Por Mônica Scaramuzzo | De São Paulo
Depois de seis anos de intensas discussões, a fábrica de vacinas da Novartis no Brasil deverá sair do papel. A companhia, que planeja desembolsar US$ 470 milhões nesse projeto, adquiriu o terreno em Jaboatão dos Guararapes (PE) e deu início às obras, afirmou Joseph Jimenez, presidente global da farmacêutica suíça. No entanto, apesar dos investimentos milionários, a empresa avalia a venda de uma de suas unidades no Brasil, apurou o Valor (ver reportagem abaixo).
"Neste momento, a fábrica de Pernambuco está completamente projetada. Demos início às obras e estamos em estágio de fundações para colocar em prática uma unidade em estado da arte para produção de vacinas", disse o principal executivo mundial do grupo. A unidade será construída em módulos - como se fosse um brinquedo lego - que virão por contêineres dos Estados Unidos.
Essa unidade deverá produzir, no início, componentes para a fabricação da vacina para combate à meningite B. As obras estão previstas para terminarem no segundo semestre de 2014. A partir daí, a companhia pedirá aval da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) para dar início às operações, previstas para o início de 2016, com 120 empregos diretos.
O Brasil desbancou países como Itália e Cingapura para sediar essa importante unidade de biológicos da farmacêutica suíça. O projeto foi anunciado, pela primeira vez, em 2007, durante o segundo mandato do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT). O anúncio, à época, gerou grandes expectativas, sobretudo em Pernambuco, Estado apontado desde o início como sede desse ambicioso projeto.
A demora para sair do papel envolveu problemas ambientais e burocráticos. O Valor apurou que o projeto inicial seria erguer a fábrica na cidade de Goiana. O terreno chegou a ser cedido à Novartis pelo governo no Estado. Ao realizar os estudos geológicos, contudo, a empresa desistiu de construir a unidade naquele local porque foi detectado na região contaminação de herbicidas, problema considerado comum em regiões que abrigaram canaviais, caso de Goiana. A empresa, então, decidiu adquirir o terreno em outro local, mas esse processo demorou. Sobre esse assunto, Jimenez informou que "houve uma mudança de local nesse meio tempo [de Goiana para Jaboatão dos Guararapes], o que ocasionou o atraso, e a empresa teve de fazer novo projeto".
A decisão de montar uma fábrica de vacinas no Brasil indica que o país se tornou um importante mercado para medicamentos biológicos para a companhia. "Nós planejamos inicialmente vacinas, mas temos espaço suficiente para expandir para outros produtos", disse o executivo. A ideia no longo prazo é tornar essa unidade uma das referências globais de biológicos para o grupo.
"O Brasil é importante para o futuro da Novartis. Está entre os dez países em tamanho. A classe média tem crescido muito. Observamos uma melhora na qualidade e acesso da área da saúde, que criam novas oportunidades para a companhia", disse Jimenez.
Seguindo uma tendência das farmacêuticas globais, a Novartis está se afastando aos poucos do modelo de "blockbusters" (medicamentos considerados campeões de venda) para produtos voltados para medicina personalizada, que abrange um número menor de pacientes, cujos tratamento é considerado mais complexo. Jimenez citou como exemplos, medicamentos que tiveram sua patente vencida, casos do Lipitor, da Pfizer, e o próprio Diovan, da Novartis, considerados carros-chefes de vendas.
A Novartis é uma das multinacionais que possuem acordos de transferência de tecnologia com o governo federal para importantes tratamentos. A companhia tem três acordos de Parceria de Desenvolvimento Produtivo (PDP), sob coordenação do Ministério da Saúde, que prevê transferência de tecnologia para produzir no laboratório público medicamentos para tratamento de pacientes submetidos a transplantes. A empresa está fazendo a transferência de tecnologia do micofenolato de sódio e everolimo, utilizados para evitar a rejeição de rins e coração transplantados. O everolimo também é utilizado para tratamento de câncer de mama em estágio avançado. A outra parceria envolve transferência de tecnologia para o tratamento de meningite C.
Outros dois acordos nesse sentido estão em discussão, mas o executivo não deu mais detalhes. Jimenez considera esse tipo de parceria importante, uma vez que amplia o acesso aos tratamentos. Tradicionalmente, em acordos de transferência de tecnologia, a farmacêutica tem a venda garantida desses produtos ao governo até os laboratórios públicos conseguirem fabricar os medicamentos.
Veículo: Valor Econômico