O projeto da Transnordestina, bilionária ferrovia na região Nordeste que vai interligar três estados e chegar a dois importantes portos, ainda enfrenta pendências ambientais, fiscais e de estrutura financeira, para sair, de fato, do papel. Mesmo assim , o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) dá início hoje, em Pernambuco, às obras do trecho Salgueiro-Trindade da ferrovia sem que os recursos para a sua construção tenham sido liberados. Dos R$ 5,4 bilhões de investimentos, R$ 4,6 bilhões dependem do financiamento de bancos estatais e de fundos regionais de desenvolvimento, como o FNDE, que será responsável por quase metade do montante de recursos previstos.
Os recursos já foram aprovados pelas instituições, mas a liberação deles ainda esbarra na falta de documentação, principalmente das licenças ambientais, segundo o Valor apurou com o Banco do Nordeste, o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) e a Superintendência de Desenvolvimento do Nordeste (Sudene), principais fontes financiadoras.
Até agora, os desembolsos feitos para o trecho em obras entre as cidades de Missão Velha (CE) e Salgueiro (PE) foram com recursos da Transnordestina Logística, novo nome da Companhia Ferroviária do Nordeste (CFN), e de um empréstimo-ponte de R$ 100 milhões do BNDES. A empresa é uma controlada da Cia. Siderúrgica nacional (CSN), do empresário Benjamin Steinbruch. A CSN, atualmente, detém participação de 71,2% no capital da ferrovia.
A obra, com extensão de 1.728 km a serem construídos, vai se estender de Eliseu Martins, no interior do Piauí, ao porto de Suape, passando por Recife (PE) e ao porto de Pecém, próximo à Fortaleza, no litoral cearense. A carga-alvo da ferrovia são grãos, fertilizantes, minérios e combustíveis.
Além dos recursos que não foram liberados, ainda há problemas na estruturação financeira do projeto a ser equacionado. Contando recursos próprios e financiamentos via fundos e bancos, faltam R$ 164 milhões para fechar o investimento necessário para a obra. Segundo o Valor apurou, para cobrir esse espaço, negocia-se agora a entrada da Valec, estatal subordinada ao Ministério dos Transportes, como acionista da Transnordestina em troca do aporte na ferrovia. O que ficou acertado até agora é que essa parcela sairá do bolso do governo federal.
Diante disso, a CSN e o governo federal correm contra o relógio para tirar do papel um dos principais ícones do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC).
Os R$ 2,6 bilhões do Fundo de Desenvolvimento do Nordeste (FDNE), por exemplo, foram aprovados pela Sudene em novembro e só tem cem dias para serem liberados, prazo que vence no dia 24 de março. Pelas regras atuais, caso isso não ocorra por falta da entrega de documentação, a Transnordestina só poderá entrar com um novo pedido de financiamento dois anos depois, segundo informa Paulo Fontana, superintendente da Sudene. "É uma obra de mais de R$ 5 bilhões, não de R$ 5, por isso não é de se esperar que a liberação do dinheiro seja rápida", afirma ele.
A expectativa inicial do governo federal era inaugurar a Transnordestina em 2010, porém nem o trecho de cerca de 90 km, iniciado em 2006, que liga Missão Velha a Salgueiro está concluído. Além de esbarrar em problemas para o financiamento, as desapropriações de terras e as licenças ambientais demoraram mais para sair do que o inicialmente previsto.
Por enquanto, além de tocar as obras do trecho entre Ceará e Pernambuco, a Transnordestina deu início à compra dos trilhos. Importados da China, o material conta com um incentivo da Sudene que isenta a Transnordestina do pagamento do Adicional ao Frete para Renovação da Marinha Mercante. No total, estão previstas 150 locomotivas e 4,1 mil vagões, com um total de 1,6 mil empregados.
A ferrovia também negociou com o Banco do Nordeste um empréstimo de R$ 180 milhões para a recuperação de um trecho já existente da malha ferroviária.
Procuradas pelo Valor, a Transnordestina e a CNS informaram que não concederiam entrevistas sobre o projeto, seu andamento e as negociações em curso até o lançamento da ferrovia pelo presidente Lula hoje.
Veículo: Valor Econômico