Novo estímulo ao trigo no Cerrado

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Movido a subsídio e na esteira da crise argentina, o trigo ensaia ganhar força na região do Cerrado. Nesta terça-feira, em Brasília, a câmara setorial das culturas de inverno deve começar a estudar uma modalidade de contratualizar para o trigo as subvenções que atualmente acontecem em leilões dentro de programas da (Conab) como o PEP (Prêmio para o Escoamento de Produto) e Prop (Prêmio de Risco para Opção Privada de Venda).

 

Nos programas atuais, o governo estabelece um leilão, por meio do qual define a compensação que será paga às empresas que comprarão dos produtores pelo preço mínimo fixado pela Conab. Nesta nova modalidade, a indústria moageira e os produtores de trigo estabeleceriam um contrato direto de compra, para depois receberem ressarcimento do governo, mediante a comprovação de que pagaram ao produtor o preço mínimo, independente de leilão.

 

Este modelo massificaria o subsídio para o trigo. Valeria para todos os produtores, mas seria especialmente estratégico para os do Cerrado, que plantam o trigo irrigado, com um custo de instalação da irrigação que pode chegar a R$ 4 mil de por hectare, segundo o presidente da Associação Brasileira de Irrigação e Drenagem (Abid), Helvécio Saturnino, e que contam com um custo de produção de R$ 1,6 mil por hectare, segundo avaliação da Embrapa.

 

É em razão do custo mais elevado que a Conab fixou na safra passada o preço mínimo do trigo do Cerrado em R$ 594 a tonelada, na variedade para panificação, e em R$ 496 na variedade inferior. São preços acima dos de mercado, que vão de R$ 400 e R$ 450. No Cerrado, a produtividade vai de 4 a 7 toneladas por hectare.

 

Em uma reunião entre industriais e produtores de grãos em Unaí, cidade mineira de 60 mil habitantes que está a 180 quilômetros de Brasília, o coordenador geral de cereais do Ministério da Agricultura, Silvio Farnese, afirmou que uma minuta desta nova modalidade seria apresentada na reunião. E o assessor para assuntos de trigo da Conab, Paulo Magno Rabelo, disse que a autarquia defenderá para esta safra a mesma tabela de preço mínimo da safra passada.

 

A subvenção econômica é um dos pontos centrais para a estruturação de um polo de produção de trigo tropical no Cerrado, que o governo federal pretende lançar ainda este ano. "Temos hoje trigo para cerca de 30% do nosso consumo e a meta é chegarmos a cerca de 70% a médio prazo, o que transformaria o cerrado na principal região produtora", afirmou o coordenador de trigo da Secretaria da Agricultura de Minas Gerais, Lindomar Lopes, que foi encarregado pelo governo federal de coordenar a estruturação do polo com os outros estados produtores: Goiás, Mato Grosso, Mato Grosso do Sul, Bahia e no Distrito Federal.

 

A produção de trigo no Cerrado é discreta: na safra passada, foi de 98 mil toneladas em Minas, 85 mil em Goiás, 73 mil em Mato Grosso do Sul e 14 mil no Distrito Federal. O Paraná, maior produtor nacional, colheu 2,5 milhões de toneladas. O custo do frete rodoviário também pesa: gasta-se R$ 80 para colocar a tonelada de trigo de Unaí em Belo Horizonte, ante cerca de R$ 120 para trazer o trigo da Argentina. Mas, para a indústria, o Cerrado é estratégico.

 

"É possível desenvolver um modelo integrado de produção, de modo a que o produtor segregue o produto do modo que queremos. Isto não é possível conseguir com a produção argentina, que está afetada pela seca e pelo governo anti-ruralista de Cristina Kirchner", afirmou Domingos Costa, dono da fábrica Vilma Alimentos, de Contagem (MG), que comprou no ano passado 32 mil toneladas de trigo, sendo 15 mil toneladas de 60 fornecedores mineiros. " Só não compramos 100% porque não encontramos produto".

 

Também presente na reunião, o Moinho Sete Irmãos, que produz farinha para bolos em Uberlândia (MG), prometeu comprar em Minas Gerais 60 mil toneladas de trigo, se tal produção existir. "Não dá para ficarmos contando com uma mudança política na Argentina", disse o vice-presidente Ilvio Andrade.

 

Costa é o presidente do Sindicato da Indústria do Trigo de Minas Gerais e foi um dos organizadores da reunião em Unaí. O encontro foi marcado pela frieza dos produtores de grãos. Na região de Unaí, com 40 mil hectares irrigados, as culturas principais são milho e feijão. O trigo entraria em um sistema de rotação de culturas para a preservação da propriedade. O presidente da Cooperativa Agrícola de Unaí (Coagril), José Carlos Ferigolo, deixou claro que a região só migra para o trigo com compra garantida que cubra os custos. "Aqui só se planta trigo com o contrato na mão. E quem vai garantir o preço? Esta é a questão", disse.

 

No passado, os agricultores de Unaí chegaram a se entusiasmar com o trigo. Mas o principal comprador, a Bunge, reduziu suas compras e os triticultores não conseguiram colocar a produção no mercado por um preço que cobrisse o custo. Voltaram com toda força para o feijão. Em Unaí, a cooperativa reúne 220 associados, sendo que dez deles concentram a metade da área de 100 mil hectares. Na safra passada, plantou-se trigo em Unaí em 5 % da área.

 

Para incentivar a produção no Cerrado, Costa investiu em silagem. Montou por R$ 4 milhões um silo de 15 mil toneladas em São Gotardo (MG), onde compra a produção da Cooperativa Agrícola do Alto Paranaíba (Coopadap) de agricultores nisseis. De Unaí o empresário viajou para Patos de Minas, a 60 quilômetros de São Gotardo, para negociar a compra de trigo deste ano. Frente à direção da cooperativa agrícola, Costa ofereceu: "Compro tudo o que vocês produzirem. Dou como garantia a silagem por nossa conta e o pagamento 15 dias depois da entrega. E pago pelo menos R$ 400 a tonelada ou o preço do mercado, o que for superior". Os agricultores ligaram suas calculadoras e a discussão se prolongou por duas horas, na sala de reuniões de um hotel em Patos.

 

A informação de que uma nova forma de contrato poderia garantir a compra pelo preço mínimo pouco sensibilizou os cooperados. "É ótimo. Mas estas coisas do governo levam muito tempo", comentou um dos diretores da Coopadap. Os agricultores sugeriram a fixação de um valor pela tonelada próximo ao preço mínimo e foi a vez de Costa resistir. No final, Costa elevou um pouco a sua proposta original e os cooperados ficaram de levar a sugestão aos associados.
 

 

Veículo: Valor Econômico


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