Depois de terem despencado no mercado internacional, reflexo da crise global que afetou a demanda, os preços do leite em pó se recuperam, abrindo perspectivas para uma retomada das exportações brasileiras de lácteos em 2010. Neste ano, as vendas externas do país caíram quase 68% em receita até novembro, em decorrência dos preços baixos e do real valorizado ante o dólar, que desestimularam os negócios.
A recuperação dos preços do leite em pó, que bateram US$ 2.150 no primeiro semestre do ano e já alcançam, em média, US$ 4 mil por tonelada na Europa, conforme o Departamento de Agricultura dos EUA, faz exportadores e analistas do setor acreditarem que 2010 será um ano de recuperação para as vendas brasileiras de lácteos.
Rafael Ribeiro, analista da Scot Consultoria, afirma que a elevação dos preços é resultado do processo de recuperação da economia mundial e da diminuição da produção em algumas regiões produtoras de leite, como Europa e Austrália. "À medida que as economias vão se recuperando, a demanda vai crescendo", diz. A queda na produção ocorreu, em parte, segundo ele, porque as cotações baixas levaram alguns pecuaristas a deixar a atividade.
Otimista com o avanço dos preços, Rodrigo Alvim, presidente da Comissão de Pecuária de Leite da Confederação de Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA), acredita que a recuperação das cotações já deve se refletir nas exportações neste mês. "A expectativa é de já em dezembro ficarmos superavitários na balança", afirma. Até novembro, o déficit na balança de lácteos foi de US$ 94,9 milhões (ver quadro). Isso ocorreu porque além de o Brasil exportar menos, houve uma enxurrada de leite em pó da Argentina a preços baixos no mercado brasileiro.
"Houve retomada no consumo e devemos voltar a crescer em 2010", avalia Alvim. Os atuais preços, afirma, criam atratividade para exportar. Ele não esconde o desejo de que os números de 2008 se repitam. Naquele ano, as exportações de lácteos bateram recorde e alcançaram US$ 556 milhões - em grande medida por conta das importações da Venezuela. Mas Alvim admite que a tarefa exige esforço.
Jacques Gontijo, presidente da cooperativa Itambé, uma das maiores exportadoras de lácteos do país, elenca uma série de fatores que explica a alta do produto: a maior demanda da China, onde problemas de adulteração do leite com a melamina geraram "aversão ao produto local"; estoques baixos nos EUA e estagnação da produção no Brasil, que neste ano deve ficar estável, em 27,5 bilhões de litros, depois de subir 5,5% de 2007 para 2008.
Chama a atenção na atual recuperação dos preços do leite a velocidade com que esta vem ocorrendo. Analistas concordam que o mercado de leite é sensível e responde rapidamente aos movimentos de oferta e demanda. Mas até quem é especialista tem se surpreendido com a nova valorização dos preços. A primeira onda de alta ocorreu em 2007, quando a demanda asiática puxou as cotações. Agora, é quase consenso que a retomada econômica está sustentando os preços. Mas Alfredo de Goeye, presidente da trading Serlac, responsável por metade das exportações de lácteos do país, é voz dissonante.
"A crise [mundial] não pegou o leite e [seu arrefecimento] não é a razão agora para a alta dos preços", afirma. Cético, de Goeye diz que não há explicação para a baixa expressiva dos preços no passado recente nem para alta hoje. Ele reconhece a queda na produção na Austrália e Argentina, mas não as considera suficientes para tamanha variação de preços.
Para o executivo, "apesar do câmbio atual", já se torna viável exportar leite com os preços de hoje. As discussões sobre contratos de venda para o começo de 2010 já começam a acontecer. Os destinos para o leite brasileiro não mudaram: países do norte da África e Oriente Médio.
A Venezuela, que este ano praticamente saiu do mercado por causa dos estoques elevados de leite, também deve voltar a demandar, espera Gontijo, da Itambé.
Veículo: Valor Econômico