Governo dá sinal verde à operação Diniz-Carrefour

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Setores do governo deram sinais favoráveis à fusão entre Pão de Açúcar e Carrefour no Brasil, com apoio de R$ 3,9 bilhões do BNDES. O ministro do Desenvolvimento, Fernando Pimentel, disse que a operação é estratégica para o país pela possibilidade de ampliar o mercado internacional para produtos nacionais.

 

A presidente Dilma Rousseff foi informada previamente da operação. Segundo fontes do Palácio do Planalto, pediu "cautela", mas não se opôs ao envolvimento do BNDES no negócio. O banco deve participar por meio do BNDESPar, seu braço de participações acionárias. Dessa forma, não haveria empréstimo subsidiado.

 

O governo compara a união das duas redes de supermercados com aquela que resultou na criação da Inbev. Na fusão da brasileira Ambev com a belga Interbrew, em 2004, a gestão da multinacional passou a ser feita por executivos brasileiros. Segundo informações que chegaram ao Planalto, o mesmo poderia ocorrer com a união entre Pão de Açúcar e Carrefour.

 

O governo considera que o grau de concentração resultante da fusão - estimado em 32,2% - seria normal. Nos EUA, o Walmart também detém 32% do mercado e, na França, o Carrefour tem 26%. Numa avaliação preliminar, não haveria superposição de lojas, mas complementaridade. O governo acredita que o Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) deverá aprovar a operação, mas poderá exigir a venda de alguns supermercados.

 

O anúncio da possível fusão provocou forte valorização das ações do Pão de Açúcar. Em dois dias, as ações PN, sem direito a voto, tiveram alta de 9,18%. No mês, até ontem, a valorização é de 12,32%, ante uma queda de 3,54% do Ibovespa. As ações da varejista bateram recorde de negociação e giraram quase R$ 1,7 bilhão, quatro vezes o movimento da Vale e cinco vezes o da Petrobras. No entanto, em vez de representar um aval dos investidores, comemorando a potencial transação, a grande demanda vinha do próprio Casino, sócio e atual rival de Abílio Diniz pelo controle do Pão de Açúcar. O Casino informou ontem à noite que nos últimos dias comprou mais 6% do capital da empresa em bolsa. Com isso, sua fatia na companhia subiu de 37% para 43%, num investimento de R$ 1,1 bilhão. Por isso, analistas recomendam cautela aos investidores, porque o Casino tem poder para vetar a operação.

 

Casino compra o Pão de Açucar

 

No dia seguinte ao anúncio da proposta de combinação de Pão de Açúcar e Carrefour, as ações da varejista brasileira baterem recorde absoluto de volume negociado. Giraram quase R$ 1,7 bilhão, quatro vezes o movimento da Vale e cinco vezes o da Petrobras. Foi nada menos do que 25% do total negociado na BM&FBovespa ontem, ou o equivalente a 9,2% de todo o valor de mercado da companhia.

 

Mas, no lugar de ser um aval dos investidores comemorando a potencial transação, a grande demanda veio do Casino, sócio e atual rival de Abilio Diniz no controle do Pão de Açúcar.

 

Ontem à noite, a rede francesa informou ao Pão de Açúcar que comprou mais 6% do capital da empresa em bolsa, em ações preferenciais, nos últimos dias. Com isso, sua fatia na companhia subiu de 37% para 43%. Trata-se de um investimento de R$ 1,1 bilhão.

 

Independentemente do que decidirá sobre a proposta de combinação com o Carrefour, o Casino está se preparando para a guerra, embora o discurso é de que tais aquisições - é o segundo grande investimento em bolsa, o outro foi de 3,7% do capital, com gasto da ordem de R$ 800 milhões - visam apenas comprovar seu comprometimento com o Pão de Açúcar e com o Brasil e o reforço de sua posição de controlador.

 

Juntos, os dois movimentos elevaram a participação do Casino nas últimas duas semanas em 10%, aproximadamente, com um desembolso de quase R$ 2 bilhões.

 

Com eles, a fatia do Casino no Novo Pão de Açúcar (NPA) - holding que dividiria o controle do Pão de Açúcar mais o Carrefour Brasil, com o Carrefour França - está perto de se igualar ao que teriam juntos Abilio Diniz, BNDES e BTG Pactual.

