Steviafarma faz primeira colheita em escala comercial no país
Broto das plantas mais doces é separado e reproduzido em estufa na fazenda da Steviafarma, no norte do Paraná; prática mantém vivo o material genéticoOs engenheiros paranaenses Zander Martinez e Airton Goto passaram boa parte das suas horas de trabalho nos últimos seis a sete anos mordiscando folhas de estévia nas lavouras da empresa de adoçantes Steviafarma, na cidade parananense de Ângulo, a 35 quilômetros de Maringá. Viciados em pesquisa, eles lideram a área técnica do projeto da empresa paranaense para lançar uma nova formulação de adoçante de estévia com o melhor do sabor doce, sem calorias, e com um mínimo de gosto residual amargo. O lançamento do novo produto está marcado para o segundo semestre de 2011.
O diferencial desse adoçante em relação ao que a empresa já vende no mercado recai nas descobertas desses dois pesquisadores, que há mais de 20 anos trabalham na empresa de Maringá. A estévia que será processada e comercializada como adoçante pela companhia no ano que vem é resultado da primeira lavoura da planta em larga escala em terras brasileiras, e possivelmente em todo o mundo, onde os cultivos ocorrem em propriedades de um hectare.
De origem paraguaia, a estévia é uma erva semiperene (como a cana-de-açúcar, rebrota após o corte por cinco anos), carente de luz solar, mas pouco exigente com solos. A planta vai bem em argilosos e arenosos.
A Steviafarma, controlada pela Multiparticipações - que atua na produção de tabaco e charutos - e pelo grupo paranaense produtor de açúcar de cana Santa Terezinha, tem uma área de 200 hectares de estévia, dimensões gigantescas para esse mercado.
O projeto, que incluiu alguns ajustes industriais, começou em 2004 e conta com um parceiro estratégico. Uma multinacional americana investiu nesse período US$ 1,5 milhão pelo direito receber o adoçante em cristal na proporção de um quarto do que é produzido hoje na área de 200 hectares. Outro aporte de US$ 1,7 milhão deve ser feito, ainda sem data definida, diz o diretor-presidente da Steviafarma, Thales Aburaya.
Mesmo os visitantes bem-vindos não podem sair da fazenda, em Ângulo, com uma pequena muda de estévia, sequer como recordação. Isso porque a lavoura tem algo de muito valioso, resultado do trabalho de Zander, Goto e suas equipes. Nesses anos de pesquisa, eles separaram, ramo a ramo, as plantas de estévia mais doces e mais vigorosas, numa seleção que permitiu criar uma planta de estévia com a presença de pelo menos 80% de "rebaudiosídeo A".
O dito, de nome difícil, é uma substância "ouro" no mundo dos adoçantes e presente em pequena concentração (25%) nas espécies nativas, até hoje as mais usadas pela Steviafarma e pela maior parte das empresas do segmento. As nativas têm geralmente 75% de esteviosídeo, responsável pelo gosto amargo do produto. "Colocamos a folha na boca. Se for doce, separamos para fabricar mudas. Se não, descartamos", descreve Zander, sobre o processo de seleção das plantas.
Com essa seleção agrícola, a empresa consegue tirar da lavoura uma planta com até 85% de rebaudiosídeo A. Na indústria, o processo de extração permite elevar esse índice para 100%, diz Goto, um engenheiro químico aficcionado pelo tema "estévia", com doutorado na área de alimentos.
Em 2010, a produção da Steviafarma, ainda com a matéria-prima paraguaia e argentina, ou seja, com a variedade com apenas 25% de rebaudiosídeo A, será de 20 toneladas do adoçante de estévia em cristal. Aburaya ainda não tem estimativa dos volumes para 2011. Mas, certamente serão maiores, pois será o primeiro ano em que a Steviafarma destinará parte da produção do "novo" adoçante para o parceiro estratégico que está no projeto.
A empresa também negocia um contrato de fornecimento para a empresa Alimentos Funcionais do Brasil (AFB), detentora da marca Só Soja, de produtos à base da oleaginosa. Ronaldo Stábile, diretor comercial da AFB, com sede em Caldas Novas (GO), espera substituir o adoçante que usa hoje, a sucralose, pela estévia, até meados do próximo ano.
A outra parte da produção da Steviafarma é vendida no mercado interno, em redes de supermercados e varejistas de produtos naturais, e ainda há uma parcela (10%) exportada para Chile, Estados Unidos, Guatemala, Uruguai e Peru.
Há poucas informações confiáveis sobre o mercado mundial de estévia. A publicação do Instituto Agronômico de Campinas intitulada "Produção de estévia: do plantio à comercialização" menciona dados de 2004, indicando que a produção e o comércio mundial de estévia movimentam cerca de US$ 200 milhões por ano.
O mercado de produtos light e diet, no qual o adoçante se insere, faturou em 2009 no Brasil R$ 8 bilhões, segundo a Associação Brasileira da Indústria de Alimentos para Fins Especiais e Congêneres (Abiad). O segmento de adoçantes no país vem crescendo a taxas de 7% ao ano na última década.
Veículo: Valor Econômico