Este ano, houve 272 operações de compra ou fusão de empresas brasileiras.
Mesmo com a economia em retração, as empresas brasileiras continuaram na mira dos investidores estrangeiros este ano. Levantamento inédito da consultoria espanhola Transactional Track Record (TTR) mostra que, até o dia 15 deste mês, o país registrou 272 operações em que companhias nacionais foram adquiridas ou se juntaram a corporações do exterior, mantendo o nível de negócios dos últimos dois anos. O valor envolvido nessas transações foi de US$ 64,29 bilhões, superior aos US$ 63,95 bilhões registrados em 2014.
— Nessas operações estão incluídas aquisições, fusões e joint
ventures. Consideramos aquisições totais e minoritárias de empresas, e também estão no cálculo os recursos dos fundos de private equity que compram empresas — explica Wagner Rodrigues, diretor de pesquisa e negócios da TTR para o mercado brasileiro.
No ano passado, a TTR contabilizou 288 transações entre empresas brasileiras e estrangeiras, que somaram US$ 63,95 bilhões. Em 2013, foram registradas 273 operações, que movimentaram US$ 33,3 bilhões.
O mapeamento da consultoria mostrou que os estrangeiros estão especialmente interessados em empresas das áreas de internet e tecnologia, que estiveram envolvidas em 76 operações, 28% dos negócios este ano. Também despertaram interesse as companhias dos setores de distribuição e varejo (25 operações) e consultoria, auditoria e engenharia (23 negócios). Os números da TTR são mais atualizados que os do Banco Central, que captou a entrada de US$ 55 bilhões em investimento estrangeiro direto no país até outubro passado.
Segundo a TTR, os americanos continuam sendo os maiores investidores no país, com participação em 91 transações e desembolso de US$ 28 bilhões. Eles compraram participações em empresas de internet, tecnologia, aviação, química e energia, entre outras. A americana SunEdison, por exemplo, concluiu, em setembro passado, a compra de 14 usinas eólicas e três pequenas centrais hidrelétricas na Bahia, que pertenciam à brasileira Renova Energia. O investimento foi de cerca de R$ 1,5 bilhão.
Na avaliação de Luis Pita, gerente geral da SunEdison no Brasil, o país é chave na estratégia de crescimento da empresa na América Latina.
— A população e a atividade econômica crescentes, apesar da conjuntura atual, vão precisar de maior quantidade de energia nos próximos anos e décadas — diz Pita, para justificar o negócio.
Para Reinaldo Grasson, sócio da consultoria Deloitte na área de Corporate Finance Advisory, a valorização do dólar — que passou de R$ 2,60, em janeiro passado, para quase R$ 4 hoje — tornou o Brasil mais atraente em termos de valor e reduziu a incerteza cambial. Ele explica que, apesar do aumento da percepção de risco atual, as empresas estrangeiras fazem planos de médio e longo prazos quando decidem investir no Brasil.
— O Brasil tem um mercado consumidor de 200 milhões de pessoas e setores da economia que ainda vão se consolidar — diz Grasson.
Ele observa que, além dos setores de tecnologia e internet, outros segmentos que não exigem capital mais intensivo também estão no radar dos estrangeiros. Segundo Grasson, há muitos negócios nas áreas de saúde, educação e alimentos sendo fechados. O especialista explica que, com a economia em retração, o crédito escasso e os juros altos, muitas empresas brasileiras estão fazendo um realinhamento estratégico, vendendo algumas áreas de negócios para se concentrar na atividade principal.
— Tome o exemplo da venda da divisão de cosméticos da Hypermarcas para a americana Coty, por R$ 3,8 bilhões, em novembro. A Hypermarcas tem a intenção de ter foco estratégico no setor farmacêutico e reduzir o endividamento — diz Grasson.
Depois dos americanos, os chineses foram os que mais gastaram no país, desembolsando R$ 17,6 bilhões. Em novembro, o conglomerado HNA Group investiu R$ 1,7 bilhão para ficar com 23,7% da empresa aérea Azul. De uma tacada só, a China Three Gorges (CTG) Brasil Energia pagou quase R$ 14 bilhões, em novembro, para ficar com as hidrelétricas de Jupiá e Ilha Solteira, no interior de São Paulo.
O diretor executivo da CTG Brasil, Li Yinsheng, garante que o país é um mercado prioritário, devido à alta capacidade de geração hidrelétrica e ao potencial para construção e operação de projetos de grande porte.
— Nossa decisão de investir no mercado brasileiro se baseia em uma visão de longo prazo — afirma o executivo. — A CTG Brasil está aberta a analisar projetos de energia renovável que apresentem um retorno adequado e riscos aceitáveis.
O diretor-presidente da Sociedade Brasileira de Estudos de Empresas Transnacionais e da Globalização Econômica (Sobeet), Luis Afonso Lima, avalia que o investimento estrangeiro no Brasil é um dos poucos segmentos que não apresentou deterioração ao longo do ano:
— É preciso atentar, porém, que o aumento do investimento externo está ocorrendo em todo o mundo, não apenas no Brasil.
Veículo: Jornal O Globo - RJ