.
"O saldo comercial deve ser mais estimulante, deve subir mais, fechar na casa de US$ 20 bilhões. Já os investimentos externos diretos vão superar os 24 bilhões", concluiu Grisi.
Analistas elevaram ligeiramente a estimativa de ingresso de Investimento Estrangeiro Direto (IED) em 2009, que passou de uma estimativa de US$ 22 bilhões para US$ 22,04 bilhões.
Veículo: DCI