Ao gosto do freguês

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Depois de comprar diversas empresas, o grupo comandado por Abilio Diniz unifica bandeiras, como Sendas e CompreBem, sob o guarda-chuva da rede Extra


Nos últimos 18 meses, o executivo José Roberto Tambasco foi de tudo um pouco: mestre-de-obra, arquiteto, designer e, nas horas vagas, até vice-presidente de varejo do Grupo Pão de Açúcar, maior rede varejista do País, com um faturamento de R$ 36 bilhões, em 2010, onde dá expediente há mais de 30 anos. Tambasco está próximo de concluir um dos maiores desafios delegados a um executivo do grupo: dar identidade única a uma ampla e diversificada cesta de marcas, acumulada pelo grupo ao longo das últimas décadas, graças a uma agressiva política de aquisições. Resultado: para complicar, a maior parte das bandeiras adquiridas tinha pouca ou nenhuma identificação com seu posicionamento. Barateiro, Nagumo, Reimberg, Parati, Rosado, Mercadinho São Luiz, Sé e Sendas são apenas alguns exemplos de empresas incorporadas, entre 1998 e 2007. A solução encontrada por Tambasco foi apostar na marca Extra. “Consumimos dois anos estudando o que fazer”, diz Tambasco, enquanto, num gesto típico de quem acaba de finalizar uma árdua tarefa, afrouxa o nó na gravata. “Agora, estamos concluindo a conversão de 221 lojas, de diversas bandeiras, em lojas com a marca Extra.”


Com isso, o grupo comandado pelo empresário Abilio Diniz passa a contar com apenas duas bandeiras: o Pão de Açúcar, destinado às classes A e B, e o Extra, para atender a todas as faixas de consumidores. O trabalho de conversão dos pontos de venda não se resumiu, no entanto, a trocar o letreiro na porta nem as cores das prateleiras das lojas. Os novos pontos de venda foram adaptados para atender ao gosto do freguês. Por esse motivo, a marca Extra ganhou três formatos, muito em voga no mundo do varejo de alimentos atualmente: supermercados, hipermercados e lojas de conveniência. Os dois primeiros são distintos não só pelo tamanho, mas também pelo público que pretendem atender. Os consumidores que vão a um super e hipermercado buscam, normalmente, repor vários itens na dispensa. Os que têm pressa, pouca disposição para filas e cuja demanda é a aquisição de poucos produtos, optam pelo mercadinho de pequeno porte (a loja de conveniência ou de vizinhança). “Queremos ser a opção disponível para qualquer uma dessas necessidades”, afirma Tambasco.
 
A equipe de Tambasco trabalhou em um ritmo alucinante para fazer a conversão dos 221 pontos de venda nos últimos 18 meses. As mudanças aconteceram com as lojas em pleno funcionamento e consumiram R$ 210 milhões. “Foi como abastecer um jato em pleno voo”, diz o executivo. Em média, a cada dois dias e meio, uma loja era convertida. Só em agosto deste ano, foram 56 lojas da bandeira CompreBem e Sendas, quase duas por dia. A equipe de Tambasco se apoiou também em diversos estudos para definir os três modelos do Extra. Com base em pesquisas de mercado, concluiu-se que o consumidor da chamada classe média emergente não está exclusivamente interessado em produtos com preços baixos. “Eles agora querem comprar conveniência, praticidade e não abrem mão de qualidade”, diz Tambasco.
 
 
Para chegar a essa conclusão, o Pão de Açúcar fez uma experiência antropológica com seus executivos. Eles encararam a experiência de viver com uma família de baixa renda. O objetivo era entender como se comportavam, o que compravam e qual a razão. “Passei uma semana com uma família formada por pai, mãe, avó, dois filhos e uma tia, num apartamento de 60 metros quadrados no bairro do Jabaquara, em São Paulo”, afirma Tambasco. A vivência deu a ele e à sua equipe a real dimensão do que uma típica dona de casa de baixo poder aquisitivo espera encontrar quando entra em super ou hipermercado. “Elas nunca tiveram tempo para cozinhar, mas também não tinham como comprar conveniência”, diz. “A diferença agora é que têm dinheiro no bolso e compram pratos prontos e congelados.”
 
Essa tendência que aflora na classe média emergente ditou o formato de cada nova loja com a bandeira Extra. Em alguns bairros, o tamanho da área dedicada aos perecíveis aumentou em 40%. A de bazar cresceu 30% em média. Como o público das classes A e B, o consumidor da base da pirâmide sofisticou seus hábitos de consumo. Em razão disso, já existe muita dona de casa de baixa renda comprando mais produtos frescos, marcas top de linha ou lançando mão da autoindulgência para comprar um item ou outro de maior valor agregado. Na medida em que transformava uma loja do Barateiro, por exemplo, em um supermercado Extra, a equipe de Tambasco tratava de adequar a área de venda a essa nova realidade. As mudanças parecem ter dado resultado. As vendas de lazanhas e pizzas congeladas aumentaram, em média, 60% nas lojas convertidas. No caso de frutas, verduras e legumes, as vendas cresceram em média 35%, de acordo com a empresa.
 
 
Ele voltou
 
Jean-Charles Naouri, presidente e principal acionista da rede francesa Casino e sócio do Grupo Pão de Açúcar, voltou ao Brasil na semana passada. O empresário veio participar da apresentação do plano estratégico da empresa para 2012. Algo comum no calendário do grupo Pão de Açúcar, que costuma debater com bastante antecedência onde vai concentrar esforços e investimentos no ano seguinte. Mas a reunião deste ano teve um clima diferente. Primeiro porque Naouri e seu sócio, Abilio Diniz, ainda não restabeleceram o clima cordial de antes da batalha travada publicamente por conta da fusão com o Carrefour, proposta por Diniz e refutada veementemente por Naouri. Segundo: a partir de julho do ano que vem, Naouri assume o controle da companhia brasileira.
 
Oficialmente, a proposta de fusão entre Pão de Açúcar e Carrefour não voltaria à mesa dos debates. Extraoficialmente, porém, Diniz ainda não desistiu da proposta. Na semana anterior à chegada do francês, o empresário brasileiro voltou a defender publicamente a fusão. Desta vez, por meio de entrevista concedida a seus seguidores no Twitter. “Não tenho dúvida de que este é um grande negócio para a companhia e para o Carrefour.” Segundo pessoas próximas a Diniz, embora Naouri tenha passado a semana toda por aqui, o tema não teria voltado à mesa de negociação. 
 
Enquanto Diniz tenta convencer o sócio a levar sua proposta adiante, a segunda maior varejista do mundo continua patinando. E não é só por aqui. Na quarta-feira 31, o Carrefour divulgou o resultado operacional mundial do primeiro semestre deste ano. O número não foi nada bom: prejuízo líquido de € 249 milhões, contra um lucro líquido de € 97 milhões no mesmo período de 2010. No Brasil, a rede francesa segue seu plano de reestruturação, que consiste em fechar lojas com a bandeira varejista e concentrar investimentos na bandeira Atacadão. Na semana passada, foram encerradas as operações em cinco unidades e demitidos pouco mais de 600 funcionários.
 
 

Veículo: Revista Isto É Dinheiro


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