O mundo precisa elevar em 20% a produção de alimentos para suprir o crescimento da demanda até 2020, conforme estimativa da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), órgão que reúne os países mais ricos. A União Europeia tem capacidade para uma expansão de 4%; Estados Unidos e Canadá, juntos, só podem crescer 15%; somadas, Rússia e Índia não têm como passar de 26%. Já o Brasil, sozinho, tem potencial para ampliar em 40% a produção de alimentos até o início da próxima década.
Os números foram apresentados ontem pelo ex-ministro da Agricultura e coordenador do Centro de Agronegócio da Fundação Getúlio Vargas (FGV), Roberto Rodrigues, em evento na Associação Comercial de São Paulo (ACSP).
"O mundo nos pede esse crescimento. Temos condições de alcançá-lo, desde que enfrentados e superados alguns gargalos institucionais e de infreaestrutura", afirmou, lembrando que a oferta de alimentos é fundamental para a preservação da paz mundial. "As guerras quase sempre têm a ver com escassez de alimentos."
Acompanharam o ex-ministro na mesa da plenária o presidente da ACSP e da Federação das Associações Comerciais do Estado de São Paulo (Facesp), Rogério Amato; o vice-presidente da ACSP Renato Abucham; o presidente do Conselho Deliberativo do Sebrae-SP, Alencar Burti; o vice-presidente da ACSP Luiz Gonzaga Bertelli, e o integrante do Conselho Superior da ASCP Robert Schoueri.
Guerra comecial – "Estamos em uma guerra comercial e só ganha uma guerra quem se mobiliza. Não é uma briga apenas do agricultor, diz respeito a todos", afirmou Rogério Amato, justificando a importância da palestra para empresários na ACSP.
De acordo com o ex-ministro, o Brasil tem os três principais requisitos para conseguir elevar a produção de alimentos de forma a alcançar as projeções da OCDE nos próximos anos: terra agriculturável, mão de obra disponível e tecnologia avançada. Se dependesse apenas disso, o crescimento estaria praticamente garantido. "A terra ainda é abundante. Dos 851 milhões de hectares do território nacional, 72 milhões estão cultivados e outros 89 milhões são perfeitamente agriculturáveis.
O problema é que, desse total, apenas 15 milhões podem, de fato ser usados, por causa de restrições das mais variadas, como a existência de áreas de parques nacionais e de reservas indígenas, por exemplo. Mas isso entra na conta dos gargalos", destacou Rodrigues.
No que se refere a mão de obra, Rodrigues disse que não falta quantidade de trabalhadores, mas na opinião dele o País enfrenta um apagão de mão de obra no campo. "Muitas vezes falta pessoal capacitado para operar as modernas máquinas que chegam às fazendas. É mais um problema a ser enfrentado." Na questão da tecnologia, o Brasil continua colhendo os frutos do sucesso de projetos como os da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa), que há décadas trabalha com aprimoramento de técnicas agropecuárias.
Filas – Os gargalos, no entanto, tendem a dificultar esse trabalho. De acordo com o ex-ministro, a lista começa com a logística, que sofre – já há décadas – com a infraestrutura precária de transporte e armazenagem. "Achei até engraçado o espanto que houve neste ano com as filas de caminhões para descarregar grãos nos portos. Isso já acontece há muitos anos, não é surpresa. E quem paga por esse custo de safra parada não é apenas o produtor, o consumidor também paga", disse. A armazenagem é outro entrave. O Brasil não consegue armazenar de maneira adequada suas safras, observou, enquanto a FAO, órgão da Organização das Nações Unidas (ONU) para a alimentação sugere que o ideal é um país ter capacidade para armazenar 120% de seus estoques.
A renda rural também entra na lista de problemas que podem impedir o Brasil de alcançar a estimativa da OCDE. Ao contrário do que ocorre nos países ricos, no Brasil o produtor tem poucos instrumentos – como seguros e modalidades de crédito e de proteção contra oscilação de preços – para financiar a produção. A tecnologia nacional, hoje uma solução, pode perder eficiência se não se mantiverem os investimentos.
A falta de política comercial consistente também foi citada por Rodrigues como um dos gargalos do agronegócio brasileiro. "É exagerada a dependência que o Brasil tem do Mercosul para negociar acordos comerciais. O resultado é que não temos acordo algum, o que prejudica o agronegócio", afirmou o ex-ministro.
Tributação – As questões institucionais constituem mais dificuldades, disse Rodrigues. "No Brasil há muitas interferências na atividade do agronegócio: código florestal, regras trabalhistas ultrapassadas, tributação excessiva, proibição de venda de terras para estrangeiros, entre muitas outras", destacou. "Muitas vezes não há bom senso nessas regras. Se um empresário japonês quiser comprar uma fazenda no Brasil ele vai levá-la para seu país? Ao contrário, para gerar renda nela produzirá riqueza no Brasil. É um bom exemplo de gargalo ligado a questões institucionais."Hoje, o agronegócio representa cerca de 22% do Produto Interno Bruto (PIB) do País.
Veículo: Diário do Comércio - SP