 

Antes dessa aquisição, o Casino seria diluído de 37% para 29,8% com a operação sugerida. Agora, sua fatia ficaria em 34,4% - os demais sócios, sem contar o mercado, somariam 38%.

 

Durante o dia, ainda sem a confirmação do Casino, o mercado já dava como certo que a empresa era o comprador, por conta do grande volume de ontem. Além disso, os investidores destacavam que não havia motivo para comprar as ações ao preço atual, uma vez que ainda existe um risco expressivo de a operação não se concretizar - já que a palavra final é do Casino.

 

Até o começo da tarde, quando houve a maior concentração das compras, as ações do Pão de Açúcar chegaram a registrar forte alta novamente: a máxima mostrava valorização de 12%, repetindo o movimento de terça-feira. Mas os papéis fecharam o dia em baixa de 3,07%.

 

Na guerra para a qual o Casino estaria se preparando, ele poderia utilizar as ações preferenciais que possui para votar contra a proposta de conversão em ordinárias. A unificação das espécies de ações seria o primeiro passo da proposta de combinação com o Carrefour.

 

Por conta de uma decisão da Comissão de Valores Mobiliários (CVM), baseada na Lei das Sociedades por Ações, os ordinaristas não podem votar na assembleia que aprovar a conversão das preferenciais porque têm um prêmio na conversão dos papéis. Cada preferencial receberia 0,95 ordinária.

 

Mas Abilio Diniz também estaria pensando em revidar. Os advogados que assessoram o empresário - do escritório Mattos Filho e Barbosa, Müssnich & Aragão - estudam a possibilidade de fazer uma consulta na CVM justamente para questionar se acionistas preferencialistas, também detentores de ações ordinárias, poderiam votar na assembleia geral que decidirá se aprova a integração das operações do Pão de Açúcar com o Carrefour.

 

O objetivo de Diniz seria levantar a discussão para que o colegiado da CVM avalie que o Casino e o Pão de Açúcar devem ser impedidos de votar, independentemente da classe de ação que possuem, pelo conflito de interesse.

 

No mercado, também circulavam outros exercícios sobre os motivos do Casino de fazer essas compras. Entre eles estaria demonstrar sua capacidade financeira própria, sem a necessidade de um financiador.

 

A configuração final da proposta de fusão entre Pão de Açúcar e Carrefour nasceu a partir da entrada do BTG no negócio, que aconteceu por volta do dia 10 de junho. Foi a partir daí que se desenhou a criação do Novo Pão de Açúcar (NPA) com uma classe apenas de ações, capital inicial de € 2 bilhões (de BNDESPar e BTG) e € 500 milhões em dívida, captados pelo banco de André Esteves.

 

Se o Casino aprovar o negócio, o acordo da Wilkes deixaria de existir. Seria feito um novo acordo entre NPA e Carrefour França. O Casino passa a ser o maior acionista individual na NPA, com 29,8%, mas terá que respeitar a governança da nova empresa. Ou seja, se submeter a um acordo prévio desenhado por Abilio Diniz, atual presidente do conselho do Pão de Açúcar, e o Carrefour mundial.

 

O NPA terá um novo CNPJ (o da Gama, sociedade para fins específicos criada pelo BTG), mas não vai para o Novo Mercado. A intenção é adotar partes do Novo Mercado - tag along de 100%, uma classe só de ações. A empresa não iria para o Novo Mercado porque não quer sofrer as restrições desse ambiente de negócios. Como, por exemplo, a exigência de laudo de três bancos diferentes para aprovar algumas operações. Isso tornaria a empresa mais "engessada". Além disso, cada acionista tem direito a um voto (independentemente da quantidade de ações). O BNDESPar, por exemplo, tem 18% da empresa, mas vota com 15% (limite para todos os acionistas).

 

No Carrefour França, que também é listado em bolsa, o NPA será o segundo maior acionista, após a Blue Capital. É por conta da negociação com a Blue Capital, iniciada em fevereiro, que o NPA terá o direito de indicar dois conselheiros para o Carrefour. A partir de 2013, o NPA indicaria três conselheiros.

