Rodrigo Lorenzoni
A legislação sanitária brasileira, desde 1950, determina que nenhum alimento de origem animal e seus derivados pode ser liberado para o consumo sem que tenha passado por fiscalização industrial e sanitária por parte dos serviços de inspeção municipal, estadual e federal. Segundo dados do Departamento de Defesa Agropecuária da Secretaria da Agricultura do RS, 117 médicos-veterinários se revezam na inspeção de 324 estabelecimentos, e muitos também desempenham outras atividades, a exemplo da defesa sanitária. Leia-se: mesmo sendo obrigatório, nem todos os estabelecimentos são fiscalizados. Por vezes, a legislação não é cumprida. Há situações em que não é verificada a qualidade do alimento e do processo industrial. Resultado prático: por ineficiência do Estado, temos no mercado consumidor alimentos “travestidos” de legais, de inócuos e de íntegros.
Contratar médicos-veterinários é indispensável, mas, por si só, a ação não resolve. O crescimento do parque industrial sempre será maior do que a capacidade do governo em contratar. Por mais que se contrate, sempre existirão mais estabelecimentos e menos fiscais. Esse cenário não é privilégio da inspeção estadual. Como está a inspeção federal que atende aos estabelecimentos exportadores e desatende aos de comércio interno? Como estão as inspeções municipais? Quando existentes, são meramente cartoriais, na maior parte dos municípios. É preciso rever o modelo.
O Brasil sempre privilegiou a inspeção industrial em detrimento da inspeção de consumo. Se fiscalizarmos o ponto de venda, retirando o produto impróprio para o consumo, a indústria terá maior preocupação com a qualidade e exigirá a presença da fiscalização em seu estabelecimento. A qualidade do alimento não deve ser uma “política de governo”, mas, sim, uma “política de Estado”. É dever constitucional do governo garantir a saúde da população por meio do acesso a alimentos seguros. Ao CRMV-RS, cabe orientar e alertar o poder público sobre os riscos da ausência de fiscalização por médicos-veterinários oficiais em cada estabelecimento industrial, distribuidor ou comercial. A garantia da qualidade do alimento não é um objetivo em si. O objetivo maior é a preservação de um bem inestimável: a saúde.
Presidente do Conselho Regional de Medicina-Veterinária/RS
Veículo: Jornal do Comércio - RS