Agreste tem 2º maior polo têxtil do País

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Com 8 mil novos empreendimentos em 10 anos, região só perde para São Paulo


O polo de confecções do agreste pernambucano, cujo motor se concentra nas cidades de Caruaru, Toritama e Santa Cruz do Capibaribe, registrou um aumento de oito mil novos empreendimentos ligados ao setor, na última década, além de uma expansão territorial do negócio, que agora abrange outros dez municípios da região, localizada no semiárido.

Os números são de uma pesquisa ainda em andamento do Serviço de Apoio às Micro e Pequenas Empresas (Sebrae-PE) sobre o setor. A pesquisa classifica como empreendimentos empresas formais, informais e também as que produzem por encomenda para terceiros.

Os 12 mil empreendimentos registrados em 2003 são, agora, cerca de 20 mil. O polo já é o segundo maior do País - só perde para São Paulo. A região oferece cerca de 100 mil empregos e produz 900 milhões de peças por ano. Não há desemprego no setor, que tem penado com carência de mão de obra qualificada.

Referência. Nascido na informalidade, o polo pensa alto. Um fórum estratégico da cadeia têxtil de Pernambuco, criado em 1999, por demanda de empresários e instituições da área, deu origem no ano passado, à organização social Núcleo Gestor da Cadeia Têxtil e de Confecções de Pernambuco (NTCPE) que, por sua vez, formou o Marco Pernambucano da Moda, um centro de referência com inauguração prevista até o meio do ano em um prédio histórico em Recife.

Planos não faltam: há projetos que vão desde incubadoras para estimular criações a iniciativas para aproximar academia e produção. A base do trabalho, explica o integrante do Núcleo, Edílson Tavares - também presidente da Lavanderia Mamute, especializada em lavagem industrial de jeans, em Toritama - é consolidar a imagem do produto do polo de confecções do agreste como de boa qualidade e bom preço. Segundo ele, um dos desafios é apagar a pecha de que a região é produtora de "sulanca" - sinônimo de "coisa de pobre" ou de baixa qualidade.

Por meio do NTCPE, foram contratadas pesquisas - ainda não concluídas - para identificar mercados no Brasil e estratégias de penetração. "Hoje as pessoas vêm aqui comprar, o que não é sustentável no longo prazo", avalia Tavares. A solução, segundo ele, é criar centros avançados de vendas - como showrooms de atacado - e sites com serviços de vendas. Também está sendo estudada a possibilidade de comercialização pontual em cidades do País durante eventos de grande movimentação.

"Até junho começaremos a definir metas", garante o empresário, ao destacar a pretensão de formalizar 100% dos centros de comercialização do polo. "Saímos de 100% de informalidade e irregularidade na questão ambiental no início dos anos 90 e demos um salto espetacular", afirma ele. Hoje 80% das empresas são formais, no comércio e na produção. A deficiência maior ainda é na produção. "Tem havido terceirização na produção, a chamada facção, o que não é bom."

O fracionamento tem ocorrido com a divisão da produção em três ou quatro unidades, para pagar menos impostos. "Isso é um retrocesso e não protege o trabalhador", avalia. "Tem de fracionar de forma correta, com empresas legitimamente constituídas, ou através de cooperativas."

Ambiente. Tavares destaca a importância de o polo se adaptar ao caminho da sustentabilidade ambiental e social. Ele lembra que as lavanderias, concentradas em Toritama - cidade responsável por 16% da produção nacional de jeans - já chegaram a indignar ambientalistas e população ao deixar o Rio Capibaribe, que corta o município, manchado de azul. Hoje, 80% das lavanderias são regularizadas e 70% têm interesse em ter um selo verde que agregue toda regularização ambiental. A Mamute, diz ele, é exemplo e usa sistema de reciclagem de água com tecnologia alemã.

Outro tema que deve ser discutido pelo NTCPE é a necessidade de Pernambuco voltar a produzir algodão. "É inadmissível ter uma produção de quase um bilhão de peças e se importar tecidos", destaca Tavares.

