Olheiros espalhados pelas lojas

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É um tipo de cliente misterioso que, autorizado pelo estabelecimento, sem que os funcionários saibam, avalia o atendimento e outros detalhes que  passam despercebidos pelo dono. O consumidor chega e começa a observar vários detalhes na loja ou no ambiente em que vai comprar algum produto ou serviço. Avalia a iluminação do local, a organização das mercadorias, a limpeza, se o atendente o recebeu com um sorriso ou demonstrou entusiasmo ao vê-lo, se sabe fornecer informações sobre um produto, se existem etiquetas com preço visível, se há demora no atendimento ou  filas (em cinemas, restaurantes), se a comida chegou sem demora...

Não é um cliente comum, ele está ali com uma missão específica: a de observar tudo atentamente, pesar diversos fatores e fazer um relatório minucioso para o comerciante ou fornecedor do serviço.

Esse cliente oculto ou misterioso é uma tendência antiga no exterior. No Brasil começou a ganhar fôlego nos últimos cinco anos, com o aparecimento de empresas especializadas nesse tipo de serviço, não só por causa da concorrência acirrada dos multicanais – e-commerce, entre outros– como também porque o consumidor está muito exigente e atento, e não hesita em dizer como foi tratado – se bem ou mal – a amigos e principalmente  nas redes sociais.

Além disso, a entrada da nova classe média no segmento de consumo de bens e serviços, antes restritos às camadas mais favorecidas da população, aumenta o desafio do comércio para um atendimento mais eficaz.

Antigamente, essas pesquisas mais minuciosas eram feitas por  departamentos específicos de grandes  empresas – o de marketing, por exemplo, ou de treinamento. Só que agora é fundamental que também o médio varejo –  hotéis, cinemas, lanchonetes e restaurantes – tenham o “seu pesquisador”, recrutado com a ajuda de empresas dedicadas exclusivamente a este tipo de  serviço.

São elas que contratam e treinam esses pesquisadores para irem aos estabelecimentos, e eles não podem ter nenhum vínculo com o local a ser visitado, além de precisarem ser muito discretos em suas avaliações – não devem nem fazer anotações enquanto estão observando o lugar. Muitos recebem prêmios ou até bônus por esse trabalho.

Empresas  – A OnYou é uma dessas agências especializadas desde 2006. “Fazemos uma seleção dessas pessoas, são médicos, professores, advogados, estudantes, profissionais liberais e, de acordo com o perfil de consumo de cada um, montamos uma base de dados”, conta o diretor José Worcman.

Ele atende 100 empresas (concessionárias, restaurantes, cinemas e lojas) e possui uma base ativa de 3,5 mil clientes ocultos espalhados pelo País. Todas as despesas com hospedagem em hotéis, gastos em restaurantes e cinema são reembolsados pela agência, mas quem paga, na verdade, é a empresa que contrata. A avaliação pode variar de R$ 250 até R$ 2.500 e vai depender do tipo de serviço (se for um hotel, ele terá que ficar no mínimo dois dias e com acompanhante, por exemplo). Neste caso, os gastos serão maiores.

Cinemark – Nos últimos dois anos a rede Cinemark vem pesquisando mais de perto 31 das suas 58 unidades graças aos clientes ocultos indicados pela OnYou. Segundo seu diretor de operações, Paulo Rego, as avaliações são feitas em duas visitas mensais, principalmente em fins de semana de estreia de algum filme blockbuster, pois é o período crítico, com muita gente nos shoppings e filas disputadas. “Cada visita gera um relatório qualitativo disponível na web”, diz Rego.

Esses relatórios são distribuídos para as várias gerências e departamentos de recursos humanos e treinamento para a tomada de providências. “De posse dessas avaliações, os gerentes fazem um plano de ação. Um desses resultados foi a colocação de mais terminais automáticos de compra de ingressos”. A rede tinha apenas dois desses terminais nos cinemas, agora são cinco ou seis, em cada loja. Outra providência para reduzir filas em dias de estreia foi estimular a antecipação das compras de ingressos pela internet e pelo celular. “Tivemos uma melhoria sensível no atendimento, com menos reclamações”, admite o diretor da Cinemark.

Com dois anos de atuação, a Vidi Shopper é outra agência especializada, com 10 clientes no seu portfólio –  entre marcas como a Nike, GVT, Boticário, TAM Viagens, HP Store, Porto Seguro, PlayLand, Ambev (quiosques da cervejaria). Seu diretor, Marco Flávio Cardoso, lembra que o foco a partir deste ano será nas pequenas e médias empresas porque essa é uma tendência crescente no varejo.

“O serviço incentiva o melhor atendimento dos vendedores e identifica as falhas de venda de forma mais rápida”. Os questionários, segundo Cardoso, têm objetivos quantitativos e qualitativos e abrangem três fases: a atração (se a comunicação visual da loja está adequada, por exemplo), a conexão (o atendente acolheu o consumidor de forma positiva?) e o engajamento (se o funcionário apresentou o produto da melhor maneira possível). “Depois, essas informações são preenchidas no questionário e aprovadas pelo nosso cliente”, informa Cardoso. “É o cliente-empresa que informa qual o melhor perfil do consumidor misterioso para fazer a pesquisa”, explica.

Cardoso lembra que os questionários estão sempre evoluindo e existem empresas com vários pontos de venda que precisam de dezenas de avaliações por ano. “Quando detectamos essa evolução nos questionários, significa que os resultados estão aparecendo”.

A PlayLand é um parque de diversões infantil com 15 lojas em shoppings brasileiros e como recebe 7 milhões de visitantes por ano precisa focar no bom atendimento para manter essa clientela, diz a gerente de marketing do grupo, Cinthia Miyazawa. Ela utiliza o serviço de cliente misterioso desde 2006, mas só há dois decidiu mesmo contratar  a Vidi Shopper.

“Investimos muito nesse processo porque ele dá resultados. Tem meses que fazemos até 75 avalições”. Como é um ambiente infantil, o apelo da loja é focado nas crianças, e os olheiros percebem se o local está claro o suficiente, se o atendente explica direito como funciona o brinquedo (os pais também são orientados), se os caixas são suficientes para evitar filas na hora da aquisição do cartão que dá direito a brincar em cada um dos equipamentos. “Com as respostas, melhoramos o treinamento e ampliamos o número de pessoas no atendimento em fins de semana, e já incrementamos as vendas sugestivas”, conta Cinthia. As vendas sugestivas são a colocação de mais créditos nos cartões adquiridos pelos pais para divertirem os filhos.

 

Veículo: Diário do Comércio - SP


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