O peso das aquisições

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Muitos negócios fechados no ano passado pareciam baratos. Agora, as empresas levarão mais tempo para recuperar seus investimentos

 

VOCÊ ALGUM DIA COMPROU uma ação ou um produto, seduzido pelo preço atraente, e dias depois descobriu que a mesma mercadoria ficou mais barata? Muita gente já passou por isso. No mundo corporativo também. Aquele sentimento de decepção que atinge mortais consumidores é comparável à sensação de muitas empresas no País atualmente. Nos últimos três anos, uma corrida frenética por aquisições fez com que companhias desembolsassem montanhas de dinheiro de olho no aumento de participação no mercado ou simplesmente para não deixar para o concorrente a última fatia da pizza. No entanto, desde que a crise financeira derreteu as ações no País, o valor de mercado da maioria das empresas desabou e muitas aquisições tornaram- se um peso para quem foi às compras - principalmente porque, em muitas situações, a dívida, em dólar, até cresceu. Isso significa que as empresas levarão mais tempo para recuperar seus investimentos.

 

Na maioria dos casos, companhias que incorporaram empresas menores enfrentam dificuldades para digerir essas operações. Em abril do ano passado, por exemplo, a Cosan, maior companhia de processamento de álcool e açúcar do mundo, adquiriu a rede Esso por US$ 826 milhões. Na data daquela operação, seu valor de mercado atingiu US$ 8,1 bilhões. Hoje, a Cosan vale US$ 3,7 bilhões, o que sugere que, no atual cenário, o negócio não valeria a pena. "Naquela época, a aquisição se justificava. Hoje seria diferente. O retorno do investimento da Cosan, que era estimado em cinco anos, atualmente é de dez anos", afirma Peter Ho, analista da Planner Corretora. No setor de distribuição de combustíveis essa não foi a única operação nem a maior. O Grupo Ultra pagou US$ 4 bilhões pela rede Ipiranga, que tinha na época um valor de mercado bem menor, de US$ 1,2 bilhão. O custo da operação é superior ao próprio valor de mercado da compradora, hoje em US$ 2,9 bilhões.

 

Outro exemplo é o da Perdigão. A companhia concluiu no final de 2007 a aquisição da Eleva por R$ 598 milhões, e assumiu as marcas Avipal e Elegê. Com a aquisição, a Perdigão superou a Sadia em faturamento pela primeira vez na história. Mas a crise financeira também a atingiu. A queda do preço do leite, as dificuldades de captação de empréstimos, a redução do consumo interno e a retração das exportações fizeram a Perdigão fechar fábricas da Eleva em Ivoti (RS) e Rio Casca (MG). A empresa, no entanto, defende sua estratégia. "Não estamos desiludidos. Pelo contrário, estamos estimulados a continuar avançando", garante o diretor de negócios lácteos, Wlademir Paravise. "Sob o ponto de vista estratégico, a aquisição faz todo o sentido. Olhar o mercado no curto prazo dá a falsa ilusão de negócio malfeito. Não é o caso."

 

A própria Bovespa foi uma vítima da crise. Em abril do ano passado, quando foi consolidada a fusão com a BM&F, as duas juntas valiam R$ 35,2 bilhões. Nesta semana, elas custam R$ 13 bilhões, quase R$ 22,2 bilhões a menos do que no dia da união. É como se duas BM&F se tivessem desaparecido do mapa desde o surgimento da crise.

 

Mas nem todo mundo ficou com uma aquisição pesada sobre os ombros. A Gafisa adquiriu em setembro 60% das ações da Tenda por R$ 420 milhões, após as ações da empresa caírem mais de 80%. No dia da compra, o preço da Tenda era de apenas R$ 210 milhões, desde então seu valor saltou para R$ 520 milhões. Há também quem hoje agradece por não ter entrado de cabeça, de propósito ou acidentalmente, na onda de aquisições. Um caso é o da Vale. A mineradora negociava a compra da Xstrata por até US$ 90 bilhões. Com a forte desvalorização das commodities, a mineradora estrangeira passou a valer US$ 10 bilhões. E a perspectiva das fusões e aquisições hoje não é positiva. "Em 2007, foram 677 operações e movimentação de US$ 59 bilhões. Em 2008, o recorde só não foi batido porque houve forte desaceleração no fim do ano", afirma Luís Motta, da consultoria KPMG. "Este ano, certamente, apresentará um resultado bem modesto."
 
 

Veículo:Revista Isto É Dinheiro


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