Embora no polo ninguém mais toque no assunto, o episódio, ocorrido há um ano, da importação de lençóis hospitalares dos Estados Unidos com indícios de contaminação, feita por uma empresa de confecção de bolsos, a Na Intimidade, apavorou a população local. O presidente da Associação Comercial de Santa Cruz do Capibaribe, José Gomes Filho, garante que o "caso foi superado". O empresário Altair Teixeira de Moura, responsável pela importação, passou a ser o inimigo público "número 1" da cidade. Teve de fechar as portas e se mudou.


Segredo está na produção rápida e na criatividade


O que diferencia o polo de confecções do agreste pernambucano? Empresários e representantes de associações comerciais locais e instituições ligadas ao setor têm a mesma resposta: a criatividade e a rapidez da produção local - o que na região se convencionou chamar de "fast fashion".

O fato de muitas empresas serem familiares permite a rapidez, sem alto custo. Ao mesmo tempo, muitas empresas têm o próprio sistema de transporte, o que garante economia de tempo na entrega, avalia Silvio Oliveira, representante do Sebrae-PE, parceiro do polo.

"A região oferece a facilidade de se ter um produto hoje, outro amanhã, acompanhando tendências", observa Arnaldo Xavier, da Rota do Mar, o maior empregador da região, cuja meta é ser a maior e melhor empresa de moda surfe e "street wear" do País. São 576 funcionários, R$ 35 milhões de faturamento anual, cinco lojas - duas em Santa Cruz, uma em Toritama e duas em Caruaru - onde comercializa 80% da produção de 150 mil peças ao mês. Os outros 20% são vendidos por representantes em outros Estados - de São Paulo ao Amazonas.

A Rota do Mar participa de duas feiras internacionais - Paris e Madri - sem perder foco no mercado regional, que exige preço em conta. A grife se diz antenada com a moda nacional e internacional. Também dá exemplo ao adotar uso exclusivo de sacola oxibiodegradável, que se decompõe em oito meses.

Xavier destaca que, ao contrário de muitas marcas que engessam coleções, no agreste pernambucano há facilidade para oferecer novidades sempre. "Isso atrai público." Segundo ele, se não se cria produto novo, os compradores podem perder o interesse.

Prazo de entrega. Em 1998, em Santa Cruz do Capibaribe, um cliente da confecção Joggofi pediu, com urgência, a confecção de 600 peças. Eram 14 horas. O responsável pela empresa, o ex-bancário José Gomes Filho, comprou o tecido, cortou, mandou bordar, providenciou a costura e às 17 horas do dia seguinte entregou a mercadoria. "Isso continua a acontecer, muitas bordadeiras trabalham à noite", explica o empresário, que depois de 15 anos de sucesso na área, somente agora vai começar a usar cartão de crédito nas vendas. Sua empresa tem 42 funcionários, fabrica entre 80 e 100 mil peças por mês e tem faturamento mensal de R$ 700 mil.

Em contrapartida, a falta de capacitação de mão de obra e de empresários, a escassez de mão de obra, a duplicação ainda não concluída de um pequeno trecho da BR-104 ligando Caruaru a Santa Cruz são alguns dos desafios do polo. A dificuldade de mão de obra se contrapõe ao orgulho do "desemprego zero" nas cidades de Santa Cruz do Capibaribe e Toritama. O maior fantasma, porém, é o concorrente chinês, que já fez estrago. Toritama vivia do calçado, há cerca de três décadas. Perdeu terreno para o mercado chinês.

Diante do insucesso com os calçados e da percepção de que Santa Cruz do Capibaribe começava a se dar bem com a produção de confecção, a cidade começou a investir em produção têxtil. Como tinha máquinas pesadas para produzir calçados, decidiu investir em jeans. O menor município do Estado - com 37 mil habitantes - fica com praticamente o dobro da população durante o dia, quando pessoas de cidades vizinhas vão para Toritama para trabalhar, conta Kléber Barbosa, da Associação Comercial e Industrial local.



Veículo: O Estado de S.Paulo


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