No início do ano, quando as cotações do milho para a safrinha que seria colhida em meados de junho atingiram o patamar de R$ 25 por saca em Rondonópolis, no Mato Grosso, uma euforia tomou conta do mercado e muitos produtores anteciparam suas vendas.
Eles não contavam com o impacto das fortes exportações de 2015 no consumo interno, nem com uma estiagem que quebraria diversas lavouras. Hoje, os preços domésticos superam os R$ 40 por saca e, daqui para frente, atender essa demanda interna é o melhor negócio para o agricultor.
Durante a última semana, a reportagem do DCI acompanhou uma das etapas de avaliação do milho com o rali da Safra, promovido pela consultoria Agroconsult. Foram visitados mais de cinco municípios entre os estados de Goiás e Mato Grosso.
"O clima foi ruim. Chuvas irregulares atrasaram o plantio da soja, que ficou 10% abaixo da média de produtividade na colheita. Na safrinha de milho, em consequência, plantamos atrasados também, veio a seca, e agora acreditamos que o resultado que chegou a 120 sacas por hectare no ano passado, não deve ultrapassar 80", lembra o agricultor Adelino Bissoti, que cultivou 23 mil hectares da oleaginosa e 9 mil de cereal na segunda safra, a safrinha, do ciclo 2015/2016 entre os municípios mato-grossenses de Tesouro e Gaúcha do Norte, ao sul do maior estado produtor de grãos do País.
Bissoti, diretor da fazenda Botuverá, vendeu 30% da produção estimada para o milho, percentual que, após a quebra, subiu para 50%. A remuneração dos embarques, por ferrovia, ao porto de Santos não ultrapassa R$ 30, por isso, ele conta que os produtores da região não estão fazendo negócios com as tradings. "As exportações são apenas contra- tos já realizados, temos que vender para o mercado interno. Vejo que os criadores de porco e de frango precisam sobreviver, a procura não vai cair", disse.
Perdas de 30%
Em Goiás, a frustração média na colheita é estimada em 30%. Entretanto, há quem conseguirá aproveitar a alta da demanda doméstica e outros que não terão volume suficiente nem para atender os contratos com as multinacionais. São casos de municípios que perderam até 85% da safra, nos cálculos da Associação dos Produtores de Soja e Milho de Goiás (Aprosoja-GO) em conjunto com a Federação da Agricultura e Pecuária de Goiás (Faeg).
O agricultor Antônio José Gazarini, Toninho, um dos maiores da região de Jataí (GO), diz que foram 30 dias sem chuvas e sol muito quente, além de 20% do plantio ter sido feito fora do período ideal. Uma exceção no estado, dos seus 7 mil hectares de safrinha, 6,8 mil foram plantados até o dia 4 de março, dentro de uma janela favorável à boa produtividade. Com isso, o clima gerou prejuízo menor, entre 15% e 18%. "No geral, há rumores de quem, de fato, não tenha o produto para entregar, mas alguns pensam em quebrar os contratos com tradings, se sujeitariam a multas, para vender na região quase pelo dobro do preço. Isso é ruim para todo o sistema, afeta nossa credibilidade com as empresas", comenta Gazarini.
Cientes deste movimento nos indicadores internos e dos riscos, as empresas também articulam estratégias. Luiz Paulo Priori, detentor de 2,3 mil hectares de milho safrinha em Jataí (GO), afirma que tradings já estão importando o grão norte-americano para garantir os contratos de exportação e devem direcionar a commodity brasileira para o mercado doméstico no intuito de aproveitar a alta. A fazenda Priori, de gestão familiar, é um dos casos em que na mesma propriedade há lavouras de alta e de péssima produtividade.
Ao DCI, o sócio consultor da Agroconsult, Marcos Rubin, explica que é extremamente possível que as multinacionais optem pela estratégia comercial citada pelo agricultor de Goiás, uma vez que a demanda interna tende a se manter consistente durante todo o ano de 2016 e mais remuneradora que as exportações.
Variáveis do mercado
Em palestra realizada em Rondonópolis (MT), o especialista estimou o consumo doméstico entre 50 e 60 milhões de toneladas do grão, puxada majoritariamente pela cadeia de proteína animal - aves, suínos e confinadores de gado, onde o milho é um insumo fundamental para a alimentação.
Com o salto de 12 milhões de toneladas nas exportações da commodity brasileira entre as temporadas de 2014/2015 e 2015/2016, somado a interferências climáticas que devem derrubar em 7% a produção nacional, para 78,9 milhões de toneladas (nas projeções preliminares da Agroconsult) na variação anual, os estoques do grão saíram de 13,3 milhões de toneladas, em 2014, para 4,1 milhões em 2016.
Veículo: Jornal DCI