Recorde nas fusões e aquisições

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Mesmo com as crises na Europa e nos Estados Unidos e seus efeitos na economia global, o número de fusões e aquisições envolvendo empresas brasileiras bateu recorde em 2011 – e a expectativa é de continuidade da tendência de alta neste ano. De acordo com balanço divulgado ontem pela Associação Brasileira das Entidades dos Mercados Financeiro e de Capitais (Anbima), foram 179 operações no ano passado, o maior número da série, iniciada em 2006. Em volume financeiro, no entanto, houve queda de 22,7%, de R$ 184,8 bilhões em 2010 (valor recorde) para R$ 142,8 bilhões em 2011.
 
"Aparentemente, a queda do volume poderia indicar um ano ruim para as operações. Mas considerando o cenário econômico bastante desafiador, principalmente no segundo semestre, o balanço foi positivo", disse o coordenador do subcomitê de Fusões e Aquisições da Anbima, Bruno Amaral, destacando que o volume de 2011 foi o segundo melhor da série.
 
Na avaliação do executivo, em 2012 devem ter destaque entre as fusões e aquisições companhias de setores mais ligados ao mercado interno, como varejo, educação, energia elétrica, imobiliário, alimentos e bebidas. Há, ainda, boa expectativa para o setor financeiro, tomando como base a recém-anunciada operação de compra de ações da processadora de cartões Redecard pelo Itaú Unibanco. No ano passado, lideraram o ranking os segmentos de telecomunicações e tecnologia da informação e de petróleo e gás. A metodologia da Anbima inclui no balanço operações de fusão, aquisição, reestruturação societária e ofertas públicas de ações.
 
O balanço da entidade mostrou ainda que, levando-se em consideração a origem do capital, as operações entre empresas brasileiras ficaram com a maior fatia, 44,2% do total – o equivalente a cerca de R$ 63,2 bilhões, pouco mais que o dobro do percentual registrado em 2010. Em seguida, vieram aquisições de brasileiras por estrangeiras (25,9%), operações entre estrangeiras (17,4%) e aquisições de estrangeiras por brasileiras (12,5%). "Como o mercado interno ainda oferece boas oportunidades, não acredito que aumente muito o volume das aquisições das empresas brasileiras no exterior neste ano. Elas devem continuar com a atenção concentrada no País", disse o executivo.
 
Considerando apenas as operações de compra de empresas brasileiras por estrangeiras, Amaral observou que, no ano passado, a participação das asiáticas foi três vezes maior do que a das norte-americanas. A Ásia representou 30,6%, ante 9,8% dos Estados Unidos. "Esse movimento é atípico e pode ser reflexo direto da crise norte-americana", afirmou. Segundo ele, diferentemente do que se pode imaginar, a presença dos asiáticos não se resume à China: desde 2008 a participação dos japoneses é crescente e os sul-coreanos também têm se destacado nos últimos anos.
 
Em 2011, os europeus responderam por 56,1% das operações de aquisição de brasileiras por estrangeiras, percentual que tende a diminuir neste ano, disse o executivo. Isso porque reestruturações bilionárias no setor de telecomunicações foram feitas no ano passado, o que não deve se repetir em 2012.
 
Cenário continua favorável às fusões
 
A despeito da crise na Europa e da retomada gradual na economia norte-americana, o Brasil se mantém como "queridinho" do mercado global para as operações de fusões, aquisições e joint-ventures. A quantidade considerável de operações do tipo em 2011, principalmente no varejo, mostra que esse é um movimento consolidado que deve se manter, segundo especialistas.
 
Mesmo dizendo que pode haver queda no número global de fusões e aquisições em 2012,  influenciada pela macroeconomia, a Ernst&Young Terco sinaliza que o índice pode ser "mais robusto" do que se espera devido ao "velho apetite" por deals (negócios) das companhias – e também por 41% das grandes corporações planejarem fazer aquisições neste ano.
 
"É difícil ganhar mercado hoje, mas essa é a forma mais rápida". A frase de Mauro Johashi, sócio-diretor da divisão de Consultoria em Gestão da BDO RCS, resume o cenário para quem se aventurar por esse caminho. "Apesar de o Brasil ter uma situação privilegiada, mesmo dentro dos Brics, e de ser uma boa opção de investimento e rentabilidade, é importante  ter também visão mundial de negócios", diz.
 
Nível maior de competição, redução de custos operacionais, necessidade de aumentar a escala para atender um público consumidor maior são pontos que explicam a continuidade da tendência de "juntar forças", diz o coordenador de pós-graduação e MBA da Trevisan Escola de Negócios Olavo Henrique Furtado. Como exemplo, a fusão de grandes redes como a Droga Raia e a Drogasil, e criação da holding de varejo farmacêutico do BTG Pactual.
 
Em resumo, segundo Furtado, quando o público consumidor aumenta, cada setor, de acordo com perfil e dinâmica, deve decidir: manter o negócio como sempre foi, ou "comprar" e ser "vendido" – caso da fusão. "Em ambos, existem riscos. Mas o segundo é tendência do capitalismo contemporâneo, e vem cada vez mais forte. Porém, antes de fazer negócio, o ideal é entender obstáculos no caminho, crises, setores que se endividam, enfim, o que pode frear o movimento", alerta. 
 
SuperCade – A análise de operações de fusões e aquisições pode se arrastar por anos nos orgãos reguladores, como o Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade). A entrada em vigor da lei 12.529/2001, apelidada de "SuperCade", em 30 de maio próximo, já tem deixado investidores de sobreaviso: para realizar processos de fusão daí em diante será necessário aprovação prévia do órgão.
 
