Dilma trabalha para evitar punições econômicas; nada deverá mudar na relação bilateral com a nação vizinha
Países do Mercosul vão se reunir nesta semana na Argentina; Planalto se irrita por ter sido pego de surpresa
O governo da presidente Dilma Rousseff é a favor de "castigar" o governo paraguaio, mas não "trucidá-lo", dizem diplomatas brasileiros.
Inicialmente, propostas de punições muito severas ao vizinho estão descartadas.
A posição contrasta com o tom da Argentina. Representantes da gestão Cristina Kirchner vem fazendo consultas informais ao Uruguai e ao Brasil sobre as chances de aprovar o ingresso da Venezuela no Mercosul nesse fim de semana, segundo a Folha apurou com autoridades brasileiras. O Paraguai é o único sócio do Mercosul que não havia aprovado a entrada da Venezuela.
Embora não oficial, a suspensão já surtiu efeito. Ontem, o Paraguai foi excluído da negociação, por videoconferência, de acordo tarifário entre o Mercosul e a China.
A extensão das sanções ao país hoje governado por Federico Franco será definida na reunião entre os integrantes do Mercosul e os demais membros da Unasul (União das Nações Sul-Americanas), entre quinta e sexta-feira.
Há quatro gradações de sanções em debate: 1) expulsão; 2) suspensão sem afetar as relações comerciais; 3) rompimento dos projetos de integração física e de cooperação (agrícola, por exemplo); 4) bloqueio de financiamentos (o do BNDES, por exemplo).
Setores do governo Dilma defendem que a exclusão temporária do Paraguai se dê apenas nas instâncias políticas do bloco.
Ou seja: que Franco não seja convidado para reuniões, mas sem privar a economia paraguaia das tarifas reduzidas do bloco. Interlocutores do governo Dilma asseguram que nada muda nas relações bilaterais. Até mesmo o livre trânsito de cidadãos sem exigência de passaportes continuará valendo.
Não está nos planos do Brasil romper projetos de infraestrutura nem mudar regras no fornecimento de energia a partir da hidrelétrica binacional de Itaipu.
Lugo vinha num processo crescente de desgaste. A Folha teve acesso exclusivo a telegramas diplomáticos enviados desde o ano passado dando conta da debilidade dele.
"Lugo tem tido dificuldades para administrar sua heterogênea coalizão", informou o embaixador Eduardo dos Santos. No Planalto, porém, há incômodo quanto ao fato de a presidente ter se surpreendido com a destituição.
O ministro da Secretaria-Geral da Presidência, Gilberto Carvalho, defendeu ontem que a Unasul e o Mercosul façam uma "ação forte de não aceitar" o processo.
O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva afirmou à Folha considerar o impeachment de Lugo um "golpe".
Consequências já preocupam setor produtivo
A possibilidade de que as sanções do Mercosul ultrapassem punições políticas acendeu um sinal de alerta entre empresários e exportadores paraguaios.
O temor é não só pelo importante mercado em risco, mas também pelo isolamento comercial do país, sem saída para o mar.
"O impacto de uma retirada do Mercosul seria enorme e implicaria na busca de outras vias, outros mercados. Teríamos que aprender a trabalhar com outras regras internacionais", disse o presidente da Câmara Nacional de Comércio e Serviços do Paraguai, Beltrán Salin.
A opinião é compartilhada por Sebastián González Morassi, presidente da Câmara Paraguaia de Exportadores.
"É claro que seria um peso grande, mas não só para o Paraguai. Brasil e Argentina exportam para cá entre US$ 5 bilhões e US$ 6 bilhões por ano."
O comércio dentro do bloco somou US$ 88 bilhões em 2010 (16% do total dos países), principalmente manufaturados.
Apesar do temor, empresários acreditam que os impactos das sanções serão menores do que os causados pelo governo Lugo.
"Assumimos os riscos quando passamos por esse processo. Mas, atrás da crise, vem a oportunidade, e vamos atrás delas", afirmou González.
Veículo: Folha de S.Paulo