Negociações mais duras com fabricantes tornam mais frequentes interrupções no fornecimento
Em meio a notícias de uma possível negociação para se associar a Abílio Diniz, do Grupo Pão de Açúcar, o Carrefour Brasil endurece o discurso com fornecedores. Segundo apurou o Valor, a varejista vem exigindo aumento da bonificação (desconto que o varejo obtém na aquisição de mercadorias da indústria), prazos maiores para pagamento e se recusa a repassar a alta dos custos de insumos que já foi absorvida pelos fabricantes.
O acirramento da disputa com fornecedores começou quando assumiu uma nova diretoria financeira no Carrefour em outubro. A partir daí, tornou-se mais frequente a interrupção do fornecimento de itens de alimentos, bebidas e higiene e limpeza na rede, até que se chegue a um acordo. Neste momento, por exemplo, segundo apurou o Valor, estão paradas as vendas de produtos à base de leite, cacau e farinha da Nestlé, por conta da alta do preço desses insumos, com a qual o Carrefour não concorda. Procurada, a Nestlé não se manifestou sobre o assunto.
Além disso, a filial brasileira da varejista vem operando com cada vez menos estoques, o que está tornando frequente a falta de produtos nas gôndolas. "É um sinal do que acontece quando o financeiro se sobrepõe ao estratégico", diz uma fonte do setor. O presidente do Carrefour Brasil, Luiz Fazio, empossado em agosto, passou a acumular a diretoria comercial da empresa, enquanto a matriz francesa indicou para o comando financeiro Christophe Guillaume Martin, que assumiu em outubro. Desde então, os fornecedores sentiram que a rede está firmemente disposta a recuperar no país os euros perdidos no último exercício fiscal, quando foi registrada uma baixa € 550 milhões devido a fraudes contábeis descobertas no Brasil.
Procurado, o Carrefour respondeu, por sua assessoria, que "adota práticas comerciais leais e transparentes, pautadas pelo seu Código de Conduta para Negócios, e que norteiam o relacionamento da empresa com todos os seus fornecedores".
Um fabricante de biscoitos que ficou quatro meses sem vender à rede este ano, diz que o Carrefour passou a se sentir ainda mais pressionado em janeiro, quando o rival Walmart adotou a estratégia global "preço baixo todo dia". "Eles [Carrefour] não queriam aceitar o repasse de custos do preço do trigo, que já tinha sido negociado antes com o Walmart e o Pão de Açúcar", diz uma fonte da fabricante.
Já um fornecedor de higiene e beleza deixou de vender para o Carrefour sua linha mais barata, depois que a rede propôs em janeiro uma alta da bonificação (desconto) de 18% para 32% sobre o preço dos itens. "Fica inviável vender nessas condições", diz a fonte que, para compensar, ampliou a parceira com o Pão de Açúcar.
O endurecimento na negociação com os fornecedores envolve só a bandeira Carrefour no Brasil. As outras empresas do grupo - Atacadão e Dia - mantêm negociações em paralelo, que estão fluindo bem com os fornecedores ouvidos pelo Valor. Mais uma mostra de que a rede francesa não quer que uma operação "contamine" a outra. Mesmo porque ainda discute a separação (spin-off) das operações do Dia no mundo. Com isso, tanto o Dia quanto o próprio Atacadão no Brasil poderiam ser negociados à parte, segundo interlocutores do varejo.
Veículo: Valor Econômico