 

O conselho do Carrefour se baseia no trabalho de quatro comitês de estudo para tomar suas principais decisões. São quatro comitês, dos quais participam alguns membros da gestão e do conselho: de estratégia, de nomeação, de remuneração e de auditoria. Está acordado que o NPA vai dirigir o comitê de estratégia. Além disso, participaria dos outros três. Com isso, o NPA ganharia poder nas tomadas de decisão do Carrefour.

 

Mas o contrário não aconteceria - pelo menos, não na mesma proporção. É o NPA quem daria as cartas na gestão da mega varejista criada a partir da união de Pão de Açúcar e Carrefour Brasil. A ideia é tornar a administração da empresa no país mais eficiente, dizem fontes que acompanham o negócio. A administração executiva da Companhia Brasileira de Distribuição (CBD), que pretende incorporar o Carrefour Brasil, seria indicada pela NPA. O único cargo a ser indicado diretamente pelo Carrefour seria o de diretor financeiro. O presidente do conselho seria Abilio Diniz, enquanto o Carrefour daria o nome do vice-presidente do conselho de administração.

 

O Carrefour indicaria ainda um membro para um comitê financeiro a ser criado no CBD. Sob a responsabilidade desse comitê, está a avaliação e aprovação do plano de negócios, apresentado pelo presidente executivo e diretores, o orçamento anual, além de questões relevantes como fusões e aquisições e outros grandes investimentos.

 


Para todos os efeitos, Carrefour francês será controlador

 

A criação de uma multinacional verde-amarela do setor de varejo tem sido o principal argumento para defender que o BNDES coloque R$ 3,91 bilhões dos seus recursos no negócio que está sendo negociado entre Abilio Diniz, BTG Pactual e Carrefour.

 

Embora a proposta preveja que gestão das duas redes de supermercados no Brasil fique a cargo de pessoas indicadas pelo Novo Pão de Açúcar (que terá como principais acionistas Casino, BNDES, Abilio e BTG), o controlador de fato das operações será o Carrefour da França.

 

O que motiva esse desenho é uma premissa do padrão internacional de contabilidade IFRS, usado na Europa e no Brasil.

 

Por essas regras, uma empresa só pode consolidar os números de uma investida se a primeira de fato controlar a segunda, independentemente da participação acionária detida.

 

E é isso que deve ocorrer na transação em questão, com o Carrefour França na posição de controlador e a Companhia Brasileira de Distribuição (CBD, razão social do Pão de Açúcar) na condição de controlada, tendo, por sua vez, o Carrefour Brasil como subsidiária integral.

 

O Pão de Açúcar já é maior que o Carrefour no Brasil e essa diferença seria acentuada com o aporte de R$ 3,91 bilhões do BNDES e R$ 690 milhões do BTG.

 

Conforme a proposta, ao se combinar as duas empresas, a contribuição do Novo Pão de Açúcar (já incluindo o aporte de R$ 4,6 bilhões) equivaleria a 69% do valor econômico envolvido, enquanto as operações brasileiras do Carrefour representariam 31%.

 

Esse arranjo não interessaria ao Carrefour na França, já que o IFRS não permite que, com uma participação minoritária, seja feita a consolidação das receitas da operação brasileira, nem mesmo de forma proporcional. Isso é importante porque a maior parte das comparações que se faz no setor é por volume de vendas.

 

Assim, a proposta prevê um rebalanceamento da posição, com os acionistas do Novo Pão de Açúcar trocando 19% de participação na CBD por 11,4% das ações do Carrefour francês. Com a troca, NPA e Carrefour da França passariam a ter 50% cada um da CBD.

 

Até 2012, uma fatia meio a meio garante a consolidação proporcional a cada uma das partes envolvidas. Mas a regra do IFRS sobre esse tema acaba de ser alterada e, a partir de 2013, isso não será mais permitido. Ou uma empresa controla a outra e consolida 100% ou não consolida nada, registrando o efeito apenas no lucro e patrimônio.

 

Para desequilibrar o jogo e garantir o controle, seria firmado um acordo de acionistas pelo qual, a partir de 2013, um membro do conselho de administração do Carrefour da França teria "preponderância" em votação de matérias ligadas ao Brasil. A sacada é que esse membro será indicado pelo NPA.

 

Veículo: Valor Econômico


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