A nova cara do sabonete

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A venda de barras artesanais tornou-se um negócio lucrativo no Brasil. Redes de lojas nacionais seguem os passos de empresas estrangeiras como Lush e The Body Shop

 


Não é de hoje que sabonete artesanal deixou de ser exclusividade dos estandes de feira hippie para se tornar um artigo refinado – e caro – no Brasil. A novidade é que, de acordo com um levantamento do Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas (Sebrae), nunca tantos brasileiros viveram da venda dele: são 1 500 negócios no país que têm o artigo como carro-chefe – 40% mais do que cinco anos atrás. Pelo menos uma dezena já alcançou, em questão de dois ou três anos, abrangência nacional. O principal apelo dessas redes é vender cosméticos "naturais" (sem a adição de substâncias químicas), feitos a mão e à base de ingredientes que chamam atenção pelo absoluto inusitado, como chantilly e banana com canela – alguns deles com promessas de benefícios à saúde e à beleza (o cheiro, convenhamos, nem sempre será um benefício). É nesse filão que o gaúcho Tobias Chanan, 33 anos, firmou-se como líder entre as redes brasileiras, com o Empório Body Store (cuja fonte de inspiração foi a inglesa, e quase homônima, The Body Shop, precursora no gênero de cosméticos naturais). Tobias já tem vinte lojas fincadas em oito estados. Quem entra na fábrica que ergueu, em Porto Alegre, tem a sensação de estar na cozinha de um grande restaurante, tal é a confusão de utensílios e o número de fogões industriais a pleno vapor. Nas panelas, vê-se de tudo – até champanhe. É um trabalho duro. Qualquer pequeno erro faz o sabão desandar. "Penei para conseguir produzir barras que não se desmanchassem à toa nem cheirassem a sebo", conta Tobias.

 


Lojas como a dele se espelham no modelo de grifes como a inglesa Lush, criada em 1994 por um trio de ex-hippies, atualmente sucesso em quarenta países. A Lush, por sua vez, seguiu no rastro da Body Shop, que, ainda nos anos 70, começou a desbravar o mercado de cosméticos naturais, por vezes também feitos a mão. Só que o foco da Lush, tal como o das redes brasileiras, são as barras de sabonete: é delas que vem algo como 70% de seu faturamento. É curioso lembrar que, no Brasil, a marca inglesa naufragou, coisa de três anos atrás. A principal razão do fracasso foi o câmbio: a libra estava em alta em comparação com o real, e não havia outro jeito senão repassar parte disso para o preço final. O sabão ficou caro, e ninguém comprava.

 


Em geral, esse é um mercado de margens de lucro bastante elevadas: elas giram em torno de 15%, mais que o dobro das registradas com os sabonetes tradicionais. A maior dificuldade é ampliar a escala da produção, uma vez que tudo é feito de maneira artesanal. Enquanto fábricas como a da Body Store ou de outras redes em expansão, como a paulista Wisha, Wisha e a carioca Olfateria, produzem no máximo 15 000 sabonetes por mês, uma Procter & Gamble fabrica na casa dos milhões. No caso dos artesanais, é como fazer pudim: os ingredientes são misturados e imersos em banho-maria para depois ser submetidos a um processo de secagem natural que, dependendo da meteorologia, pode consumir até três dias. Às vezes, a consistência desanda e é preciso recomeçar do zero.

 


Esse tipo de negócio custou a decolar no país. A Body Store, por exemplo, abriu as portas em 1997 e, por mais de uma vez, quase faliu. Agora, ela e as outras crescem a taxas médias de 25% ao ano – quase três vezes as do mercado de sabonetes tradicionais. Estão embaladas por alguns fatores, entre os quais os bons números da economia brasileira. É um cenário propício para que as pessoas se sintam mais estimuladas a pagar até 25 reais por uma barra de luxo. Um segundo empurrão para essa indústria vem de sua própria profissionalização. Até há pouco, os criadores de sabonetes artesanais achavam que bastava inventar uma boa receita para que ela vingasse no mercado. Era uma gestão feita por amadores. "Tudo na minha loja se resumia à intuição", reconhece a designer carioca Cristina Raposo, 56 anos, dona da Olfateria, com seis filiais em três estados. "Acreditava que era só encontrar uma boa fórmula para lucrar milhões."

 


Outro impulso para os sabonetes artesanais tem a ver com uma mudança de percepção das pessoas, no mundo inteiro, em relação a produtos naturais (hoje também chamados de orgânicos) e feitos a mão. De artigos de qualidade inferior, eles passaram a ser vistos como "chiques" e "bons para a saúde", segundo uma recente pesquisa conduzida pelo instituto europeu Organic Monitor. Só há um detalhe relevante nessa história: nem sempre as promessas desses produtos se concretizam. No caso dos sabonetes, elas são inúmeras. Segundo alguns rótulos, combatem a acne, reduzem a celulite, ajudam na cicatrização de feridas e ainda previnem o envelhecimento. "Certos princípios ativos até contribuem para tais finalidades, mas, nas concentrações em que se encontram nessas barras e no curto tempo em que têm contato com a pele, dificilmente proporcionam o resultado esperado", explica a dermatologista Valéria Marcondes. Seu principal benefício se deve à ausência de substâncias químicas, que podem causar irritações à pele.

 


Veículo: Revista Veja
 
 

 


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