A mudança na lei tem vantagens e desvantagens, segundo o coordenador de Ciências Contábeis da Faculdade Santa Marcelina Reginaldo Gonçalves. Se a análise prévia pode evitar prejuízos aos envolvidos e ao mercado em geral, por outro lado, pode prejudicar negociações em que os dados da fusão são sigilosos. "Isso pode gerar especulação ou desvalorização de negócios que estiverem em análise", explica Gonçalves. Mesmo assim, ele não acredita que a mudança breque esse mercado.
 
Relembre alguns casos
 
MAR/11
Pão de Açúcar-Casas Bahia – A Secretaria de Assuntos Econômicos (Seae) do Ministério da Fazenda recomendou ao Cade restrições à compra da Casas Bahia pelo Grupo Pão de Açúcar, que já era dono do Ponto Frio, para evitar concentrações de mercado. A compra foi anunciada em julho de 2010, após meses de renegociação do contrato, divulgado em dezembro de 2009.
 
ABR/11
Renner-Camicado –  A Lojas Renner comprou as 27 lojas da varejista de produtos de utilidades domésticas Camicado. O valor da operação foi de R$ 157 milhões. A justificativa para a aquisição é que a Camicado agrega complementaridade e por ser líder no segmento no Sul e Sudeste. 
 
JUN/11
Luiza-Baú – O Magazine Luiza comprou as Lojas do Baú da BF Utilidades, do Grupo Sílvio Santos, por R$ 83 milhões. Foram adquiridas 121 lojas, englobando pontos de vendas, escritórios, centros de distribuição, sistemas de informática e a base de clientes. Foi a primeira aquisição após o IPO, em maio, e a 13ª aquisição da rede, desde 1976. O Magazine só não conseguiu comprar o Ponto Frio em 2009.  
 
JUL/11
Sadia-Perdigão – Após anúncio da fusão das empresas em 2009, que formou a BRFoods, o Cade aprovou com restrições. Juntas, as duas empresas detinham mais da metade do mercado de alimentos processados no Brasil (pizzas, congelados e pratos prontos). A Perdigão foi obrigada a vender fábricas, granjas e centros de distribuição, equivalentes a 80% da capacidade de produção da empresa.
 
JUL/11
Máquina de Vendas  – A aquisição da Eletro Shopping, no Nordeste, fez com que a fusão entre Ricardo Eletro, Insinuante e City Lar, realizada em 2010, aumentasse a disputa pelo segundo lugar no varejo com o Magazine Luiza. Com isso, o grupo passou a contar com 900 lojas e faturamento de R$ 7,2 bilhões em 2011. O Magazine Luiza tem 732 lojas. 
 
AGO/11
Nestlé-Garoto – Após vetar a fusão em 2004, o Cade reconheceu, sete anos depois, a necessidade de reavaliar o processo de compra da Garoto pela Nestlé, e deverá recorrer ao STF ou fazer novo julgamento.  A Nestlé reivindica a aprovação integral da compra da Garoto, baseada no argumento de que os 60 dias previstos na Lei Antitruste para definir fusões e aquisições expirou.
 
AGO/11
Marfrig-Seara – Ao contrário da BRFoods, a fusão dos dois frigoríficos foi aprovada sem restrições pelo Cade. O motivo, segundo o relator do Cade, foi a participação baixa de mercado, mantida antes e depois da operação.
 
AGO/11
Drogasil-Raia – As redes de drogarias Drogasil e Droga Raia confirmaram acordo de associação entre as duas empresas, que se chamaria Raia (43%) Drogasil (57%), mas ainda precisa ser submetido ao Cade e Seae. 
 
AGO/11
Drogaria SP-Pacheco-Drogão – Quase um mês após o anúncio da nova rede líder formada por Raia e Drogasil, a SP e a Pacheco se uniram na criação da DPSP S/A, que se autodenominaram como a maior empresa varejista de produtos farmacêuticos e a sétima rede de varejo do País. O Drogão já havia sido adquirido pela São Paulo em 2010. O processo também precisa ser submetido ao Cade e Seae.
 
OUT/11
Gol-WebJet – As duas assinaram acordo que suspende a fusão até que o negócio seja julgado pelo Cade. Pelo acordo, a Gol não pode alterar o quadro de empregados nem as rotas feitas hoje pela Webjet. O Cade, porém, autorizou as duas empresas a compartilhar passageiros. Para unir operações e conseguir usar os slots da Webjet, a Gol precisa fazer novo pedido de avaliação técnica à Anac e ter o negócio aprovado pelo Cade.
 
DEZ/11
TAM-LAN – A fusão da companhia aérea TAM com a chilena Lan foi aprovada, mas o Cade restringiu as operações da nova maior empresa do setor na América Latina e uma das dez maiores do mundo. O órgão antitruste detectou que a fusão acarretou grande concentração na rota Guarulhos-Santiago-Guarulhos, onde dominaria mais de 80% do transporte de passageiros. Foi pedido veto à união das companhias na rota, e determinou que a Latam, empresa formada com a fusão, permute com outras companhias os dois pares de slots diários da TAM em Guarulhos, e em horários comercialmente atrativos para permitir a concorrência de outras companhias, a princípio por três anos.
 
FEV/2012
Brazil Pharma – A Holding do ramo farmacêutico do BTG Pactual anunciou a compra da rede baiana de farmácias Sant'Ana, por R$ 347 milhões. Com isso, a holding deve contar com 1 mil unidades no País, se a aquisição for aprovada pelo conselho do BTG e pelo Cade.


Veículo: Diário do Comércio - SP


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