A Associação Brasileira de Produtores de Maçã (ABPM) estuda a criação de um consórcio de cooperados para unir produtores de maçãs e empresas beneficiadoras da fruta. A intenção é organizar o segmento produtivo em um novo modelo de negócios com o objetivo de tornar as vendas no varejo nacional mais rentáveis, melhorar as negociações no mercado externo e viabilizar compras de insumos e investimentos em pesquisas.
De acordo com o presidente da ABPM, Pierre Nicolas Pérès, "existe muito produtor para poucos compradores [varejistas]. É preciso equilibrar melhor as forças".
O desequilíbrio entre o setor produtivo e o varejo, segundo a associação, tem causado um descompasso no comportamento dos preços. O valor pago ao produtor não tem sido suficiente para cobrir os custos nos últimos anos. Em contrapartida, o preço pago pelo consumidor tem apresentado significativas elevações. "Alguma coisa não está funcionando nesse sistema. Ou melhor, só está funcionando para o supermercado", diz Pérès.
De acordo com dados compilados pela ABPM, no ano passado, o agricultor recebeu pela fruta entre R$ 0,60 e R$ 0,70, por quilo. Já a maçã beneficiada e embalada, em média, alcançou o dobro do valor. Segundo a ABPM, há ainda uma grande diferença entre os valores pagos aos produtores e beneficiadores, em relação ao preço da maçã que chega ao consumidor nos últimos anos. Em 2011, por exemplo, enquanto o beneficiador recebia R$ 25, em média (caixa de 18 quilos), o preço no varejo era de R$ 72,98.
Aliado às dificuldades no mercado nacional, a busca de uma organização do setor produtivo também envolve a perda de competitividade por conta da valorização do real. Ela aumentou a concorrência com a fruta importada e reduziu a fatia da maçã brasileira no mercado externo. Em 2011, o volume exportado ficou abaixo da média e correspondeu a apenas um terço do volume de 2004, o período de recorde das exportações.
O consórcio de cooperados é considerado como uma alternativa para o setor ganhar competitividade. A fruta seria direcionada para um escritório de vendas que faria a comercialização em conjunto. Outras iniciativas coletivas estão sendo elaboradas: a formação de um grupo exportador para este tipo de venda e outro para a compra de insumos ou investimentos em pesquisa que buscam aumentar a produtividade nos pomares. No entanto, a estrutura financeira dos produtores ou das empresas permanecem individualizadas.
A discussão do consórcio começou há cerca de oito meses com ajuda do Ministério da Agricultura, que realizou algumas apresentações deste assunto aos produtores. O modelo usado para esta iniciativa foi um consórcio similar, chamado Conagro, criado no Paraná para o setor de grãos. Algumas experiências com produtores de frutas na Itália também têm servido de referência para o projeto.
Há ainda outras possibilidades no caso da união de produtores e beneficiadores da maçã brasileira. Estuda-se a possibilidade da criação de vários consórcios por área geográfica de produção, como São Joaquim, Fraiburgo, Vacaria e Caxias do Sul. "Eles poderiam até mesmo concorrer entre si", diz Pérès.
As discussões desta estrutura ainda estão em andamento. Dos 35 associados hoje da ABPM, Pérès diz que "dez estariam prontos para testar um consórcio".
Conforme o representante, nem todos os produtores e empresas beneficiadoras se sentem à vontade com a iniciativa. "Tem gente que prefere esperar primeiro o resultado", afirma.
Algumas empresas disseram ao Valor que, por enquanto, não possuem interesse neste formato de negócios. Elas preferiram se manter no anonimato. Porém, alguns participantes de porte deste mercado têm visto com bons olhos a iniciativa.
O coordenador nacional de vendas da Rasip, de Vacaria (RS), Claudiomar Basso, qualifica a iniciativa como importante para a recuperação do setor. "É preciso encontrar alternativas para dividir os ganhos gerados pelo varejo, que são bem significativos em relação ao preço remunerado aos produtores", afirma. Segundo ele, o projeto precisa avançar no atendimento de alguns aspectos legais. Desde que supridos, ele assegura que a Rasip estuda participar do consórcio.
O presidente da Renar Maçãs, de Fraiburgo (SC), Walter Barbosa, afirma que "como conceito geral, pode ser interessante". Mas ele pondera que as informações sobre o consórcio ainda são muito preliminares e esta não é uma variável que faz parte do planejamento da empresa.
Para Pedro Bueno, gerente comercial da Agro Industrial Lazzeri S.A, de Vacaria (RS), é difícil avaliar se a ideia é interessante, pois ela seria possível "após uma análise profunda de sua viabilidade do ponto de vista jurídico, do feedback do consumidor final e de uma melhoria e padronização da oferta", comenta.
De acordo com o diretor-executivo da ABPM, Moisés Albuquerque, busca-se um modelo que tenha viabilidade jurídica. Por isso, antes mesmo de sua formalização e da procura de mais interessados no meio produtivo, a associação pediu uma análise preventiva do Conselho de Administração de Defesa Econômica (Cade). A preocupação é que o consórcio seja entendido como um modelo setorial legal sem infringir as regras da concorrência.
Para a safra deste ano, o setor produtivo espera um preço médio melhor do que no ano passado, principalmente, por conta da qualidade superior da fruta. Tanto Rasip como Renar informaram que há uma coloração mais intensa nas maçãs que começaram a ser colhidas há poucos dias, além de um bom equilíbrio entre açúcar e acidez.
Apesar de aguardar uma elevação no preço médio, a ABPM entende que importantes alterações não acontecerão caso não se mude a forma de atuação entre produtores e beneficiadores. Porém, Pérès acredita que a estrutura do consórcio estará em operação até o final do ano para interferir nesta situação.
Veículo: Valor Econômico