Jabuticaba resiste à carência de pomares comerciais

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A safra terminou no mês passado, mas Valdir Fagan e a esposa Neusa ainda estão às voltas com a comercialização da colheita de 2 mil toneladas de jabuticabas da propriedade em Casa Branca, no nordeste de São Paulo. A família do agricultor é a principal produtora da fruta no município, que responde por 78% de um plantio estadual que neste ano ocupou 270 hectares e rendeu 2,56 mil toneladas, de acordo com o Instituto de Economia Agrícola (IEA), vinculado à Secretaria de Agricultura paulista.

Os plantios comerciais como os do casal são raros no país - situados basicamente em São Paulo, Minas Gerais e Goiás -, tanto que a produção nacional sequer consta em estatísticas como as do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Como lembra a pesquisadora Priscilla Rocha, do IEA, as jabuticabeiras são conhecidas pelos brasileiros como "fruta de quintal" e "esse é um dos motivos que explicam a existência de poucos pomares comerciais". Priscilla afirma, porém, que a ausência de números oficiais não se traduzem em menor importância. "É um produto que já está conosco há cinco séculos e virou nome de cidade [Jaboticabal]", diz. A fruta também inspirou a criação da "teoria da jabuticaba", um símbolo das particularidades nacionais.

Neusa Fagan explica que cultivos em larga escala como os dela, com 2 mil pés, não animam os agricultores porque a fruta da família das mirtáceas (a mesma da pitanga), genuinamente brasileira e típica da Mata Atlântica, tem vida curta e preserva seu sabor original por apenas dois dias depois de colhida. "Preciso dar um rumo para elas antes da fermentação causada pelo alto teor de açúcar", diz. Por essa razão, jabuticabas não chegam aos supermercados nem às feiras a não ser entre setembro e outubro, tempo de colheita. "Por conta do clima seco, tivemos nesse ano um mês extra de safra", informa Neusa.

As frutas da variedade sabará, considerada a mais doce, colhidas pelos Fagan, tem dois destinos: as bolotas graúdas são vendidas para o Mercado Municipal de São Paulo e o Ceagesp, maior entreposto de legumes e frutas da América Latina, por R$ 8 a R$ 15 a caixa de três quilos. As de qualidade inferior se transformam em geleias, seguindo um costume em Casa Branca durante um período em que quase tudo é à base da fruta - de bebidas até sorvetes pães e roscas. Não à toa, a cidade reivindica o título de "capital estadual da jabuticaba".

A família Fagan lida com jabuticabeiras há mais de seis décadas, quando o patriarca Virgínio deu início ao cultivo que tempos depois se tornou irrigado. O solo úmido é essencial para manter a fertilidade da planta e permitir uma pequena frutificação ao longo do ano. O pomar dos Fagan já atraiu visitas do exterior e, por essa razão, Neusa não descarta abrir a porteira para turistas em época de colheita e engrossar o faturamento da propriedade, guardado em segredo. Quando a safra da jabuticaba termina, o casal se volta para o cultivo da laranja-pera, que neste ano rendeu 20 mil caixas (40,8 quilos cada).

Bem longe do interior de São Paulo, o produtor Paulo Antônio Silva, é um dos 11 herdeiros de um pomar formado por 31 mil pés que rendem em torno de 200 quilos de frutas cada um, em Hidrolândia, distrito de Nova Fátima (GO). O cultivo instalado em 150 hectares da variedade pingo de mel é o maior do país, e desde os anos 60 são abertos aos visitantes entre setembro e outubro, época de fartura da safra. A cada temporada, cerca de 10 mil turistas vão conhecer o plantio pelo preço de R$ 25 a diária, que dá o direito de chupar a fruta direto do pé ou levá-la para casa por R$ 5 o quilo. "Visitantes dos Estados Unidos, Europa e Japão já viraram rotina", afirma.

O produtor afirma que ter transformado as jabuticabeiras em atração seria algo inimaginável quando os primeiros pés chegaram à fazenda em 1947, apenas para consumo familiar. Anos depois, o pai do fruticultor passou a levar as frutas de carro de boi para uma Goiânia que ainda estava em construção e não tardou a transformar o seu plantio em ponto turístico. Quando acaba a safra, a família se dedica ao plantio de tangerina ponkan e cajamanga, que somam 22 mil pés. Porém, a jabuticaba é, de longe, o xodó da família. Por isso, todo cuidado é pouco com árvores antigas ou novas que demoram 12 anos para frutificar. Elas são adubadas, podadas, limpas de ervas daninhas e protegidas contra o ataque de besouros.

Cerca de 5% da produção da propriedade é escoada para a fabricação de vinho, licor e cachaça da fruta, cuja formulação foi desenvolvidas pela Universidade Federal de Goiás (UFG). O projeto do pesquisador Eduardo Asquieri para a elaboração de bebidas fermentadas acabou levando-o aos Estados Unidos para trabalhar na patente dos benefícios terapêuticos do extrato da casca e da semente de jabuticaba como antioxidantes. "Encontramos até três vezes mais polifeníis [substâncias que contribuem na prevenção de doenças cardiovasculares e neurodegenerativas ] do que no vinho de uva", explica.



Veículo: Valor Econômico


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