As exportações de lácteos sem subsídios da União Europeia não duraram nem dois anos. Os prêmios pagos pelo escoamento da produção pelo bloco europeu - extintos em maio de 2007 - quando a cotação da tonelada de leite em pó no mercado internacional estava prestes a bater o recorde de US$ 5,7 mil, retornam com o preço da mesma tonelada a US$ 2,3 mil e uma crise instaurada na economia mundial, com agravantes peculiares que atingem em cheio o setor.
Por cada tonelada de óleo de manteiga negociada no mercado internacional, as indústrias de lácteos europeias passam a receber um prêmio de € 545. A mesma quantidade de leite em pó desnatado negociada fora da Europa vai render outros € 170. O bloco europeu vai subsidiar ainda as exportações de manteiga, € 450, e queijo ementhal, € 220.
O diretor-executivo da Agripoint, Marcelo Pereira de Carvalho, avalia que esse retorno dos subsídios às exportações europeias de lácteos "era previsível". "O prazo para eliminar os subsídios às exportações se encerra em 2013, até lá a subvenção à produção vai sendo remodelada e o excedente despejado no mercado externo", analisa Carvalho. O consultor relembra que o bloco chegou a pagar um prêmio superior a € 1 mil por tonelada de lácteo escoada, recorde batido em 2002 quando o mercado externo não pagava mais de US$ 1,25 mil pela tonelada do leite.
"O mercado de lácteos está enfrentando um momento de baixa, mas ficar estocado não é a solução. Talvez seja necessário passar por isso para desovar os estoques e recuperar os preços. Porém, está criado um precedente ao retorno dos subsídios de maneira generalizada", pondera Carvalho. Dos principais países exportadores, apenas os Estados Unidos garantem benefícios às indústrias que atendem à demanda internacional, subvenções essas que não se comparam às europeias.
De acordo com estimativas dos analistas de mercado de lá, a União Europeia entrou em 2009 com 160 mil toneladas de leite desnatado estocadas e as projeções indicam que, mesmo com o subsídio, 168 mil toneladas do produto estarão nos estoques das indústrias ao final de 2009. Já as 160 mil toneladas de manteiga estocadas no período pelo setor sofreriam redução de 10 mil toneladas em um ano, em 2007 haviam apenas 80 mil toneladas de manteiga em poder da indústria. O volume de queijos, ementhal e outras variedades, estocado ficou 60 mil toneladas maior em 2008.
Otávio Farias, da trading Alliance Commodities Brasil argumenta que a desvalorização do euro teria retardado esta decisão já esperada pelos exportadores. Ainda de acordo com ele, alguns agentes do setor avaliam que os subsídios anunciados não serão suficientes para motivar o aumento da oferta no mercado de leite europeu. Farias acredita que o Brasil, assim como outros exportadores, será diretamente impactado pela volta da ajuda oficial europeia. Porém, "o Brasil tem menor dependência das exportações de leite". Apenas 3% da produção nacional ganhou o mercado externo, em especial a Venezuela que contratou 50% dos embarques brasileiros. Já Nova Zelândia, maior exportador mundial, e Austrália "sofrerão mais pela dependência do mercado externo para mover excedentes".
O presidente da Comissão Nacional de Pecuária de Leite da Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA), Rodrigo Alvim, argumenta que "o único passo dado na rodada de Doha foi o fim do subsídio, e eles não suportaram ver o mercado ruir". Para Alvim, além de aumentar a produção, a Europa está criando uma "reserva de mercado artificial".
Veículo: Gazeta Mercantil